14/05/2013

JOÃO MARCELINO

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O "sucesso" e o Dia da Europa


1 O sucesso da operação de colocação de dívida pública portuguesa de longo prazo (dez anos) é uma boa notícia. A breve prazo poderemos conseguir reunir todas as condições para nos situarmos debaixo do chapéu protetor do programa de dívida do Banco Central Europeu, tanto mais que há indicações de que a dívida nacional interessou desta vez investidores tradicionais e não apenas os especuladores que incomodaram as instituições da troika (FMI, BCE e Comissão Europeia) quando da operação anterior (a cinco anos), realizada também já este ano.Esta operação é a parte positiva de um mau programa, o do Governo, que tem arruinado a economia portuguesa e ampliado o número de desempregados - auditado também esta semana pelo INE - para uma dimensão ainda há pouco tempo absolutamente impensável: 952 mil, que já nem sequer contam os que desistiram de procurar emprego ou, simplesmente, seguiram o conselho de Pedro Passos Coelho e emigraram. Ou seja, já estamos seguramente para além do milhão. E reforçámos a diáspora...

2 Voltando à colocação de dívida: o grande sucesso de que fala Vítor Gaspar, pago com o esforço de todo um país, custa-nos uma taxa de juro de 5,65% ano. Obviamente melhor do que nos tempos que nos levaram para os braços da troika. Um preço ainda exorbitante se considerarmos as reais possibilidades da nossa economia. E aqui está a grande questão que se coloca na precisa semana em que se comemorou o Dia da Europa: o preço do dinheiro, que talvez não possa nunca ser igual para todos neste mesmo espaço - admitamo-lo -, é demasiado desigual neste momento. Este empréstimo, de três mil milhões, se tivesse sido concedido à Holanda ou à Alemanha, custaria, no mesmo período de dez anos, menos mil milhões em juros. Talvez até mais. Pode dizer-se: mérito da economia desses países, dos seus líderes, dos seus cidadãos. Com certeza. Mas quer isto dizer também, em plena crise de 2013, que o grande espaço de convergência, social e económica, a cujo ideal muita gente na Europa aderiu, tarda em cumprir a sua vocação fundadora. A crise está a destapar a incapacidade dirigente e a comprometer o futuro da União Europeia. Por isso, a união bancária anda a passo de caracol e a mutualização da dívida dos 17, seja ou não através das eurobonds (que nos podiam e deviam dar outros juros), ainda não se descortinam. 

3 Além da dialética Norte-Sul, temperada por egoísmos evidentes, cresce o ceticismo quanto ao futuro da União e da sua moeda. A Grã-Bretanha, por exemplo, é um excelente laboratório onde se podem estudar os perigos do futuro, que para Portugal são cada vez mais evidentes. Basta ver o que diz David Cameron, muito pressionado por fenómenos em pleno crescimento na política britânica. A curto prazo ver-se-á também o que dizem os britânicos em referendo.Se todos os nossos grandes sucessos de financiamento no pós-troika custarem sempre um preço mais elevado do que o dos países que têm maior capacidade económica, as desigualdades no espaço europeu irão acentuar-se. No final da linha estará a desagregação política e monetária, cada vez mais discutida, até em Portugal, e uma explosão social perigosa. Quando algumas pessoas em Portugal celebram esta colocação de dívida quase como um ponto de chegada, convém perceber que ainda está muito por fazer. Quase tudo. E que um governo português, seja ele qual for, tem pela frente um trabalho que não pode dispensar a vertente de uma presença mais reivindicativa em todos os fóruns europeus. 

No lançamento do seu livro As raízes do Mal, a Troika e o Futuro, o deputado Miguel Frasquilho, do PSD, afirmou que tem "muitas dúvidas" de que "os países que estão com dificuldades e sob programas de ajustamento" estejam "a ser ajudados da melhor forma" e pediu condições mais "realistas". Passos Coelho, na plateia, ouviu. Poiares Maduro, na véspera, na Itália, dissera coisas evidentes, simples, que o Governo durante demasiado tempo não era capaz de ousar sequer pensar. Pode ser que sim, que o "sucesso" de Gaspar não limite, nesta segunda fase, todo o pensamento do Executivo. Oxalá.

IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
11/05/13

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