10/11/2010

FERNANDA CÂNCIO

    FERNANDA CÂNCIO

    IQJ*

    Ontem à tarde, no Twitter, o investigador do Instituto de Ciências Sociais Pedro Magalhães referia que Portugal subira um lugar, de 41.º para 40.º, no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da ONU. Logo de seguida retuítou (difundiu) um tuíte de José Manuel Fernandes, ex-director do Público, com o linque de uma notícia do Expresso que anunciava uma descida de seis lugares para o país no IDH. Tentando perceber o motivo da discrepância, Magalhães foi investigar e descobriu que os critérios do IDH mudaram, pelo que as posições dos países também. Assim, apesar de ter melhorado os seus indicadores, Portugal passou de 34.º em 2009 para 40.º em 2010. A página relativa ao país, que ostenta um gráfico, não permite dúvidas: Portugal tem vindo sempre a subir (embora pouco desde 2000) de 1980 a 2010.
    A origem do erro, a agência Lusa, acabou por corrigi-lo ao fim da tarde. Os sites dos jornais foram alterando as respectivas notícias sobre o relatório. Mas, se de algum modo a mudança de critérios faz compreensível a confusão da agência, há algo que não se percebe: sabendo-se quais são os parâmetros - longevidade, escolaridade, rendimento per capita - que o ranking da ONU considerava até agora (foram-lhe este ano acrescentados mais três, entre eles a desigualdade de género) - não parece ter ocorrido a ninguém uma pergunta básica, a saber, que hecatombe se teria passado por cá entre 2008 e 2009 para justificar uma queda de seis lugares. Assim de repente ninguém se recorda, não é? Aliás, pelo contrário: nos indicadores da OCDE e do Eurostat Portugal tem vindo a diminuir, mesmo se ligeiramente, o índice de pobreza; o Governo tem sido periodicamente acusado de "facilitismo" na escola e de "fraude" na educação de adultos, com vista, alegadamente, à melhoria dos indicadores escolares do País, logo, se esses indicadores estivessem a piorar dificilmente ocorreria a alguém fazer esse tipo de denúncia; não demos conta de estar a morrer mais e mais cedo.
    Que explica, então, o automatismo acéfalo, em alguns casos despudoradamente triunfante, com que se reproduziu uma informação tão negativa? A resposta a esta pergunta não é fácil nem exclusivamente conjuntural. Para além da óbvia má vontade da generalidade dos media em relação ao Governo em funções, há algo mais fundo que leva os portugueses, a começar pelos jornalistas, a estar sempre prontos a acreditar no pior possível sobre si e o seu País, sobretudo quando vem "de fora". Medo de existir ou desculpa para ser medíocre, este penchant provinciano pelo auto-insulto e pelo desmerecimento tem no jornalismo um nome bem menos romântico: incompetência e enviesamento. Comprazamo-nos pois com isso - no ranking da qualidade jornalística, tem sido sempre a descer.
    *Índice de Qualidade Jornalística

    IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
    05/11/10

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