ESTA SEMANA NO
"NOTÍCIAS MAGAZINE"
"NOTÍCIAS MAGAZINE"
Cérebro: algumas das mais relevantes
.descobertas estão a ser feitas em Portugal
.descobertas estão a ser feitas em Portugal
Terminou a semana internacional do cérebro, com iniciativas de divulgação científica em torno desse órgão espalhadas por todo o mundo. Por cá, cientistas e investigadores andaram pelas escolas a falar sobre o tema, embora garantam que ainda há muito para descobrir em Portugal. Na área da neurociência, decorrem neste momento importantes investigações científicas, há projetos inovadores e são utilizadas técnicas de última geração.
.
Para celebrar a Semana Internacional do Cérebro, Isaura Tavares e
outras investigadoras e cientistas percorreram escolas de todo o país a
explicar a mais de quatrocentos jovens como funciona este órgão.
Quando a presidente da Sociedade Portuguesa de Neurociências fala com alunos sobre o cérebro, costuma levar um slide
com a imagem de Homer Simpson, onde se vê apenas um neurónio na cabeça
do personagem animado, numa alusão às suas fracas capacidades
intelectuais.
Os alunos acham graça, riem-se mas ficam estupefactos com o resto da
conversa. «Pergunto quantos neurónios tem cada um deles e respondem mil
ou cinco mil, no máximo. Quando lhes revelo que cada cérebro tem biliões
de neurónios ficam chocados.» O número exato ainda não é consensual,
«mas a quantidade de neurónios não preocupa os cientistas. O mais
importante é saber como se relacionam entre si».
No centro de Neurociências de Coimbra, por exemplo, tenta-se neste
momento descobrir os mecanismos de controlo do apetite; um grupo da
Universidade do Minho, liderado por Nuno Sousa, está a verificar como é
que o stress afeta os neurónios; o Instituto de Biologia Molecular e
Celular, através da investigadora Teresa Summavielle, está a analisar se
uma mãe toxicodependente afeta o desenvolvimento do cérebro do embrião;
no Hospital Santa Maria, em Lisboa, uma equipa liderada pelo médico
António Ferreira Gonçalves colocou elétrodos no cérebro de um
cocainómano para ver se alteram a sensação de recompensa; e muitos
grupos de investigação estão a estudar as doenças neurológicas. E há
também locais, como o Laboratório de Interação Mente-Matéria, da
Faculdade de Medicina de Lisboa, onde o psiquiatra Mário Simões estuda a
parapsicologia e os estados alterados de consciência.
Pelo meio, muitos cientistas portugueses foram para o estrangeiro.
Como Tiago Outeiro Flemming, 40 anos, que dá aulas na Universidade de
Medizin Göttingen, na Alemanha, onde dirige um departamento de
investigação. «Queremos compreender o que acontece no cérebro de alguns
de nós e que leva ao aparecimento de doenças neurodegenerativas como
Parkinson, Alzheimer, ou Huntington» diz, explicando porque saiu de
Portugal. «É como o futebol, em que os jogadores trocam de clube.»
Para Isaura Tavares, porém, é sinal da falta de estabilidade que os
cientistas têm no país. «Na realidade, estamos a exportar os nossos
cérebros.» Mas muitos ainda permanecem no país e estão a tentar perceber
o que realmente se passa no cérebro.
É o caso de um neuropatologista que criou um banco de cérebros, de um
médico que inaugurou uma cirurgia que altera os circuitos cerebrais, de
um biólogo que está a tentar descobrir como tomamos decisões em relação
à comida, de uma bióloga que promete descobrir a forma de ficarmos mais
confiantes uns nos outros, e de um psicólogo que usa uma touca que
consegue ler o pensamento de doentes em coma. Para ler nesta reportagem.
Enganar as doenças neurológicas
Há 700 portugueses que vivem com elétrodos no cérebro para tentar
controlar sintomas de doenças como Parkinson ou distonia. A técnica foi
inaugurada no Hospital de São João, no Porto.
.
Rui Vaz, diretor de serviço de neurologia do Hospital de São João, no Porto, espera poder aplicar a técnica ECP (estimulação cerebral profunda) a doenças como Alzheimer ou depressão.
