HOJE NO
"AÇORIANO ORIENTAL"
Brexit:
União Europeia não se apercebeu da
.crise potencial, afirma investigador
O sociólogo britânico John Thompson diz
que a questão da imigração proveniente do interior da União Europeia
(UE) foi decisiva para o processo do ‘Brexit’ e concluiu que os líderes
europeus não se aperceberam dessa crise potencial.
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“No
Reino Unido sempre existiu, desde há muito, uma forte cultura
eurocética. A identidade europeia era mais frágil do que noutros países e
isso foi decerto um fator para o resultado do referendo sobre o
‘Brexit’”, considerou John Thompson, professor de Sociologia na
Universidade de Cambridge.
O
académico falava na terça-feira em Lisboa à margem da apresentação do
livro “Europe’s Crisis” (As Crises na Europa) editado por Manuel
Castells e no qual colaborou na edição com outros académicos.
Ao
referir-se ao resultado do referendo de junho de 2016 no Reino Unido,
que decidiu a saída do país da União Europeia (UE), John Thompson
identificou fatores determinantes que ditaram o resultado da consulta.
“O
‘Brexit’ é uma história específica, relacionada com uma dinâmica
particular na política britânica, com o Partido Conservador [no poder] e
o Partido Independente do Reino Unido [UKIP direita nacionalista
eurocética]”.
Quando
decorreu referendo sobre o ‘Brexit’, em junho de 2016, a questão da
imigração teve um profundo significado no desfecho final, com 51,89% dos
votos a favor da saída.
“Foi
sobretudo uma imigração vinda do interior da União Europeia (UE), um
fator muito importante. Era proveniente da Europa de leste, do interior
da UE, para o Reino Unido, e tornou-se uma questão decisiva”.
Na
perspetiva do académico, a responsabilidade pelo desfecho da consulta
deverá ser atribuída em simultâneo a Londres e a Bruxelas.
“A
primeira responsabilidade é do ex-primeiro-ministro britânico David
Cameron [conservador] e da sua decisão de convocar o referendo. Não
tinha de o fazer, convocou-o parcialmente por motivos políticos, e
sofreu as consequências, sem dúvida”, argumenta.
No entanto, sublinhou, “os líderes políticos da União deveriam ter-se apercebido de uma crise potencial no horizonte”.
“Ninguém
tinha interesse em estar agora envolvido neste processo extremamente
moroso, dispendioso, de desmantelar parte da UE. Deveriam ter antecipado
o problema e tomado medidas para o evitar, o que poderiam ter feito”,
defendeu.
A
questão da designada “identidade europeia”, tema muito discutido pelos
académicos envolvidos no lançamento do livro –também editado por Olivier
Bouin, João Caraça, Gustavo Cardoso e Michel Wieviorka – foi outro tema
que destacou.
“A
identidade europeia existe, mas é um sentimento muito fraco e variável
nas diversas partes da Europa”, coexistindo com outras formas de
identidade, como a identidade nacional ou regional.
Para John Thompson, a identidade europeia é geralmente a forma de identidade mais fraca.
“Enquanto
tudo corre bem e não há crises, é entusiasmante ter outra identidade,
outra forma de cidadania para além da que se possui. Mas quando vem a
crise e são necessárias decisões difíceis, as formas de identidade são
priorizadas e para muitas pessoas a forma de identidade europeia, a mais
frágil, torna-se secundária, em comparação com a filiação primária da
identidade nacional”.
O
académico alertou ainda que o resultado do referendo de 2016 poderá
voltar a colocar a questão da independência da Escócia, quando o
referendo também convocado por David Cameron em setembro de 2014
rejeitou a secessão com 55,30% dos votos.
“Um
novo impulso à independência da Escócia dependerá muito na natureza do
acordo do ‘Brexit’. Se encontrarem uma forma de contornar o círculo e
garantir uma solução que permita ao Reino Unido continuar a participar
plenamente no mercado da UE, penso que os principais perigos de
fragmentação serão evitados ou fortemente enfraquecidos”, considera John
Thompson.
“Pelo
contrário, se o desfecho for o que se designa no Reino Unido por
‘Brexit duro’, basicamente a saída do país do mercado europeu, penso que
será mais difícil resistir às pressões para um novo referendo sobre a
independência na Escócia. De momento nada é ainda muito claro”.
A
eventual reposição de uma fronteira física entre a República da
Irlanda, Estado-membro da União, e a Irlanda do Norte [província
autónoma dependente da coroa britânica] é outra questão que tem dominado
as tensas conversações entre Londres e Bruxelas, e quando se perspetiva
a saída definitiva do Reino Unido na primavera de 2019.
“Julgo
ser pouco provável a imposição de uma nova fronteira, e todos sabem
isso. Não será fácil, mas acabarão por chegar a um acordo que evite esse
cenário e manter os acordos alfandegários entre o Reino Unido e a UE
para evitar um grave problema fronteiriço. Mas tudo terá de ser
decidido, de momento é tudo muito pouco claro, e que é uma fonte de
frustração para todos”.
* Ainda ninguém percebeu completamente o imbróglio que vem para o ano.
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