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IN "SÁBADO"
23/01/19
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Violência Doméstica
Saliente-se porém que, nos crimes de violência doméstica, à semelhança de todos os demais, e por imperativo constitucional, o/a arguido/a presume-se inocente até trânsito em julgado da decisão condenatória.
Portugal ratificou, em 2013, a Convenção do Conselho da Europa para a
Prevenção e o Combate à Violência Contra as Mulheres e a Violência
Doméstica (Convenção de Istambul). A própria Convenção prevê a
existência de um órgão especializado e independente, composto por um
grupo de peritos – GREVIO – que tem por escopo a monotorização da sua
aplicação por parte dos Estados signatários.
Foi
conhecido esta semana o primeiro relatório de avaliação, realizado a
Portugal, por parte do GREVIO. Este relatório, embora reconheça o
compromisso significativo das autoridades portuguesas e os progressos
alcançados, indica uma série de aspectos que aponta como deficiências,
tratando-se de aspectos a melhorar.
Direccionadas aos Tribunais, são apresentadas, como críticas (e, como
tal, aspectos a "melhorar") a baixa taxa de condenações e o elevado
número de penas de prisão suspensas na sua execução, em ambas as
situações nos casos de crimes de violência doméstica. A este propósito é
dito, que neste tipo de crimes, apenas cerca de 7% das denúncias
apresentadas terminam em condenação.
Importa, antes de mais,
salientar que, no que respeita ao Tribunal, apenas poderá ser aferida a
taxa de condenações com base no número de processos em que é deduzida
acusação e não com base no número das denúncias entradas. Com efeito,
cabe ao Ministério Público, no âmbito dos poderes de direcção do
inquérito e enquanto seu titular, determinar o destino que é dado às
denúncias/queixas apresentadas e apenas aquelas que terminam em acusação
são remetidas ao Tribunal e submetidas a julgamento. Não é pois
possível, pelo menos através dos critérios enunciados, apurar qual a
efectiva percentagem de condenações.
Saliente-se porém que, nos
crimes de violência doméstica, à semelhança de todos os demais, e por
imperativo constitucional, o/a arguido/a presume-se inocente até
trânsito em julgado da decisão condenatória. E, como em todas as
situações, para que se verifique uma condenação, os factos que integram a
prática do crime têm que ser provados em audiência de julgamento. E,
por vezes, tal prova não é feita.
Não é, desde logo porque existem
situações de denúncias falsas. E, se estas ocorrem em todo o tipo de
crimes, aqui existem razões acrescidas para que se verifiquem: em casos
de elevada conflitualidade entre um casal – em que muitas vezes se perde
a racionalidade – a obtenção do estatuto de vítima de violência
doméstica pode ser decisivo para efeitos de atribuição da casa de morada
de família ou da guarda dos filhos menores.
Por outro lado,
estamos perante crimes que ocorrem no seio da família, em espaço
reservado e em que, por regra, a única testemunha da sua ocorrência é a
vítima. E esta – dada a sua especial relação de proximidade com o
agressor/a – pode, legitimamente, recusar-se a prestar depoimento em
audiência o que se traduzirá, por regra, numa total ausência de prova
que conduzirá à absolvição. Tal ocorre frequentemente, sobretudo nos
casos em que ocorreu uma reconciliação entre ambos.
No que
concerne às penas aplicadas, salienta-se que o crime de violência
doméstica tem uma abrangência muito vasta, compreendendo no seu tipo
legal condutas de extrema gravidade praticadas de forma reiterada e
durante longos períodos de tempo (por ex. agressões físicas e verbais de
extrema violência constantes ao longo de anos) como também
comportamentos de reduzida gravidade, meramente ocasionais, espaçados no
tempo ou mesmo que se traduzem num acto único (por ex. o dirigir uma
expressão injuriosa numa única ocasião). Pese embora se trate sempre do
mesmo crime, as penas a aplicar têm necessariamente que ser distintas e
encontradas em função, entre outros elementos, da gravidade do acto
concreto praticado.
Acresce ainda que os factores legais que, no
nosso ordenamento jurídico, determinam a aplicação de pena de prisão
efectiva ou a sua suspensão, se prendem com a pessoa do arguido/a e não
com os ofendidos ou com a gravidade dos crimes em causa.
Em
suma, não nos podemos esquecer que o crime de violência doméstica, por
mais importante que seja o seu combate e a protecção das suas vítimas,
como efectivamente deve ser, está sujeito aos mesmos princípios
constitucionais e processuais que os demais crimes.
IN "SÁBADO"
23/01/19
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