Foi o primeiro neurocirurgião no país a aplicar elétrodos no cérebro
de um português com Parkinson. Desde esse 22 de outubro de 2002, em que
operou Jesualdo, um homem de 47 anos com doença de Parkinson, já fez a
operação a mais de 320 doentes. A última há poucos dias.
Rui Vaz, 63 anos, diretor do Serviço de Neurocirurgia do Hospital de
São João, não tem dúvidas: a colocação de elétrodos no cérebro dos
doentes – técnica conhecida como estimulação cerebral profunda (ECP) –
tem mudado a vida a muitas pessoas. «É impressionante como em poucas
horas um doente de Parkinson muda tanto», diz o especialista.
Para que isso aconteça, o médico «entra» nos cérebros dos pacientes
para lhes reparar os circuitos cerebrais. Com os doentes acordados, faz
dois furos de 14 milímetros no crânio e coloca dois elétrodos na área
cerebral que não estava a funcionar corretamente e a provocar sintomas
como tremores e rigidez.
Através de um computador, ele e a equipa calculam o local exato onde
devem instalar os dois conetores e a trajetória ideal para lá chegar.
«Para atingir o alvo cerebral usamos um sistema de neuronavegação com
base na tomografia computorizada (TAC) e na ressonância magnética que
fazemos aos doentes», explica.
Os doentes passam a viver com os elétrodos na cabeça, que são
alimentados por uma bateria (tipo pacemaker), de seis a oito
centímetros, que fica escondida debaixo da pele na zona junto ao peito.
Formou-se em neurocirurgia porque o cérebro é uma área «fascinante»
sobre a qual há um «desconhecimento enorme». No ano 2000, quando foi
nomeado diretor de serviço no Hospital de São João, no Porto, teve o
primeiro contacto sério com esta técnica numa clínica de Zurique.
Apesar das dificuldades para obter financiamento, conseguiu verbas e
começou a operar. Desde que fez aquela primeira operação não para de
assistir a avanços técnicos: as baterias passaram a durar não quatro mas
vinte anos e pelo país já foram feitas mais de 700 operações destas, em
vários hospitais de norte a sul.
Hoje, o tratamento é uma evidência científica para Parkinson,
distonia, tremor essencial, doença de Gilles de la Tourette e
perturbação obsessiva compulsiva.
Rui Vaz está a colaborar num ensaio clínico sobre o impacto na
epilepsia e acredita que, em breve, os sintomas de muitas outras doenças
psiquiátricas (como Alzheimer, distúrbios alimentares e depressões)
poderão ser tratados com esta técnica.
«Estou à espera das conclusões de estudos que estão a ser feitos para
poder começar a operar estas doenças em Portugal», adianta o médico. E
acredita que também a biologia molecular terá um papel determinante. «Se
conseguirem identificar as causas das doenças, podemos desenvolver
medicamentos que as tratem sem ser necessário operar.»
Entretanto, é preciso continuar a investigar. «Sabemos em que zona do
cérebro estão, mas falta-nos conhecer como as diferentes áreas se
conectam entre si.»
Nas operações mais complexas conta por vezes com a presença de
médicos estrangeiros, como o alemão Jens Volkmann, especialista nesta
última doença.
Apesar dos sucessos que os médicos têm tido a alterar os circuitos
cerebrais, Rui Vaz avisa que é preciso ter cuidado por poder existir a
tentação de usar estas técnicas para as pessoas ficarem apenas mais
espertas ou tratar a agressividade de serial killers. «Sou contra. Era como fazer operações plásticas ao cérebro.»
O único banco de cérebros do país
Há apenas um banco de cérebros em Portugal. Funciona no Hospital de
Santo António, no Porto, e já serviu de base para descobertas
importantes, nomeadamente na área da doença de Parkinson.
.
Ricardo Taipa, neuropatologista, e José Barros, diretor do Departamento de Neurociências do Hospital de Santo António, no Porto, onde está instalado o Banco de Cérebros.
