O Ministério Público não respeita
a nossa inteligência
A Procuradora Geral da República, Joana Marques Vidal, anunciou hoje o
adiamento da conclusão da investigação criminal da Operação Marquês. É a
sexta vez que tal acontece. O problema é que, na prática, Joana Marques
Vidal deixa aberta a porta para que a investigação continue para lá¡ de
Junho e o fim da Operação Marquês passa a ser como o Natal: é quando um
homem quiser. Neste caso, o homem é o procurador Rogério Teixeira, que
pode sempre invocar a necessidade de mais investigações ou de enviar
novas cartas rogatórias e aguardar pela respetiva resposta ou de fazer
novas investigações - como a que foi realizada esta semana aos
escritórios do GES onde, quatro anos depois dos factos, deve haver ainda
imensas provas para recolher...
E é aqui que se torna irritante a maneira como o Ministério Público
trata a nossa inteligência. Quatro anos depois de iniciado processo,
constituir arguidos na última semana do prazo para concluir
investigações, ou enviar novas cartas rogatórias ou fazer buscas só pode
servir para justificar o pedido de mais um adiamento da conclusão das
investigações e não para alcançar nenhum outro objetivo.
Convém lembrar que José Sócrates foi detido porque supostamente havia
factos suficientemente graves para o Ministério Público o determinar.
Pois entretanto o ex-primeiro-ministro foi libertado em 16 de Outubro de
2015, desde aí já passaram 16 meses e as tais provas sólidas e robustas
para acusar e condenar Sócrates mantém-se em segredo, continuando a
investigação a colecionar documentos e arguidos e a juntar casos ao caso
inicial (do Grupo Lena foi-se para Vale do Lobo, de Vale do Lobo para o
BES, do BES para a PT e agora é tudo junto).
A Procuradora Geral da República quis fazer um paralelo com o caso
Madoff nos Estados Unidos, dizendo que o ex-milionário foi investigado
durante seis anos. Saiu-lhe mal. Madoff foi investigado durante seis
anos, sem que ninguém tomasse conhecimento do caso; nem os próprios, nem
a imprensa tabloide. Quando foi preso, as provas eram tão avassaladoras
que foi julgado e condenado em seis meses. Compare-se com o que se tem
passado na Operação Marquês e constate-se quão infeliz foi a comparação.
Dito isto (e recomendando fortemente a leitura do texto de opinião de
Miguel Sousa Tavares 18/03 no Expresso), sublinho o que ele também
escreve: eu não sei se José Sócrates é culpado ou não dos supostos
factos de que é acusado. Sei que ele tem seguramente muitas explicações
a dar sobre a relação financeira que mantinha com o seu amigo Santos
Silva. Sei que, apesar de todas as informações que vieram de várias
partes do mundo, não há uma conta em nome de José Sócrates onde tivessem
estado os tais 23 milhões que o MP diz que ele recebeu para ser
corrompido. Mas sei ainda mais: é que ele está há muito condenado pela
generalidade da opinião pública. E esse peso no julgamento será tão
desmesurado que tudo o que não seja a condenação de Sócrates em tribunal
será um enorme escândalo e uma desmesurada vergonha para o Ministério
Público.
Por outras palavras, se Sócrates for declarado não culpado, ninguém
acreditará e a voz do povo dirá o que repete sempre em casos como estes:
os poderosos safam-se sempre. Se for condenado, mesmo que só com provas
indiretas ou indiciárias (o que se comeeça a perfilar como uma enorme
possibilidade), ninguém se importará grandemente. Em resumo, qualquer
que seja o resultado, a Operação Marquês vai sempre acabar mal.
IN "EXPRESSO"
17/03/17 .
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