07/02/2012

MIGUEL SETAS


Um novo PIB

Num momento em que o mundo segue mergulhado numa crise resistente e prolongada, falar de felicidade parece um devaneio. O que é facto é que o debate sobre as medidas que norteiam o crescimento e o desenvolvimento dos países se tem intensificado.

A última edição da reputada revista americana Harvard Business Review apresenta "O valor da felicidade" como tema de capa.

Desde a década de 30 até hoje, tem sido o PIB (produto interno bruto) e o PNB (produto nacional bruto) que têm constituído os objetivos de crescimento das nações mundiais. Ou pelo menos, de quase todas as nações, como veremos mais à frente. O problema é que o PIB (ou o PNB) não mede necessariamente aquilo que é importante para o desenvolvimento de um país. Não separa as actividades económicas que aumentam a riqueza de uma nação, daquelas que destroem recursos naturais, causam doenças ou corrigem catástrofes ambientais, sem nunca considerar os seus custos devastadores. Por exemplo, a limpeza do Golfo do México e da Baía de Santos, depois de agredidos por derrames de petróleo, fazem parte da contabilidade do PIB, mas nem por isso estão associados a eventos que produziram bem-estar para a população. O prémio Nobel da Economia Joseph Stiglitz chegou a propor a noção do PIB Verde, que mediria a actividade económica sustentável, mas o conceito não prosperou até hoje. Não é difícil compreender por quê... Adicionalmente, o PIB per capita, com o qual os países se comparam em ‘rankings' internacionais, pouco nos diz sobre o eventual agravamento de desigualdades sociais. O caso angolano é um exemplo gritante dessa realidade. Um forte crescimento do PIB per capita nos últimos anos, que já ultrapassou os USD 8000 por pessoa (há poucos anos não passava de USD 1000), mas um Coeficiente de Gini, que mede a desigualdade social, dos mais elevados do mundo. Algumas medidas adicionais, com é o caso do IDH (índice de desenvolvimento humano) têm ajudado a complementar a visão económica do PIB. Mas a discussão mais atual centra-se na noção de "bem-estar" e de "felicidade". O primeiro ministro britânico David Cameron foi dos primeiros políticos ocidentais a estabelecer a melhoria do "bem-estar geral" (GWB - general well being) como um objetivo do seu Governo. Fê-lo com coragem, em 2010, no meio de críticas e da crise financeira. Em 2011, Portugal foi signatário de uma resolução das Nações Unidas, proposta pelo pequeno Reino do Butão, para estimular os Estados-membros na adoção de indicadores de "felicidade" e de "bem estar". O Butão, por impulso do anterior Rei Wangchuck, foi precursor na definição da chamada "Felicidade Nacional Bruta (FNB)", como objetivo-país, por contraponto ao crescimento do PIB. O Rei Wangchuck introduziu este conceito logo que chegou ao poder, em 1970, numa iniciativa que agora nos parece visionária, mas que na altura passou relativamente despercebida da comunidade internacional. Mais recentemente começaram a surgir estudos de psicólogos e economistas comportamentais sobre o efeito da felicidade no sucesso das pessoas, das organizações e das sociedades em geral. Aliás, alguns já demonstram a correlação entre a felicidade (satisfação com a vida) e a produtividade e lucro das empresas. A felicidade é, assim, um denominador comum para pessoas, empresas e países. Será que no rescaldo da crise financeira, por que passamos agora, a "Felicidade Interna Bruta (FIB)" ou o "Bem-estar Geral (BEG)" poderão ser um novo PIB?
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Miguel Setas, Vice-presidente de Distribuição e Inovação da EDP no Brasil

IN "DIÁRIO ECONÓMICO"
07/02/12

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