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HOJE NO
"DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
Como o PSD se aliou ao PS para
tramar a Polícia Judiciária
Os inspetores da PJ denunciam "interesses difusos" e "estratégias pouco claras" no plano do governo que arrancou a esta polícia a base de dados de registo de passageiros da aviação comercial (Passenger Name Record) e a põe sob tutela do primeiro-ministro. E isto depois de a PJ ter gasto 1,4 milhões de euros em equipamento.
A Polícia Judiciária (PJ) teve ordens da tutela e financiamento para
receber a gigantesca base de dados - o Passenger Name Record (PNR), que
vai guardar informações de todas pessoas que viajam de avião - que o governo agora decidiu colocar na dependência do Sistema de Segurança Interna (SSI),
sob tutela do primeiro-ministro. Desde 2012 que a PJ está a preparar-se
para este projeto que a União Europeia entende ser um importante
instrumento para a investigação criminal, no âmbito da prevenção e
investigação do terrorismo e outra criminalidade grave e violenta. A PJ
recebeu e gastou, para o efeito, 1,4 milhões de euros em fundos europeus
para equipar as instalações e formar quadros, mas, sem avisar, sob
pretexto da transposição da diretiva comunitária, o governo voltou
atrás. O PSD apoia.
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Em causa está todo o registo feito pelas
companhias aéreas, um total de 19 itens com informações sensíveis (desde
nome, morada e contactos, dados sobre os cartões de pagamento,
itinerário, o que comeu, entre outros). Trata-se de uma recolha de
informação em massa - de suspeitos e não suspeitos - através da qual são
analisados determinados padrões que ajudam a identificar potenciais
criminosos. Com o projeto do governo, todas as outras policias - GNR,
PSP e SEF - passam também a ter acesso a estes dados. A base de dados
ficará instalada num novo organismo, o Ponto Único de Contacto para a
Cooperação Policial Internacional, do SSI, onde estão todas as forças e
serviços de segurança, uma espécie de "balcão único" para todos os
sistemas de partilha de informação, como a Europol e a Interpol.
Num
ofício de sete páginas, enviado no início da semana a todos os grupos
parlamentares, o sindicato que representa os inspetores da Polícia
Judiciária (PJ) - Associação Sindical dos Funcionários da Investigação
Criminal (ASFIC) denuncia "interesses difusos" e "estratégias pouco
claras" nesta reviravolta legislativa e faz a sua derradeira tentativa
de conseguir que os deputados travem, em sede de especialidade, este
projeto que já foi aprovado em plenário,
com os votos favoráveis do PS e do PSD, em julho passado. Determina a
criação do Gabinete de Informação de Passageiros (GIP) no Ponto Único de
Contacto para a Cooperação Policial Internacional (PUC-CPI), sob a
coordenação do SSI.
Revela a ASFIC nesta missiva, a que o DN teve
acesso, que as indicações de que seria a PJ a responsável pelo PNR
fundamentaram-se, por um lado, no anteprojeto de lei que determinava a
criação da UIP na dependência deste corpo especial de polícia e, por
outro, no facto de a PJ ter sido a beneficiária de dois programas
europeus, em 2012 e em 2014, uma decisão ainda tomada pelo anterior
governo. Alega a estrutura sindical que este anteprojeto, a que o DN
teve também acesso, foi já preparado pelo atual governo e foram ouvidas
várias entidades.
Investimento e prazos cumpridos
Um dos programas europeus - o Projeto HOME/2012/ISEC/AG/PNR/4000004448, no valor de 1 153 318,68 euros - permitiu à PJ desenvolver software
e adquirir licenças, servidores, computadores e restante equipamento
(secretárias, cadeiras, etc.) tendo em vista equipar os postos de
trabalho necessários à prossecução da missão ", explica o sindicato.