Numa sala do piso zero do Hospital de Santo António, no Porto, estão
guardados, numa arca congeladora, trinta cérebros de doentes que
morreram com doenças neurológicas ou psiquiátricas. Fazem parte do único
banco de cérebros que existe no país, que está a ser usado para
investigadores nacionais e internacionais poderem perceber melhor as
doenças do sistema nervoso, nomeadamente as degenerativas, que estão a
afetar cada vez mais portugueses.
Foi inaugurado em 2014, depois de Ricardo Taipa, 38 anos, ter trazido
a ideia de Inglaterra, onde trabalhou no Manchester Neuroscience Centre
e no National Hospital for Neurology and Neurosurgery, em Londres.
«Abrir este banco de cérebros humanos era um sonho», diz o
neuropatologista e neurologista, que se licenciou em Medicina no
Instituto de Ciências Biomédias Abel Salazar, em 2003, e que sempre se
sentiu fascinado pelos mistérios que rodeiam o funcionamento daquele
órgão.
A maioria dos cérebros ali congelados são de doentes com Alzheimer ou
demência frontotemporal. Uma das partes do cérebro mais requisitada
pelos investigadores é o hipocampo. «É uma estrutura importante para a
memória e por isso muito solicitada para o estudo da doença de
Alzheimer», explica Ricardo Taipa.
É que cada cérebro, que pesa em média 1,4 quilos antes de congelado, é
dividido em quarenta partes, tantas quantas as diferentes estruturas
existentes neste órgão.
Assim, quando o cérebro é doado, é separado em pequenas parcelas, que
são colocadas em sacos de plástico individuais: num ficam as amígdalas
cerebrais, uma massa cinzenta de dois centímetros de diâmetro que regula
a agressividade e o comportamento sexual; noutro guarda-se o núcleo
subtalâmico, uma zona que está relacionada com as funções motoras;
noutro acomoda-se o núcleo Accubens, responsável pela sensação de
recompensa; noutro põe-se o núcleo rubro, uma massa de tonalidade
avermelhada que se situa no tronco cerebral e atua nos movimentos;
noutro ainda arruma-se o núcleo cerúleo, uma estrutura que produz uma
substância responsável pelo stress; e noutro conserva-se os corpos
mamilares, núcleos arredondados importantes para as memórias episódicas,
que nos permitem lembrar de eventos.
São colocados numa arca de congelação a menos de oitenta graus e ali
ficam até serem solicitados por um investigador. Mas antes de serem
usados em pesquisas têm de ser catalogados e os médicos têm de confirmar
a doença que ali está em causa. «Só uma parte do cérebro, o direito ou o
esquerdo, vai para congelar.
A outra metade serve para fazermos o diagnóstico.» Para isso,
coloca-se a outra metade do cérebro em formol para que, ao fim de três a
quatro semanas, possa ser cortado e as várias partes fixas a blocos de
parafina para serem estudadas a microscópio.
«Temos de saber bem as doenças para que as amostras sirvam para
investigações», explica o neuropatologista, revelando que, em breve, ele
e o neurologista Melo Pires, o outro responsável pelo banco, esperam
poder começar a recolher cérebros saudáveis.
Apesar de ser recente, o banco já ajudou em descobertas importantes, uma delas publicada na revista Brain,
adianta José Barros, chefe do departamento de neurociências, de 56
anos: com amostras cerebrais foi possível descobrir que uma forma
genética de Parkinson tem uma ação similar à forma de doença de
Parkinson esporádica, mais frequente.
«Isso é importante porque vai permitir, por exemplo, manipular o gene
em animais e tentar descobrir medicamentos que podem ajudar na forma de
Parkinson mais comum», diz Ricardo Taipa.
Também há estudos sobre a doença dos pezinhos a ser feito com base em
amostras recolhidas do cérebro de um doente que estava congelado no
banco. «Essa doença é, aliás, uma área importante para nós, pois somos o
maior centro de investigação do mundo», diz José Barros, lembrando que
uma investigação recente de um especialista do hospital apurou que, ao
contrário do que se pensava, a doença dos pezinhos pode ter efeitos no
sistema nervoso central e não apenas no periférico.
