30/11/2018

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HOJE NO  "JORNAL DE NEGÓCIOS"
Trabalhadoras do turismo são alvo de “bullying” e discriminação

“Bullying” por superiores hierárquicos na altura da gravidez e da licença de maternidade ou salários mais baixos relativamente aos colegas apenas por serem mulheres, são motivo de queixa das trabalhadoras do sector do turismo, conclui um estudo da Universidade de Aveiro.

O sector do turismo, que directa e indirectamente representa mais de 20% do emprego gerado em Portugal, maioritariamente feminino, "é marcado por profundas desigualdades entre homens e mulheres", registando "menores oportunidades de progressão na carreira para as mulheres, a par com salários mais baixos, bem como discriminação na altura da gravidez e da licença de maternidade", conclui o mais recente estudo da Universidade de Aveiro (UA) sobre discriminação de género em Portugal.
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O trabalhado realizado por Inês Carvalho, da Unidade de Investigação em Governança, Competitividade e Políticas Públicas (GOVCOPP) da UA, que envolveu a análise de bases de dados relativas a todos os trabalhadores do sector privado e 24 entrevistas a mulheres com cargos de topo na indústria do turismo e de vários pontos do país, revela que, apesar da "renitência em utilizarem o termo discriminação de género e afastarem-se com isso de discursos de vitimização, a quase totalidade das entrevistadas reconhece situações de desigualdade de género no sector".

De acordo com o estudo, divulgado pela UA, em comunicado, cerca de um quarto das entrevistadas "experienciou situações de discriminação directa, tais como ‘bullying’ por superiores hierárquicos na altura da gravidez e da licença de maternidade ou salários mais baixos relativamente aos colegas homens apenas por serem mulheres".

Acresce, revela Inês Carvalho, que "cerca de dois terços destas mulheres experienciou situações de discriminação indirecta, um tipo de discriminação mais difícil de identificar porque na maior parte dos casos não é interpretada como discriminação a sério", nota a investigadora, acrescentando ainda que "o facto de a discriminação indirecta ser subtil e muitas vezes não intencional faz com que se perpetue".

Isto porque, explica, "há determinados comportamentos e preconceitos que estão de tal forma enraizados na nossa sociedade, que acabam por ser normalizados e aceites", os quais passam, por exemplo, pela ideia de as mulheres "serem consideradas menos competentes do que os homens para determinadas funções até que provem o contrário" ou "as suas opiniões não serem ouvidas em negociações importantes".

"As mulheres são ainda vistas como menos competentes do que os homens para cargos de chefia"
Segundo a mesma investigadora, que é também docente da Universidade Europeia, há três aspectos nos quais as desigualdades nas organizações ligadas ao turismo estão alicerçadas.

Antes de mais, "há uma ideia de que as mulheres são primordialmente mães, independentemente de serem mães, ainda não serem ou nunca virem a ser", sendo que, num ambiente laboral em que o trabalhador considerado perfeito é o que está sempre disponível e não tem mais nenhum compromisso para além do trabalho, diz Inês Carvalho, "é o estereótipo do trabalhador do sexo masculino que mais se aproxima desse ideal".

Uma realidade que "se agrava ainda mais no sector do turismo, em que os hotéis estão abertos 24 horas por dia e as agências de viagens têm de lidar com clientes e fornecedores em fusos horários diferentes", sublinha a UA.

Em segundo lugar, sinaliza o estudo, "as mulheres são ainda vistas como menos competentes do que os homens para determinadas funções, nomeadamente para cargos de chefia", com as mulheres a sentirem que "têm de prestar provas adicionais para estarem em pé de igualdade com os seus colegas do sexo masculino". Daí que a educação seja "valorizada por muitas mulheres como um trunfo ou prova adicional da sua competência".

O estudo da UA regista ainda que "o preconceito de que as mulheres não são adequadas para cargos de topo é reforçado pela preferência dos homens em lidar com outros homens, entre os quais é normal estabelecerem-se redes informais de contacto fora do local de trabalho".

Inês Carvalho ressalva que "nem sempre são os homens que activamente excluem as mulheres deste tipo de socialização, mas são os horários e contextos em que estes contactos são estabelecidos que colocam barreiras à participação das mulheres", quer seja "porque ainda são as mulheres quem mais fica em casa a tomar conta dos filhos após o horário de trabalho, quer seja porque este tipo de socialização fora do horário de trabalho com colegas maioritariamente do sexo masculino não é visto com bons olhos pelos respectivos maridos ou parceiros".

Resultado: "Muitas das entrevistadas descreveram as organizações em que trabalham como locais em que, apesar de não haver discriminação intencional (embora em alguns haja), é mais fácil ser homem do que ser mulher", conclui o estudo.

* - Senhoras do meu país cruzem as pernas com firmeza!

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