"Este projeto está finalizado e a solução desenvolvida está pronta a
funcionar com ligação à base de dados da PJ (apenas terrorismo e
criminalidade grave), Sistema de Informação Schengen e Interpol, 24
horas por dia, sete dias por semana", diz o sindicato.
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No
segundo - HOME/2014/ISFP/LAWX/7150, no valor de 184 798,91 euros -,
liderado pela Hungria, a PJ participou com outros Estados membros
no estudo de uma solução de interoperabilidade de bases de dados PNR. A
ideia era assegurar um quadro legal comum e garantir soluções
tecnológicas idênticas com vista ao intercâmbio de informações sobre
dados PNR entre Estados membros.
"O
investimento financeiro foi feito e os prazos foram cumpridos;
criando-se as necessárias condições para que a UIP opere na PJ, entidade
que, de acordo como a Lei de Organização da Investigação Criminal
(LOIC), tem a competência em matéria de investigação criminal de todos
os crimes graves elencados na diretiva comunitária", assinala a ASFIC.
O
DN confirmou junto a fontes próximas da anterior direção da PJ que,
pelo menos, até ao início deste ano não houve nenhuma indicação do
governo em relação à mudança de planos. "Tudo o que foi feito teve por
base orientações da tutela, que começaram ainda com o anterior executivo
e que o atual governo não alterou. Até ter apresentado o novo projeto
de lei", afirma um desses responsáveis.
Os inspetores consideram
que esta nova opção "carece, por um lado, de clareza quanto à orientação
política assumida pelo atual executivo, sobretudo após o largo
investimento já feito pela PJ, e, por outro, julgamos que é exigível ao
Estado um mínimo de certeza e segurança do direito quando estão em causa
dados pessoais dos cidadãos". Para a ASFIC, "num Estado de Direito
Democrático onde a ordem de valores repousa essencialmente na
Constituição, na segurança jurídica e na liberdade, não podem os
cidadãos permitir a sua submissão a interesses difusos e a estratégias
pouco claras que ultrapassam o interesse público, tantas vezes estando
em causa finalidades que servem as organizações e os lugares de Estado
em si mesmos e não os propósitos ou as missões porque foram criados".
Paradigma securitário
"No
fundo, parece-nos que já não estão em causa as questões suscitadas
pelos competentes pareceres acima mencionados, mas tão-só a defesa de um
paradigma securitário onde se confunde o que é o tratamento de dados
estritamente policiais ou o intercâmbio de informações ao nível da
cooperação policial com o tratamento e análise de dados pessoais, de
todos os cidadãos - e que se frise, cidadãos à partida não suspeitos de
qualquer atividade ilícita - que viajam em transportadoras áreas",
alertam.
E reforçam o seu apelo, sublinhando que é preciso que
se tenha consciência de que não se trata aqui de um mero controlo
administrativo de fronteiras que permite localizar indivíduos já
conhecidos entre os passageiros de voos intracomunitários ou extracomunitários;
pelo contrário, o que se pretende é elevar o nível da análise de
determinados padrões tendo por escopo a deteção de indivíduos não
conhecidos, que possam estar diretamente relacionados com o terrorismo e
a criminalidade grave".
Consideram que "o que
verdadeiramente está em causa é uma cedência de privacidade face a uma
necessidade muito específica: a identificação de indivíduos
desconhecidos relacionados com o terrorismo e a criminalidade grave,
razão pela qual uma unidade com a atribuição de tratar dados PNR se deve
posicionar na esfera do judiciário e deter competência para a
investigação desses crimes".
Os
inspetores da PJ reconhecem que "o fenómeno do terrorismo fundado no
radicalismo islâmico tem aberto portas para o alargamento das
competências de prevenção e deteção nesta matéria a outras entidades".
