HOJE NO
"JORNAL DE NEGÓCIOS"
As principais ideias da carta
de Centeno ao Eurogrupo
Portugal formalizou esta quinta-feira a candidatura de Mário Centeno à presidência do Eurogrupo. Os dados estão lançados e na carta que enviou para Bruxelas, o ministro das Finanças apresenta os seus argumentos para ficar com o lugar.
O ministro das Finanças apresentou um conjunto de propostas e
intenções na carta de motivação com que formalizou a candidatura à
liderança do Eurogrupo. Destacam-se o reforço de integração no âmbito da
moeda única e uma maior transparência e legitimidade dos processos de
decisão da União Europeia.
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Centeno também deixa críticas às regras
europeias em questões orçamentais e à omissão de medidas de crescimento
económico nos programas de assistência financeira da troika. As
mensagens estão na carta que seguiu esta quinta-feira para Bruxelas e a
que o Negócios teve acesso.
"A
Zona Euro tem de estar preparada para enfrentar os desafios vindouros. A
sua estrutura institucional tem de tornar-se mais resiliente, promover a
convergência económica e ir ao encontro das expectativas dos nossos
cidadãos."
No arranque da carta de
motivação em que formaliza a candidatura à presidência do Eurogrupo,
Mário Centeno defende uma espécie de reforma das competências da
instituição, mais deve estar mais voltada para a promoção de uma Zona
Euro convergente. Actualmente, o principal objectivo do Eurogrupo passa
pela coordenação de políticas económicas. Centeno compromete-se a
procurar "encontrar os acordos equilibrados para a construção de uma
economia da Zona Euro mais resiliente e madura".
"Aprofundar
a União Económica e Monetária (UEM) será crucial para incentivar um
crescimento económico inclusivo e sustentado e criar emprego."
Seguindo
ideias já expressas pelo presidente Emmanuel Macron ou pelo próprio
primeiro-ministro António Costa, o ministro considera que só uma Zona
Euro mais integrada, servida de mecanismos capazes de responder a
choques assimétricos, pode enfrentar os desafios e incertezas futuras,
promover o crescimento simétrico e criar emprego. Centeno diz que é
preciso aproveitar o Conselho Europeu de meados de Dezembro para dar um
passo em frente nesta matéria e sublinha que os "próximos meses
proporcionam uma janela de oportunidade única" para o conseguir.
"A
Comissão Europeia já apresentou a base necessária para seguir em
frente. Concordo com o presidente Tusk de que é preciso delinear um
roteiro transparente na Cimeira [de Dezembro] por forma a ser adoptado
em Junho de 2018. Actuando em conjunto, podemos construir uma melhor
estrutura de gestão de risco."
Sinalizada
a importância de reforçar a integração no seio do euro, a carta refere a
concordância de Centeno com o presidente do Conselho, Donald Tusk,
sobre a necessidade de definir um roteiro que permita reduzir a
distância entre a discussão de temas e a obtenção de resultados
concretos, algo a ser feito já na próxima cimeira europeia de 14 e 15 de
Dezembro.
O governante português considera que os cenários previstos
pela Comissão Europeia no Livro Branco para o futuro da União são a base
de trabalho necessária, mas agora é preciso seguir em frente. Nesse
sentido, propõe que o itinerário esteja completado a tempo de ser
formalmente adoptado no Conselho Europeu de Junho de 2018 (dias 28 e
29).
"Deve
ser promovida uma participação mais alargada de todos os organismos da
UE no processo de tomada de decisão. Aumentar a transparência vai
contribuir para a legitimidade do processo aos olhos dos cidadãos
europeus."
Mário Centeno propõe uma
União Europeia mais democrática e colegial, com as diversas instituições
envolvidas nas decisões, o que reforçará a legitimidade das decisões
junto dos europeus. Nesse sentido, quer que a coordenação entre o
Eurogrupo e o ECOFIN (ministros das Finanças da UE) seja "aprofundada"
bem como o reforço da ligação relativamente ao Parlamento Europeu.
"O
Governo português lidou com sucesso com riscos significativos ao
enfrentar questões no sector da banca uma atrás da outra, no que foi um
processo de verdadeira reforma estrutural" (…) "Na minha perspectiva,
completar a União Bancária, através da adopção de um regime prudencial
mais forte, adoptado com outras medidas de reforço da confiança, são da
máxima importância para garantir um sistema financeiro mais sólido na
Zona Euro."
A recapitalização do
sistema financeiro promovida pelo Governo, em especial na área da banca
(Banif e CGD), são apontados como factores favoráveis à candidatura de
Centeno que destaca a importância de concluir a União Bancária mediante
regras mais apertadas.
"O
futuro presidente do Eurogrupo deve também promover a implementação de
um quadro de supervisão orçamental totalmente credível e de mecanismos
de coordenação política mais robustos" (…) "Como mostra o meu percurso
como ministro português das Finanças, estou profundamente comprometido
com a implementação do Pacto de Estabilidade e Crescimento que os nossos
países acordaram em conjunto."
Esta
será a passagem que a esquerda parlamentar (PCP, BE e Verdes) menos
gostará de ler, uma vez que Centeno não apenas utiliza a consolidação
orçamental obtida pelo Executivo socialista como um factor que favorece a
sua candidatura, como reafirma o respectivo compromisso. Mais, defende a
criação de um quadro de supervisão para garantir os objectivos
orçamentais acordados, no que pode ser visto pela esquerda como uma
potencial perda adicional de soberania.
"Acredito
que o Eurogrupo pode contribuir para a discussão sobre como tornar a
supervisão orçamental mais eficiente através de regras mais simples,
compreensíveis e mais transparentes."
Fica
clara a crítica à rigidez das regras europeias e à ortodoxia do Tratado
Orçamental. Ao pedir instrumentos de supervisão mais perceptíveis,
Centeno parece aludir à alteração do cálculo do saldo estrutural para
efeitos de cumprimento do Programa de Estabilidade. O ministro, em
conjunto com outros responsáveis europeus das Finanças, instou a
Comissão Europeia a alterar a forma como se calcula o saldo que desconta
os efeitos dos ciclos económicos. Centeno conclui que "podemos
beneficiar de discussões mais informadas".
"Devemos
ter sempre um portefólio de políticas alternativas porque, como
acontece frequentemente, as políticas ideais são politicamente inviáveis
para todos os Estados-membros (…) Isto será particularmente útil para a
forma como produzimos aconselhamento de políticas sobre reformas, que
têm de ser sempre orientadas para o aumento do potencial de crescimento
das nossas economias e da Zona Euro como conjunto."
É
já quase no término da missiva que Mário Centeno deixa críticas ao que
foram as políticas de austeridade seguidas na UE, designadamente na Zona
Euro, em particular prescritas nos memorandos de entendimento
acordados, por países como Portugal ou a Grécia, com a troika.
Recuperando críticas repetidas pelo primeiro-ministro António Costa ou
por si próprio, Centeno realça a importância de ter preparado um leque
de opções políticas que permitam superar impasses, focadas no
crescimento e convergência económica no seio do euro.
Também aqui repete
uma das ideias que esteve por trás da preparação do Programa de Governo
- a de que não há uma receita única que sirva a todos.
* Era previsível.
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