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HOJE NO
"AÇORIANO ORIENTAL"
Há mais de cem anos foi criado
nos Açores sistema pioneiro
de previsão de ondas
Há mais de cem anos, os Açores tiveram
um papel fundamental na previsão das ondas que chegam às costas de
Portugal continental e de Marrocos, explica o oceanógrafo Álvaro Semedo,
que conta como surgiu o sistema pioneiro.
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O
sistema de pré-aviso apareceu, pela primeira vez, em 1913, depois de
uma tempestade ter atingido Casablanca, em Marrocos, “de forma
inesperada”, provocando danos significativos: “destruiu uma grande parte
do porto, que ficou inoperativo durante muito tempo, e destruiu muitos
navios”.
“Casablanca
e Rabat eram dois portos muito importantes porque eram a porta de saída
para os fosfatos, que ainda hoje são uma das principais exportações de
Marrocos”, explica, em declarações à Lusa, o oceanógrafo, professor no
Delft Institute, na Holanda.
A
paralisação do porto levou as autoridades a criar ou idealizar um
sistema de previsão de ondas, já que em situações de bom tempo em
Marrocos nada faria prever estas tempestades com ondas alterosas.
A
criação do sistema foi impulsionada pelo coronel da Marinha Portuguesa
Afonso Chaves, criador do serviço meteorológico dos Açores, um projeto
com repercussões internacionais, e pela Marinha Francesa, que tinha
interesse acrescido numa solução por Marrocos ser então um protetorado
francês.
“Decidiram
criar este sistema de previsão de ondas baseado em observações porque,
na altura, a previsão da meteorologia e das ondas era completamente
diferente da que é feita hoje. Esse sistema era baseado em observações
que seriam colhidas ou por navios no meio do Atlântico, ou então - e
isso seria a situação ideal - por observações recolhidas nos Açores”,
refere Álvaro Semedo.
No
meio do Atlântico, a região conseguia transmitir o resultado, via TSF
(telegrafia sem fios) ou por cabo submarino, e as informações eram
rapidamente distribuídas pelo mundo.
“O
sistema era muito simples”, explica o cientista, acrescentando: “Como
as ondas se propagam ao longo de uma certa distância, e são provocadas
pelo vento, se uma tempestade passasse nos Açores seria expectável que
se propagasse ou desse origem a ondas que se propagassem até Marrocos.”
Assim, uma tempestade de ondas nos Açores daria origem, dentro de um ou dois dias, a ondas na costa de Marrocos.
“A
base do sistema era esta, era um sistema de pré-aviso”, refere o
especialista, sublinhando que a ideia inicial “foi melhorada, porque
rapidamente se começou a observar que um certo tipo de tempestades daria
origem a um certo tipo de ondas em Marrocos”.
Verificou-se
que tanto a velocidade do vento como o trajeto das tempestades
permitiam organizá-las em grupos, ou seja, classificá-las.
Seis
anos após ter começado a ser desenvolvido, o sistema ganhou
notoriedade, em 1919, altura em que o cientista Louis Gain publicou “La
prédiction des houles au Maroc” (“A previsão da ondulação em Marrocos”).
O estudo
explica como é que a informação recolhida permitia prever com dias de
antecedência o estado do mar, com base em dados recolhidos entre 1915 e
1918.
Com a
Primeira Guerra Mundial (1914 -1918), o processo sofreu atrasos, mas foi
finalizado em 1922. E o que foi inicialmente criado com o intuito de
proteger os portos de Marrocos ganhou escala e foi aplicado noutros
sítios.
Inicialmente
houve só o envolvimento dos serviços meteorológicos dos Açores (com
observações nos Capelinhos, no Faial, por exemplo), mas a relevância dos
dados recolhidos levou a que começassem a ser obtidas observações no
continente (no cabo Raso ou da Roca, entre outros). Eram normalmente
feitas por faroleiros.
Em
fevereiro de 2019, assinalam-se os cem anos da publicação de Louis Gain
nos Anais Hidrográficos franceses, um trabalho basilar para a ciência
da previsão de ondas e o primeiro a reconhecer a importância das
observações nos Açores para a costa ocidental europeia e o noroeste de
África.
* A notícia dá a conhecer um pedaço da história de Portugal ignorada pela maior parte dos portugueses.
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