Por tudo isto, diz, o banco de cérebros é fundamental. «Vai demorar
até dar resultados do investimento feito. Mas já é um orgulho para nós.»
Sal ou açúcar?
Uma investigação da Fundação Champalimaud pode ser a solução para
perceber porque optamos por certos alimentos – e por que razão as
grávidas têm desejos desta ou daquela comida.
.
Carlos Ribeiro, investigador principal da Fundação Champalimaud, trabalha na relação entre o cérebro e o estômago.
Como é que o cérebro toma decisões em relação à comida? O que leva uns a
optar por peixe e salada e outros por carne e arroz? É a esse tipo de
perguntas que o investigador Carlos Ribeiro promete responder com o
estudo que está a desenvolver.
O investigador do programa de neurociências da Fundação Champalimaud
optou por começar a investigação com moscas da fruta e espera em breve
poder passar para ratinhos. E depois seres humanos.
«A mosca da fruta é um animal suficientemente complexo e tem muitas
vantagens, como a de ter apenas 200 mil neurónios, nada comparável com
os ratos ou seres humanos», garante o investigador.
Além disso ocupa
pouco espaço, produz-se rapidamente em dez dias e é um animal barato. E
já tem alguns resultados.
«Quando retiramos um nutriente da dieta da mosca, os aminoácidos, por
exemplo, e depois lhe damos a escolher entre várias opções, como sal,
aminoácidos, açúcar ou vitaminas, ela opta exatamente pelo alimento
cujos nutrientes tinha em falta», diz o investigador, sublinhando que
essa descoberta permite concluir que o cérebro atribui valor aos
nutrientes e que estes influenciam o cérebro a decidir.
«Sabemos que o cérebro processa informação de sabor para a tomada de
decisões, mas não sabemos onde. E temos de descobrir.» Pelo que se vê na
mosca da fruta, é essa alteração de sabor que julga estar na origem dos
conhecidos «desejos da grávida».
Aliás, a sua equipa de 12 pessoas decidiu manipular neurónios, de
forma a que estes informassem o cérebro sobre uma gravidez que na
realidade não existe para ver qual a decisão alimentar. E foi exatamente
igual à das moscas realmente grávidas.
«Sabemos que neurónios detetam a gravidez, que neurónios levam essa
informação ao cérebro, mas não sabemos ainda em que parte cerebral isso
tudo se passa.»
Carlos Ribeiro, filho de pais portugueses, nasceu na Suíça, onde se
licenciou em Biologia em 1999. Depois esteve no laboratório austríaco de
Barry Dickson, e agora vive em Lisboa. No seu gabinete na Fundação
Champalimaud, onde trabalha desde 2009, as paredes estão cheias de
folhas A4 com gráficos sobre algumas das últimas análises feitas pela
equipa.
Uma das descobertas recentes promete. Perceberam que algumas moscas,
quando escolhiam os alimentos, tomavam opções completamente diferentes e
então descobriram que há no estômago duas bactérias que influenciam o
cérebro a tomar certas decisões.
É como se no estômago houvesse um segundo cérebro, diz o
investigador, notando que, se há já estudos que mostram que em certos
casos, como no stress, as bactérias podem influenciar o cérebro a mudar
de comportamento, esta será a primeira vez que se prova que uma bactéria
muda a atitude alimentar.
Do que ninguém tem dúvidas é que a nutrição influencia a saúde das
pessoas. E até hoje não tem sido fácil estudar o comportamento das
pessoas em relação à alimentação. Além de se saber muito pouco sobre o
cérebro, Carlos Ribeiro garante que há outro problema que dificulta os
estudos e inquéritos sobre o tema: «As pessoas mentem sobre o que
comem.»
Testar a hormona da confiança
No Instituto de Medicina Molecular de Lisboa, 200 a 300 doentes vão
consumir uma substância enquanto os seus cérebros serão analisados em
tempo real. O estudo clínico nunca foi realizado em Portugal.
.
Durante 12 anos, Diana Prata, investigadora do Instituto de Medicina Molecular de Lisboa, trabalhou no King’s College, em Londres.
