A culpa é do rei da Suécia
O Presidente da República estava esta quarta-feira no estrangeiro, mais precisamente na Suécia, olhou, com um certo distanciamento para Portugal, um país endividado até à ponta dos cabelos - os últimos dados do INE mostram um rácio da dívida pública nos 127,8% do PIB, muito acima das previsões contidas na 7ª e última revisão da troika (122,9%), e viu um bando de masoquistas nos que falam da insustentabilidade da dívida do Estado.
Como o Presidente não disse nomes, apenas referiu
tratar-se de "analistas e até políticos", imagine-se!, por cá, neste
país distante, começámos imediatamente a fazer contas de cabeça, não aos
rácios de dívida, que esses parecem ter ganho vida própria, mas aos
supostos masoquistas, aos que se entretêm com o seu próprio sofrimento.
E
não foi difícil. Encontramos vários economistas, insuspeitos (vamos,
para o caso, esquecer os políticos), que nos mostram que para se
conseguir reduzir o nível de dívida pública nas próximas décadas,
respeitando as novas regras orçamentais europeias e mantendo debaixo de
olho as metas do défice, seria preciso pôr a economia a crescer de forma
disparatada. Por disparatada, entenda-se qualquer coisa como cerca de
8% ao ano, ou mais. Como se isso fosse possível...
Aliás, na análise que fez ao Documento de Estratégia Orçamental 2013-2017, o Conselho das Finanças Públicas,
órgão independente, ao qual Cavaco Silva deu posse, e que tem como uma
das suas atribuições, analisar a dinâmica da dívida pública e a evolução
da sua sustentabilidade, diz assim: "Conclui-se que para que a dívida
pública não entre numa trajetória explosiva (crescimento sem limite) são
necessários esforços adicionais de consolidação orçamental, para além
dos efetuados até 2012, mesmo que se venha a concretizar um nível
elevado de crescimento económico".
Os esforços feitos não chegam,
diz a instituição presidida pela Teodora Cardoso, para que a dívida não
entre numa trajetória, não é insustentável, é explosiva.
Nesta
mesma análise, o Conselho das Finanças Públicas explica bem a situação
explosiva da dívida pública portuguesa e avisa para os riscos
compreendidos nas previsões do Governo, que são, claro está, otimistas,
nomeadamente no que respeita às perspetivas de crescimento económico.
Cavaco
poderia desejar que todos, por aqui, neste país, fizessem o mesmo que o
rei Carl XVI Gustavo, e dissessem que Portugal vai lá, que vai
conseguir ter sucesso, vai cumprir este programa de ajustamento, vai
evitar o segundo resgate e até vai chegar a um rácio de dívida de 60% em
2035, conforme está no Pacto. Mas não é possível, Sr. Presidente
(duvido que valesse de alguma coisa...), porque o que nos move, por cá,
não é a simpatia, nem a cortesia. Mas também não é o masoquismo.
IN "DINHEIRO VIVO"
03/10/13
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