.
Farmacêutica
IN "i"
23/05/13
.
Sonhar sem adormecer
O governo pretende aplicar aos hospitais públicos um modelo de gestão semelhante ao que já funciona nas Unidades de Saúde Familiares
Não fazemos todos as mesmas coisas de forma igual. Nascemos com
tendências naturais para gostarmos mais de bonecas ou de carrinhos, de
jogar à bola ou à macaca, de ciências ou de letras. E ao longo da nossa
vida, vamos sonhando de olhos abertos e cultivando as nossas apetências
para nos tornarmos exímios especialistas nas matérias de que já mais
gostávamos à partida. São as nossas vocações, os sonhos que devemos
cumprir. É a partir daqui que se gera eficácia e eficiência. A relação
entre os resultados obtidos e os recursos empregues é tanto mais
favorável quanto esses recursos, humanos e materiais, melhor estiverem
vocacionados para o processo em causa.
Esta semana foi noticiado
que o Governo pretende aplicar aos hospitais públicos um modelo de
gestão semelhante ao que já funciona nas Unidades de Saúde Familiares.
Este modelo pressupõe uma maior autonomia na utilização dos recursos,
mas as estruturas serão premiadas financeiramente consoante os
resultados obtidos nos vários indicadores que são contratualizados e
monitorizados. Um grupo de trabalho estará a avaliar esta possibilidade e
irá fazer propostas concretas até ao fim do próximo trimestre.
Será
interessante acompanhar este processo, e verificar em que medida é que
este irá contribuir para a utilização dos hospitais para aquilo que é a
sua verdadeira vocação: a doença aguda e os cuidados de saúde de
média/alta complexidade.
O trabalho de preparação tem vindo a ser
desenvolvido, e baseia-se numa reorganização e capacitação dos cuidados
primários, para onde os cuidados urgentes não graves e os cuidados a
doentes crónicos devem ser transferidos, e a criação de redes de
cuidados continuados, para onde os casos de convalescença e de índole
social também podem ser deslocados. Outra área a realçar é a dispensa de
medicamentos para doenças crónicas como na área da oncologia e do
HIV/SIDA, que também deveriam poder ser dispensados nas farmácias
comunitárias, evitando problemas de deslocação dos doentes, tais como os
que foram também noticiados no início desta semana.
Um estudo
efectuado pelo Centro de Estudos Aplicados da Católica Lisbon School of
Business and Economics e pelo Centro de Estudos de Medicina Baseada na
Evidência da Faculdade de Medicina de Lisboa, apresentado no final do
ano passado, estimou que a transferência de cuidados de saúde dos
hospitais para os cuidados de saúde primários ou para os cuidados
continuados, com a actual arquitectura do sistema de saúde em Portugal,
poderia representar uma poupança anual máxima para o Estado português
entre ¬ 148 milhões no curto prazo a ¬ 372 milhões no longo prazo.
Esta
nova medida proposta pelo Governo poderá favorecer esta transferência
de cuidados, e consequentemente a adaptação ao novo paradigma da doença e
da organização dos cuidados do SNS, desde que os indicadores de gestão
seleccionados para a avaliação e financiamento sejam os adequados.
Por
exemplo, nos EUA, a aplicação de um “imposto” aos hospitais que
tivessem uma taxa de reinternamento aos 30 dias superior a um valor
determinado pelo Governo teve como consequência um processo de
reorganização interno, que contribuiu para uma maior presença de
farmacêuticos na alta hospitalar no sentido de informar o doente sobre a
terapêutica a efectuar, assim como uma crescente articulação com os
cuidados primários, de forma a garantir que é aí que o doente permanece.
As
vocações existem, e não podem ser encaradas nem como preferências nem
como elitismos. Há que colocar os recursos onde eles são necessários. Em
Saúde, todos queremos viver na realidade o sonho de ter um sistema que
funcione de forma eficaz e eficiente... sem termos de adormecer!
Farmacêutica
IN "i"
23/05/13
.
Sem comentários:
Enviar um comentário