Insanidade e outros males
Insanidade orçamental é a doença de Gaspar. Não se sabe se foi Passos
Coelho que lhe transmitiu o vírus, ou se Vítor Gaspar o apanhou nas
poltronas da União Europeia. Este vírus também já foi detetado por
gregos, irlandeses, espanhóis, italianos, cipriotas, húngaros e outros,
nos "medicamentos" que a curandeira Merkel e a monoteísta troika andam a
receitar aí pela Europa.
Perante a violência do vírus e a propagação da doença, os povos
estão a chegar a uma conclusão: ou se unem para fazer uma desinfeção
geral, ou estão condenados a sofrimento prolongado.
O nosso
Governo está todo contaminado por este e outros vírus malditos que não
têm cura. Urge mandá-lo para bem longe. Não há quarentena que o salve.
Quem
estiver atento aos discursos dos governantes e dos seus mentores,
rapidamente se apercebe de que o que dizem sobre o país e os efeitos das
suas políticas parecem mesmo discursos em estado de delírio. Os
governantes que temos já não conseguem assentar os pés na terra.
Tudo
isto são sinais preocupantes. Se a governação instituída está tão
distante da realidade, cuidado! O terreno começa a estar livre para
falsas alternativas ou perigosos populismos.
Como ontem referi num
artigo neste jornal, o Orçamento do Estado (OE) está trabalhado a
partir de pressupostos desastrosos e construído com múltiplas artimanhas
e manipulações.
Construir um OE a partir de uma "crença" já
profusamente denunciada e negada pela razão, ainda por cima depois de os
supostos pais da coisa (FMI e C.ª) confessarem o "erro", significa
colocar o povo e o país a darem um passo para o abismo.
Entretanto,
tomemos todas as precauções porque os governantes não são os únicos
contaminados pela "malvadez difusa" que caracteriza os tempos de crise
ou pelos fundamentos da dita "crença". Ainda recentemente ouvimos um
alto dignitário da Igreja Católica, que em matéria de análise de crenças
devia ser doutor, afirmar o seu acreditar na inevitabilidade.
Receitando ao povo o sofrimento individual, a autoflagelação, o castigo
imposto pelos puros, como caminho para a regeneração, acusa-o de se ter
deixado contaminar pela soberba, pela luxúria, pelo viver com o dinheiro
alheio.
Alguns dos que criticam este OE só o fazem porque o vírus
lhes entrou no bolso. Enquanto o ataque era só aos de baixo aplaudiram
ou foram coniventes. Para tentar que os problemas se resolvam sem
alterar muito as bases iníquas de injustiça e desigualdade do sistema,
fazem-se de descobridores da pólvora, atacam as verdadeiras alternativas
e prosseguem o jogo da calúnia, chamando "marretas" aos que defendem
soluções fora da cartilha dominante.
A sua indignação é, sem
dúvida, importante no combate que os trabalhadores e o povo têm de
travar. Contudo, há quem se limite a tentar o exercício de substituir os
aumentos de impostos por cortes na "despesa". Como não há milagres, a
receita resume-se a colocar o povo a assumir a fatura com perdas nos
direitos à saúde, ao ensino, à segurança social, à justiça, ou pagando
mais caro a eletricidade, os transportes, os bens de consumo de primeira
necessidade, os serviços públicos, as infraestruturas que suportam o
funcionamento da sociedade.
Esta semana fiz parte de um painel
numa Conferência sobre o Orçamento do Estado na Universidade Católica,
organizada por esta universidade e pela PricewaterhouseCoopers (PwC). Um
dos outros elementos do painel era Pedro Ferraz da Costa, antigo
presidente da CIP e presidente do Fórum para a Competitividade.
Presto-lhe pública homenagem pela clareza com que colocou o que muitos
andam por aí a tentar construir de forma escondida.
Ferraz da
Costa, depois de direta e indiretamente ter defendido a redução dos
salários (insistindo ainda na tese de que os trabalhadores da
Administração Pública são privilegiados), depois de ter criticado os
patrões que não perceberam a importância da descida da TSU (a ideia tem
paternidades) apontou outros "caminhos" para a saída da crise: i) que o
Tribunal Constitucional não possa "impedir a governação"; ii) que
"Portugal deve sair do euro"; iii) que regressemos às condições sociais
em que "vivíamos em 1975".
Isto ouvi eu e muitas centenas de pessoas. Acordemos!
IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
20/10/12
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