Natal(idade)
Sociedades envelhecidas são tradicionalmente mais conservadoras e avessas ao risco, com as inevitáveis consequências no seu desenvolvimento. Portugal é uma das economias avançadas com população mais envelhecida: mais de 27% da população tem mais de 60 anos
A componente demográfica tende a ser negligenciada no âmbito da
discussão do crescimento económico. Não obstante, porventura não
teríamos assistido ao inspirado desenvolvimento da China ou Índia sem a
estabilização das suas populações. Este factor favoreceu o incremento do
rendimento por habitante, que facilitou o desenrolar dos acontecimentos
conhecidos. Actualmente, o desafio do desenvolvimento em África ou no
Médio Oriente ainda se encontra relacionado com tendências demográficas.
Em sociedades desenvolvidas, a temática demográfica surge
esporadicamente e, na maioria das ocasiões, associada ao impacto do
envelhecimento populacional no equilíbrio das contas públicas. Outros
efeitos da dinâmica demográfica são frequentemente ignorados. Por
exemplo, na década terminada em 2008, o crescimento médio anual do
Produto Interno Bruto (PIB) na Irlanda, em termos nominais, atingiu
11,5%, mais dois pontos percentuais (p.p.) que o acréscimo médio anual
do PIB "per capita" (9,6%). Idêntico diferencial foi observado na
Islândia e nos EUA. Estes três países partilham uma taxa de fertilidade
(número de crianças por mulher em idade fértil) igual ou superior a 2.
Em Espanha e no Canadá, esta diferença situou-se em 1,5 p.p. Apesar
destes países apresentarem taxas de natalidade na vizinhança de 1,5, a
sua população aumentou mais de 1%/ano nos últimos dez anos em resultado
de forte movimento imigratório. Em contrapartida, países como a Alemanha
e o Japão, com idênticas taxas de fertilidade, de 1,39, e crescimentos
nulos das respectivas populações, registam incrementos do PIB e do PIB
"per capita" iguais. Comparar directamente estimativas de crescimento do
PIB para 2012 de 0,4% na Irlanda e de 0,9% na Alemanha subestima a
diferente evolução do rendimento gerado por habitante nestes dois
países.
Países com maior dinamismo demográfico, por
via de maior natalidade ou mais imigração, além de apresentarem ritmos
mais acelerados de crescimento do PIB, revelam maior orientação para
tomada de riscos, manifesta em maior propensão para inovação e mudança.
Sociedades envelhecidas são tradicionalmente mais conservadoras e
avessas ao risco, com as inevitáveis consequências no seu
desenvolvimento. Portugal é uma das economias avançadas com população
mais envelhecida: mais de 27% da população tem mais de 60 anos. Taxas de
fertilidade iguais ou inferiores a Portugal apenas podem ser
encontradas na Alemanha, Japão, Hungria e Coreia. E o fluxo imigratório
dos anos 1990 e 2000 converteu-se em movimento de saída.
Baixo
crescimento natural da população não é uma inevitabilidade nem é
irreversível. Tomando, os exemplos italiano ou francês, é possível
contrariar tendências de natalidade adversas. Os países escandinavos
foram particularmente bem sucedidos nas suas experiências. A sua
realidade ilustra, igualmente, a inexistência de um nexo de causalidade
entre baixa fertilidade e elevada taxa de participação das mulheres no
mercado de trabalho. Políticas de parentalidade alargadas e flexíveis
acompanhadas por redes capilares de infra-estruturas de apoio a pais e
crianças são invocados para explicar o sucesso nórdico.
Uma
economia não pode evoluir harmoniosa e sustentadamente sem estabilidade
demográfica. No mínimo, mais fraldas e biberões asseguram aumento
sustentado da procura interna e uma prospectiva intergeracional mais
abrangente. Dificilmente se poderá acreditar numa história consistente
de crescimento económico com população em definhamento; donde, releva a
necessidade de contrariar as tendências demográficas portuguesas.
Economista
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
06/12/12
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