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Acelerar a transição
climática no pós-pandemia
Num mundo de alterações climáticas e riscos que se sobrepõem, como podemos salvaguardar a construção pós-Covid de uma sociedade e economia justas e resilientes à mudança do clima?
No início
de maio, águas lamacentas destruíram um pequeno hospital distrital no
Uganda, eliminando-o como instalação médica num futuro próximo,
possivelmente para sempre. Felizmente, a equipa médica e os pacientes do
Hospital Kilembe Mines, na cidade de Kasese, viram atempadamente o rio
Nyamwamba subir e tiveram tempo de evacuar.
Que melhor símbolo
para o mundo atual, com riscos múltiplos, do que a visão de um hospital
num país em confinamento devido à Covid-19 ser devastado por uma
inundação súbita, relacionada com as mudanças climáticas?
O incidente gerou vídeos e imagens
impressionantes, fornecidas pelos socorristas da Cruz Vermelha do
Uganda, para nos lembrar que a natureza não respeita limites. Na
verdade, este é apenas um pequeno exemplo de um conjunto de riscos que
atualmente afetam a África Oriental. No Centro Climático da Cruz Vermelha
são examinados mapas sobrepostos de dois perigos bastante distintos: as
inundações, relativamente previsíveis; e os vastos enxames de
gafanhotos. Os riscos ocorrem em regiões pobres e, em alguns casos, de
conflito, agudizando a vulnerabilidade das comunidades afetadas. Todos
são intensificados pela pandemia de Covid-19.
Qualquer um destes
riscos pode ser altamente invulgar (inundações extremas, gafanhotos) ou
até mesmo completamente novo (Covid-19); porém, ter de enfrentar os três
em simultâneo é algo para o qual nenhum plano de contingência, por mais
diligente que seja, tem resposta.
A atual pandemia revela o quão
vulneráveis as pessoas são face a crises inesperadas e, por isso, é
necessário fortalecer a resiliência, investindo na prevenção e
preparação de desastres. Uma componente-chave para a construção da
resiliência é compreender e desenvolver as capacidades de resposta
dentro de uma comunidade.
Parece que os dias das grandes equipas
humanitárias internacionais a responderem a desastres estão contados.
Tal como, em resposta à Covid, repensamos formas de trabalhar remotas e
modelos de negócio, também o setor humanitário deverá cada vez mais
institucionalizar novas formas de trabalhar para garantir o
fortalecimento local, com a mobilização de recursos e conhecimento
globais para esse fim.
Para pensar melhores soluções precisamos de
juntar as diferentes respostas. Os governos estão a desenhar planos de
recuperação para lidar com o impacto económico, e devemos refletir como
será a reestruturação das nossas economias com os elevados investimentos
na recuperação pós-Covid-19.
Ao serem repensadas as prioridades
novas falhas surgirão, tais como a desigualdade. É crucial identificar
essas lacunas atempadamente e garantir que os fundos para a recuperação
do confinamento são investidos num futuro justo e sustentável.
Assim,
os orçamentos de resposta à pandemia não podem ser vistos como a
solução a longo prazo: é necessário examinar os nossos sistemas e os
seus incentivos, tal como os fundos climáticos, e garantir que estes, de
facto, incluem os mais vulneráveis. E devemos investir mais na
capacidade de adaptação aos impactos das alterações climáticas.
Globalmente, do total de 579 mil milhões de dólares, apenas 30 mil milhões são dirigidos à adaptação.
Hoje, menos de 10% de todo o financiamento climático é
aplicado a nível local, o que é chocante, pois é precisamente nas
comunidades locais que ocorrem os maiores impactos das alterações
climáticas.
Felizmente, estão a ser tomadas medidas: o Banco Mundial desenvolveu orientações
para tornar o investimento pós-Covid sustentável, cidades como Milão
estão a transformar estradas em faixas para peões e o compromisso da
Comissão Europeia com o “European Green Deal”
mantém-se, tornando-o parte integrante de uma recuperação pós-Covid
(impulsionada, obviamente, pela força de 1,85 biliões de euros).
Tempos
de crise oferecem oportunidades para mudanças de 180°. A pandemia expôs
as vulnerabilidades da nossa economia globalizada e devemos reconstruir
e repensar as nossas economias e sociedades assentes num conjunto
diferente de regras. Precisamos de uma liderança ousada para estabelecer
as bases de uma sociedade mais justa e resiliente ao clima. E a hora da
mudança é ontem.
* Alumna The Lisbon MBA Católica-Nova e Business Development Cruz Vermelha Holandesa Fundo Princesa Margriet
IN "O JORNAL ECONÓMICO"
08/06/20
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