No entanto, entendem, "em razão do melindre que a matéria PNR reveste em
termos de direitos fundamentais, que se deve ter presente o âmbito de
intervenção e os limites funcionais de cada uma destas entidades ao
nível do terrorismo, do financiamento do terrorismo e da criminalidade
transnacional ou internacional grave". Para esse "âmbito de intervenção"
a PJ é "a entidade de referência", mas a ASFIC considera que outras
polícias "devem integrar a UIP, possibilitando a articulação em
diferentes planos por forma a oferecer uma resposta mais eficaz". Mas
sob a orientação da PJ e não do SSI.
PS e PSD não mudam de ideias
A discussão na especialidade da proposta de lei do governo ainda não está
agendada, segundo confirmou ao DN a comissão de Assuntos
Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. Questionados os
partidos, não há sinais, pelo menos do PS e do PSD - que bastam para
fazer passar o diploma - em mudar de ideias.
Fonte do grupo
parlamentar socialista adiantou que vão ser apresentadas propostas de
alteração, mas não quis revelar o conteúdo. Questionada sobre se o PNR
poderia voltar de novo à PJ, escusou-se a responder.
O PSD foi
mais assertivo: "Está fora de questão. Não faz qualquer sentido que um
projeto com este alcance fique na dependência só de uma polícia, quando
existe uma entidade como o Ponto Único de Contacto-Cooperação Policial
Internacional na dependência do SSI, onde todas as polícias podem
desempenhar o seu importante papel na prevenção e combate ao terrorismo e
à criminalidade grave", defende o deputado Luís Marques Guedes,
coordenador na bancada para esta área. O SSI é atualmente dirigido pela
procuradora-geral adjunta, nomeada por Pedro Passos Coelho e reconduzida
já por António Costa.
Marques Guedes revela que os
sociais-democratas vão fazer uma proposta de alteração, mas para que os
serviços de informações, SIED e SIS, e a Autoridade Tributária (AT)
possam também fazer parte da UIP. "São entidades que têm um papel
fundamental no combate aos crimes em causa. Os serviços de informações
da sua deteção, o primeiro pilar da Estratégia Nacional de Combate ao
Terrorismo, a AT contra o seu financiamento", lembra.
O CDS
mostra-se mais sensível às preocupações dos inspetores da PJ, mas
remetem uma posição definitiva para depois de serem conhecidos todos os
pareceres pedidos pela comissão a várias entidades. "Entendemos que, em
princípio, essa entidade deverá ficar sob a alçada da PJ - que é quem, à
partida, tem competência para a investigação desses crimes. Mas
esperamos por mais pronúncias para tomarmos uma decisão final", afirma a
deputada Vânia Dias da Silva.
Lembra que os pareceres até agora recebidos, um da Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD), outro do Conselho Superior de Magistratura
(CSM) "são absolutamente contraditórios sobre a entidade que deve ser
responsável pelo tratamento destes dados. Para a CNPD a proposta do
governo não cumpre a diretiva porque o SSI não é a autoridade competente
para a prevenção e a repressão de infrações terroristas e criminalidade
grave, enquanto o CSM acha que sim. Daí a importância de aguardar pela
opinião do Conselho Superior do Ministério Público e da secretária-geral
do SSI". De acordo com a 1.ª comissão, estes pareceres, pedidos em
junho, ainda não chegaram.
A esquerda, que tem objeções de
princípio ao PNR, também não revela se vai propor mudanças ao diploma
sobre esta questão. "A nossa oposição à proposta é de fundo e sobre
escolhas de fundo de política que ela contém. Algo muito difícil de
superar com simples afinações de detalhe", assevera o deputado bloquista
José Manuel Pureza.
O deputado do PCP responsável da bancada pela
Justiça, António Filipe, foi contactado pelo DN, mas não ainda
respondeu. O mesmo silêncio foi, até agora, a resposta do Ministério da
Justiça e da PJ, quando confrontados com a mudança de planos do governo.
* Com a sua peculiar prosápia o sr. primeiro-ministro virá dizer que "é só fumaça", mas sabemos que se pretende esvaziar a PJ de capacidade de pesquisa e intervenção.
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