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HOJE NO
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Consumo online.
Os novos hábitos que o futuro promete travar
O confinamento alterou os hábitos de consumo dos
portugueses e as compras online já não se resumem aos bens essenciais,
mas há fatores que prometem adiar a “revolução” comercial anunciada.
A semana passada veio confirmar a tendência
que o atual contexto de confinamento já fazia adivinhar: as compras
online tiveram um “aumento significativo” em Portugal e o valor médio de
cada transação cresceu dos 37,50 para os 38,90 euros (+4%). Os dados da
SIBS (empresa que gere a rede Multibanco) apontam para a alteração dos
padrões do consumo, resultante das restrições aos movimentos. Embora as
compras iniciais se resumissem, em grande medida, aos produtos
“essenciais” – alimentação e higiene e saúde –, o leque de preferências
foi, entretanto, sendo alargado ao longo do mês de março; e a
confirmação chegou em abril. “Os bens essenciais continuam a ser muito
consumidos, mas as pessoas começaram também a adquirir produtos que
ajudam a equilibrar a sua dimensão emocional”, afirma Mafalda Ferreira,
do Instituto Português de Administração de Marketing (IPAM).
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Aproveitando um conjunto inédito de ofertas, os portugueses foram
comprando por e-commerce. As passadeiras de corrida ou as bicicletas de
manutenção, por exemplo, que permitem praticar desporto em casa,
evaporaram-se dos stocks. Mas também os produtos de vestuário, cosmética
ou até brinquedos, à medida que a Páscoa se foi aproximando, viram as
suas vendas através dos meios digitais bater recordes.
Ao i, Mafalda Ferreira explica que “muitas marcas adaptaram-se à
situação em que vivemos, criando mecanismos facilitadores e de
atratividade, melhoraram as suas plataformas e garantindo conforto na
aquisição e transporte dos produtos. E, é claro, lançaram várias
promoções. Mesmo as empresas que não têm tradição de fazer promoções
avulso estão, atualmente, com preços muito mais baixos”, sublinha. Uma
estratégia que permitiu conquistar a atenção e preferência dos
consumidores portugueses, assegurando às empresas manter algum nível de
faturação, enquanto os espaços físicos ainda se encontram encerrados.
Fraude “dispara” Porém, o conforto trouxe consigo um preço a pagar. A
culpa? Talvez da falta de literacia digital dos portugueses. Ou apenas
dos esquemas (bem) montados por quem procura enganar. O número de
queixas por burlas e fraude aumentou no primeiro trimestre de 2020, e a
estatística “disparou” mesmo com o início do estado de emergência: o
Portal da Queixa registou, em três semanas, 356 reclamações por
suspeitas de irregularidades em transações por meios digitais, o que
perfaz 16 queixas por dia. O destaque negativo vai para a aplicação MB
Way, onde os casos de roubo de montantes financeiros cresceu 391%, face
ao período homólogo.
“As pessoas ainda são muito facilmente induzidas para situações de
burlas e fraude, mas agora estão naturalmente mais expostas a estas
situações”, refere a professora do IPAM. Mafalda Ferreira considera que,
neste momento, com o crescimento das pesquisas online, e uma maior
presença nas redes sociais, torna-se “cada vez mais importante que as
pessoas optem sempre por websites que lhes garanta segurança, de marcas e
produtos que já conhecem à partida”.
Neste capítulo, importa também a postura a adotar por todos os
intervenientes, pois, num negócio, tanto lucra quem vende bem como quem
compra bem. “Existem questões éticas a ter em consideração e os laços
que as empresas vão criar, durante este período, com o consumidor, vão
ser fundamentais para definir os hábitos de consumo online no futuro, e
logo a partir da fase pós-confinamento. Os consumidores não se vão
esquecer daquilo que agora está a acontecer”, garante Mafalda Ferreira.
A professora do IPAM reforça que “é importante que as marcas tenham
consciência social, que não tentem aproveitar uma situação de maior
vulnerabilidade por parte dos consumidores, pois é essa relação que se
vai estabelecer agora, de confiança ou desconfiança, que vai persistir e
determinar o que acontecerá a seguir”. “Uma má relação com uma marca,
neste contexto, pode ser complexo no presente, mas será ainda muito mais
no futuro, a partir do momento da retoma”, diz. E pode, em última
instância, moldar a maneira como os portugueses vão olhar para o consumo
por meios digitais.
No velho futuro “O comportamento tende a ser normalizado”, afirma
Mafalda Ferreira. Embora o crescimento de compras online tenha acelerado
há três semanas, a analista do IPAM confia que o cenário mais provável
seja que os portugueses continuem, no futuro, a optar por fazer compras
em lojas físicas, não se prevendo, para já, a “revolução” tecnológica
comercial já preconizada. E não só porque a população, envelhecida, se
recusará a abdicar dos velhos hábitos, mas porque a pandemia do novo
coronavírus promete deixar marcas profundas, podendo mesmo alterar o
perfil do consumidor comum (seja em espaço físico ou online). A ética,
neste caso, será determinante. “A sensação de vulnerabilidade e
impotência que as pessoas sentem fará, certamente, que reflitam mais
sobre o mundo e a vida. Vão ficar marcas, e será este o verdadeiro
desafio das marcas. Algumas vão aproximar-se, mas outras vão afastar-se
do consumidor irremediavelmente”, diz Mafalda Ferreira.
A crise económica e social paira sobre os portugueses e último estudo
da consultora McKinsey, que avalia o nível de confiança dos
consumidores dos países afetados pela pandemia – incluindo Espanha,
Itália, Estados Unido, China e também Portugal –, indica que os
portugueses são mesmo dos que têm uma perspectiva mais negativa e
pessimista em relação ao que virá.
* On-line ou à pata o consumismo é debilidade mental.
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