Diana Prata está a realizar um estudo clínico inédito no país e
prepara-se para começar em breve a analisar, em tempo real, o cérebro de
200 a 300 homens, enquanto estes realizam vários jogos – como o dilema
do prisioneiro, em que os participantes podem decidir cooperar ou trair
os concorrentes.
Aos 38 anos, a investigadora do Instituto de Medicina Molecular de
Lisboa procura descobrir de que forma a oxitocina, uma hormona produzida
no cérebro, leva as pessoas a colaborarem e confiarem umas nas outras, a
serem menos egoístas, a terem mais ou menos receio dos outros.
Para isso, os voluntários – uns irão inalar aquela substância e
outros consumirão um placebo – serão sujeitos a uma ressonância
magnética durante uma hora e durante outra usarão uma touca de elétrodos
para lhes registar e gravar a atividade cerebral enquanto observam
imagens de pessoas assustadas e contentes, a ouvir sons diferentes e a
enfrentar dilemas.
Ao longo de 12 anos na capital britânica realizou, no King’s College
London, vários estudos sobre os genes e as doenças mentais, como
distúrbios alimentares, doença bipolar e esquizofrenia.
Foi durante estes trabalhos que percebeu que há variada medicação
para as alucinações e delírios dos esquizofrénicos mas não há fármacos
para os ajudar a melhorar em relação aos problemas de comportamento
social que os afetam e os levam ao isolamento.
A investigadora tem esperança de que, no futuro, este estudo possa
contribuir para o desenvolvimento de medicamentos que melhorem estes
sintomas comportamentais na esquizofrenia, mas também noutras doenças,
como autismo, depressão, ansiedade, anorexia ou até toxicodependência.
Para isso, Diana Prata vai usar a oxitocina – uma hormona que até
recentemente se julgava ter apenas a função de ajudar as mulheres no
parto, promovendo, por exemplo, as contrações. E vai testar o seu efeito
em algumas zonas do cérebro: numa pequena estrutura cerebral (amígdala)
que sinaliza o medo, num núcleo (estriado) que é responsável pela
sensação de recompensa e em partes do córtex frontal e temporal, a área
cerebral com a qual conseguimos perceber as emoções nos outros.
Há estudos que indicam, adianta a investigadora, que a oxitocina
diminuiu a atividade da amígdala e, portanto, reduz o medo e torna as
pessoas mais calmas.
Além disso, aumenta a ação do núcleo do prazer e fortalece a sensação
de recompensa associada à interação social, o que faz crescer a vontade
de confiar nos outros e melhora a capacidade dos neurónios do córtex
que nos fazem entender o que uma pessoa está a sentir quando olhamos
para ela.
«O que vamos fazer é tentar perceber onde estão e como trabalham os
recetores desta substância no cérebro», detalha Diana Prata, que espera
ainda descobrir se os genes influenciaram todo este processo do
comportamento. «Queremos saber se são fatores genéticos que levam uma
pessoa a produzir mais ou menos oxitocina.»
Aliás, o êxito do seu trabalho mede-se pelas bolsas que conseguiu
(Bial, Instituto de Medicina Molecular e União Europeia), que somadas
valem cerca de 300 mil euros. Depois de testar os homens entre os 20 e
os 35 anos – já tem sessenta voluntários inscritos –, a investigadora
quer também analisar os cérebros de doentes esquizofrénicos e de
mulheres.
Desde que veio de Londres, em 2014, e criou o seu próprio laboratório
no Instituto de Medicina Molecular de Lisboa, Diana Prata tem-se
dedicado a estudar a biologia do comportamento humano. E agora está
prestes a descobrir se uma mera substância é capaz de nos tornar mais
amigos uns dos outros.
Uma touca para ler pensamentos
Técnica inovadora em Portugal permite a doentes em estado vegetativo
ou coma comunicar com o exterior. É um método usado em poucos sítios do
mundo. Um deles é o Centro Cérebro, em Braga.
.
