HOJE NO
"PÚBLICO"
Consumir metade do sal evitaria
6000 mortes por ano em Portugal
Cloreto de sódio associado a 2,3 milhões de mortes no mundo em 2010.
Em Portugal, o sal que se come está a léguas das recomendações
internacionais.
O consumo de sal é um hábito de país que vive à beira-mar e aprendeu
que salgar conserva e que a comida saborosa é a salgada. Mas este hábito
pode ser mortal quando o consumo é excessivo. Um estudo mostra que, só
em 2010, a ingestão de sal esteve associada à morte de mais de dois
milhões de pessoas em todo o mundo devido a doenças cardiovasculares.
Ainda não há números para Portugal, mas um especialista português fez
contas em 2012: se reduzíssemos em cerca de metade o sal, salvar-se-iam
6000 vidas por ano.
As pequenas pedras que misturamos na comida são formadas por milhões de
moléculas de cloreto de sódio, que é composto por um átomo de cloro e
outro de sódio. É este que nos causa problemas. Durante milhões de anos,
o organismo dos mamíferos habituou-se a reter o sódio, porque na
alimentação havia pouco sal. Hoje os nossos rins não excretam este sódio
a mais, o que origina problemas. A tensão arterial aumenta e, com os
anos, vêm os ataques cardíacos, os acidentes vasculares cerebrais ou a
insuficiência renal.
Das mortes cardiovasculares, 15% devem-se ao sal, diz o comunicado
sobre o novo estudo apresentado numa reunião da Associação Americana
para o Coração. Liderado por Dariush Mozaffarian, médico da Universidade
de Harvard, o estudo mostra que, entre os 2,3 milhões de mortes
associadas ao sal em todo o mundo, um milhão ocorreu em quem tinha menos
de 70 anos.
Os cientistas analisaram 247 estudos sobre consumo de sódio, tendo em
conta a idade, o género, a região e o país, realizados entre 1990 e 2010
e que fizeram parte do Estudo Global do Peso das Doenças, um trabalho
internacional em 50 países. De seguida, a equipa de Mozaffarian fez uma
meta-análise para avaliar o efeito que o aumento do consumo de sal tem
no risco cardiovascular. A partir daqui, os cientistas contabilizaram as
mortes ocorridas em 2010 devido ao sal, usando como referência o
consumo de um só grama de sódio por dia.
Um grama de sódio equivale a 2,54 gramas de sal (cloreto de sódio). A
Organização Mundial de Saúde (OMS) estabeleceu, em Janeiro, que a dose
recomendada de sal por dia é inferior a 5,1 gramas. Nos EUA, a
Associação Americana para o Coração defende 3,8 gramas. Em Portugal,
segundo o Estudo Português de Hipertensão, consumiu-se em 2012, em
média, 10,7 gramas por dia. No Cazaquistão, o valor é de 15,2 gramas.
Estas variações resultam em mortalidades diferentes de país para país.
Entre os 30 países mais populosos, é na Ucrânia que o sal mata mais:
2109 pessoas em cada milhão de adultos. Segue-se a Rússia (1803 pessoas)
e o Egipto (836). Entre todos os países, morre-se menos por sal no
Qatar - 73 habitantes por milhão de adulto -, no Quénia (78 habitantes) e
nos Emirados Árabes Unidos (134).
O novo trabalho mostra ainda que 84% das mortes ocorrem em países
pobres ou de riqueza média. "O consumo de sódio e os casos de doenças
cardiovasculares são semelhantes, ou superiores, em muitos destes
países, comparando com os países mais ricos", diz Mozaffarian.
Os dados sobre Portugal ainda não estão disponíveis. Todos os anos
morrem entre 35.000 e 45.000 portugueses com doenças cardiovasculares, a
primeira causa de morte no país.
Na edição de Setembro/Outubro de 2012 da Revista Portuguesa de Hipertensão e Risco Cardiovascular,
fez-se um cálculo para Portugal, adaptando estimativas sobre a redução
de sal nos EUA e observações da diminuição dos consumos, ao longo de 25
anos, na Finlândia. Resultado: se se reduzisse o consumo médio de sal
por dia em seis gramas, ou seja, para metade dos valores recentes, isso
"permitiria salvar cerca de 6000 vidas por ano", escreve Jorge Polónia,
da Faculdade de Medicina do Porto e especialista em hipertensão. Apesar
de se ter reduzido em 1,2 gramas o consumo diário nos últimos anos, os
valores actuais de 10,7 gramas estão a léguas da recomendação da OMS.
"Tem havido grandes campanhas para reduzir o sal, por exemplo no pão",
diz Mário Lopes, presidente da Sociedade Portuguesa de Cardiologia. A
campanha resultou numa lei em 2009, que definiu o limite máximo para 14
gramas de sal por quilo de pão. Mas não chega, diz Mário Lopes: "Cada um
de nós tem de ingerir a menor quantidade possível de sal e ver os
rótulos dos alimentos."
* Comer com sal, um suicídio bem temperado.
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