HOJE NO
"CORREIO DA MANHÃ"
Sem-abrigo chegam a casa
É com o apoio dos que não ficam indiferentes a quem tem apenas a rua
como morada que nasceu, em Oeiras, uma casa de transição para lhes dar
um teto. A ‘Casa dos Corações’ foi inaugurada quarta-feira.
Pedro
Magalhães já foi sem-abrigo. Tem 36 anos. Passou mais de metade da sua
vida na rua, à procura de um teto improvisado. Este guineense chegou a
Portugal quando tinha apenas nove anos. Veio sozinho, para viver com a
irmã, que deixou o marido expulsá-lo de casa. Era ele uma criança
indefesa. "Fiquei na rua, sozinho." Sem família, passou a dormir nos
passeios de Algés, Oeiras.
Nicolas - como é
tratado por todos - diz que a sociedade devia "olhar para a rua como a
casa de quem não tem mais nada". Só que ao relento não há lençóis de
flanela nem colchões ortopédicos. Há inimigos: "o frio, a humidade e a
chuva". E o medo (muitas vezes).
Nunca casou. Se
pensou em filhos, desistiu. Para Nicolas as relações são duvidosas.
"Primeiro, penso em sobreviver. Penso que quero angariar, para ter, e só
depois constituir família". Em muitos momentos da vida, chegou a pensar
que morar numa casa abandonada - ainda que, sem teto - ou num qualquer
barracão, já era ter um lar. E do mal o menos: nunca foi criminoso. "Sou
uma pessoa que nunca teve problemas de droga, nem com o crime, nem com
nada", frisa.
E se as ruas têm muito de mau, há
sempre bons momentos. O melhor foi a ajuda que Nicolas teve das técnicas
do Instituto de Prevenção e Tratamento da Dependência Química e
Comportamentos Compulsivos (IDEQ), quando as conheceu, ainda
adolescente. Durante mais de dez anos apoiaram-no na rua. E depois
deram-lhe um teto, um quarto num apartamento para dar um verdadeiro lar a
quem não o tinha.
‘Casa dos Corações' aparece como um sinal de esperança
É
no Bairro dos Corações que está localizada a mais recente casa de
transição do IDEQ. Aqui, num apartamento com três quartos, cozinha, casa
de banho e até uma horta, irão viver quatro sem-abrigo como Nicolas já
foi. Vão sair da rua e ganhar autonomia. Teresa Bacelar, técnica do
IDEQ, explica que neste espaço as regras não serão esquecidas.
Dependendo de cada caso, os sem-abrigo "permanecerão por um período de
seis meses a um ano". Há cerca de 60 sem-abrigo em Oeiras. E se esta
casa pode ajudá-los, muitos ainda terão de esperar por um lugar.
* EXEMPLAR
.
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