O neuropsicólogo Jorge Alves abriu o Centro do Cérebro, em Braga, dedicado ao tratamento e investigação de doenças e lesões neurológicas.
o «futuro já está a acontecer», alerta o neuropsicólogo Jorge Alves, 38
anos, que lidera o instituto de neurocirurgia Centro Cérebro, em Braga. É
ali que, garante o clínico, se encontram tratamentos e tecnologia de
última geração.
A mais recente é uma touca com 16 elétrodos que lê pensamentos de
doentes em estado vegetativo ou em coma com algum estado de consciência,
permitindo que contactem com o exterior.
«Colocamos, por exemplo, três sensores vibrotáteis nos membros
superiores do doente e também noutra parte do corpo – em regra, nas
costas –, pedimos-lhe para se concentrar na vibração que está a sentir
no braço esquerdo e tentar abster-se das outras vibrações, se quiser
responder às questões com um sim. Cada vez que esta vibração é sentida, é
visível um sinal na atividade cerebral do paciente no computador»,
explica Jorge Alves.
Outra forma de comunicar é pedir ao doente que tente imaginar o
movimento do braço esquerdo se quiser responder positivamente a uma
questão ou o movimento do braço direito se pretender dizer que não. «O
sistema de que dispomos analisa a atividade cerebral e consegue fornecer
a resposta em tempo real.»
Esta tecnologia – que inclui a touca, o software e o hardware
– resultou do trabalho de vários projetos de investigação e
universidades. Em Portugal ainda é muito recente, não tendo sido usada
ainda para comunicação, mas apenas para investigação.
Desde a escola primária que Jorge Alves «tinha um fascínio pela
ciência». Licenciou-se em Ciência Psicológica pela Universidade do
Minho, em 2007, especializou-se como neuropsicólogo clínico, concluiu o
doutoramento em 2014 em psicologia clínica e tornou-se investigador e
revisor de várias revistas internacionais.
Em 2015 abriu o Centro Cérebro, em Braga, dedicado ao tratamento e
investigação das doenças e lesões neurológicas e das perturbações
psicológicas. Um dos métodos a que o especialista recorre é a realidade
virtual, não só para fobias mas também para problemas como acidentes
vasculares cerebrais.
«O paciente com AVC já pode realizar o treino especializado e
intensivo de recuperação do braço em casa através de um sistema
computorizado de realidade virtual. E nós conseguimos monitorizar a
evolução em tempo real e prescrever exercícios ajustados à evolução do
paciente.»
Ao Centro Cérebro chegam cada vez mais adultos com fobia de andar de
avião e crianças com medo do escuro. A ideia é usar a realidade virtual,
colocando o doente, através de óculos especiais, perante situações e
ambientes que receia. Isto para que, pela habituação, a parte frontal do
cérebro ganhe controlo sobre as amígdalas, as estruturas cerebrais
responsáveis pelo medo.
O horror aos aviões, por exemplo, é tratado com imagens que colocam o
paciente em aeroportos, em pleno voo ou a aterrar. Todos estes
tratamentos, defende o psicólogo, são provas de que a tecnologia está a
mudar os cuidados de saúde. Desde que começou a estudar o cérebro, Jorge
Alves admite que já foi surpreendido.
Em especial «por ter percebido que não é apenas o cérebro de uma
criança que se adapta ao meio mas que há cada vez mais evidências que
mesmo em adultos mais velhos é possível, através de treino específico,
haver compensação e até restauração parcial das funções».
O especialista acredita que no futuro será possível restaurar, pelo
menos parcialmente, funções motoras através de próteses e de sistemas de
comunicação entre o cérebro e os computadores. E até coloca a
possibilidade de se conseguir um dia colocar chips no cérebro para
melhorar a memória. Mas admite que há tratamentos muito difíceis de
atingir: «Possivelmente parar o envelhecimento é uma destas utopias.»
Texto de Catarina Guerreiro
Fotografia de Reinaldo Rodrigues/Global Imagens e Pedro Granadeiro/Global Imagens
Fotografia de Reinaldo Rodrigues/Global Imagens e Pedro Granadeiro/Global Imagens
* Maravilhosa ciência que não precisa de folclores religiosos para servir a humanidade. Era à CIÊNCIA que as pessoas deviam rezar.
.
Sem comentários:
Enviar um comentário