HOJE NO
" i"
Suspeitas de fraudes no SNS levam
à detenção de 35 pessoas
Os dados resumem o que os investigadores chamam de "fórmula de sucesso": 35 detidos e 250 arguidos. Nos últimos três meses, foram abertos 50 novos inquéritos
Mais
de 200 buscas, 59 inquéritos pendentes, seis acusações, 35 pessoas
detidas, 250 arguidos, um pedido de indemnização superior a 4 milhões de
euros e suspeitas de fraudes de um valor ainda mais astronómico:
superior a 135 milhões de euros (segundo o Ministério da Saúde). É este o
retrato abreviado em números de cerca de dois anos de combate à fraude
no Serviço Nacional de Saúde (SNS). A maior parte das investigações teve
origem em denúncias da Inspecção Geral das Actividades em Saúde (IGAS) e
Infarmed, mas também há casos de participações feitas pela Inspecção
Geral de Finanças (IGF) e por farmácias, que desconfiaram de tantas
receitas do mesmo medicamento passadas pelo mesmo médico ou de quem
sistematicamente se dirigia ao balcão para aviar as receitas.
Há
que juntar à lista ainda as denúncias anónimas: de cada vez que saem as
notícias de operações com nomes tão apelativos como "Remédio Santo" ou
"Esquizopharma", explica fonte da Polícia Judiciária (PJ) ao i, multiplicam-se as cartas e emails enviados às autoridades a desmascarar esquemas idênticos.
Só
nos últimos três meses, segundo o cruzamento de dados entre o balanço
feito no Ministério da Justiça, em Abril, e os dados agora enviados ao i
pela Procuradoria-Geral da República (PGR), os investigadores
"ganharam" 50 novos inquéritos e os valores sob suspeita de fraude
subiram quase 40%. As operações que têm em vista desmantelar as
actividades ilícitas ligadas ao sector das farmácias ou as burlas ao SNS
não vêm de agora. Só que nunca foram tantas nem tão ágeis desde que o
ministro da Saúde, Paulo Macedo, e a ministra da Justiça, Paula Teixeira
da Cruz, assinaram em Janeiro de 2012 um protocolo de cooperação entre
as duas tutelas. Mais "diálogo" e melhores "mecanismos internos de
despiste" explicam os melhores resultados, na perspectiva de quem está
ligado à investigação.
Depois do acordo foi criada uma equipa
conjunta entre o Ministério da Saúde e PJ. Reuniões de trabalho
decidiram quais os sinais de alarme e o Centro de Conferência de
Facturas, que todos os meses confere as receitas comparticipadas pelo
SNS, deixou de fazer uma mera verificação contabilística. Agora, não
interessa apenas se a receita médica corresponde ao valor da factura do
medicamento. Se um médico passa demasiadas receitas de um remédio caro
com elevadas taxas de comparticipação, por exemplo, os alarmes soam. "É
preciso depois cruzar estes dados com a especialidade do médico, os
locais onde são passadas as receitas e identificar os medicamentos." Se
algum desses dados é suspeito, a investigação prossegue, com
vigilâncias, escutas e outros meios de obtenção de prova até ao dia em
que os inspectores vão para o terreno fazer buscas ou tentar apanhar
suspeitos em flagrante.
Do início do inquérito até às
mega-operações de busca há "pelo menos um ano" de intervalo. É isso que
explica em parte o elevado número de detidos: 35, segundo dados enviados
ao i pelo Ministério da Saúde, 33 só nos processos que estão a
ser investigados pelo Departamento Central de Investigação e Acção Penal
(DCIAP), segundo a PGR. Aos detidos junta-se ainda uma avalanche de
arguidos - 250 por todo o país, 51 só no departamento liderado por
Amadeu Guerra. Destes últimos, seis estão detidos preventivamente e nove
encontram-se em prisão domiciliária.
"Todos os meses, há pelo
menos uma nova suspeita. E quase todas têm fundamento", conta a fonte da
PJ, assegurando que as mega-operações não terminaram com a "Prescrição
de Risco" que levou à detenção de sete pessoas, entre elas o director da
farmácia do Hospital de Santa Maria, no início deste mês. Além do
diálogo, dos novos métodos seguidos nas inspecções e auditorias, e de
uma espécie de "equipa especial" com 9 inspectores da PJ, uma
procuradora da República e duas procuras-adjuntas, o factor tempo
completa aquilo a que os investigadores chamam de fórmula do sucesso:
"Mostra como a combinação de saberes permite melhores resultados."
Bastou
um ano para que as buscas da Operação Remédio Santo dessem lugar a uma
acusação com 1500 páginas contra 18 arguidos. Antes do acordo, um fim
tão rápido de um mega-processo era inimaginável para os investigadores:
"Há um diálogo permanente que nos permite trabalhar os factos quando
eles ainda decorrem e sem delay. Quase podemos fazer uma investigação online."
Em
causa estão suspeitas de burla agravada, associação criminosa,
corrupção e branqueamento de capitais. O esquema não é passado a papel
químico de uns casos para outros, mas no centro estão sempre médicos,
delegados de propaganda médica ou empresários ligadas à indústria
farmacêutica. Idosos e doentes crónicos, por terem regimes especiais de
comparticipação, são os alvos mais usados no esquema fraudulento. E nem
precisam de o saber. Basta um especialista "fingir" que lhes passou uma
receita médica. Depois, ou os medicamentos saem da farmácia por um preço
muito mais baixo que o praticado no do mercado e entra nos meandros da
exportação ilegal ou das vendas simuladas, em que os fármacos nunca
chegam a sair das prateleiras.
* Mais uma razão para sempre termos manifestado consideração pela PJ e pelo ministro da Saúde.
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