ESTA SEMANA NA
"SÁBADO"
"SÁBADO"
"Carta a ti, que abusaste
sexualmente de mim"
sexualmente de mim"
Ângelo Fernandes sofreu abusos sexuais em criança. Só aos 29 anos conseguiu contar a sua história. Actualmente é presidente da primeira associação destinada a homens que foram sexualmente abusados - Quebrar o Silêncio - e decidiu escrever ao homem que marcou a sua vida
Quando tinha 11 anos, Ângelo Fernandes foi vítima de abuso sexual por um
amigo da família. Aos 29 anos decidiu contar a sua história a uns
amigos próximos. Hoje, com 33, criou a primeira associação destinada a
homens que sofreram sexualmente de abusos e escrever ao homem que marcou
a sua vida para sempre.
Segundo explicou à SÁBADO,
Ângelo pretende usar o seu testemunho para sensibilizar as pessoas para
"o abuso sexual masculino". Numa carta com destinatário assumido - o
homem que o abusou em criança - a vítima mostra como sofreu e superou a
situação.
"Carta a ti, que abusaste sexualmente de mim" é
o título de um testemunho na primeira pessoa e de uma mensagem
direccionada para o homem que Ângelo acusa de ter destruído a sua
infância e parte daquilo que é. "Por tua causa e do que me
fizeste, cresci a achar que não tinha qualquer valor. Que não era
merecedor do afecto de ninguém. Cresci a achar que mereci teres abusado
de mim, de que eu era o culpado. Com as tuas mentiras e palavras
engenhosas, semeaste em mim um sentido de culpa sem fim. Cresci com nojo
de mim, sentia-me sujo como se fosse eu o culpado das tuas acções, como
se fosse eu, uma simples criança, que tivesse abusado sexualmente de
ti, um pobre e inocente homem que caiu na trama de um demónio sexual com
11 anos.
.
Recorde-se que no início do ano, foi criada a Associação Quebrar o Silêncio, com sede na baixa de Lisboa, uma organização oferece apoio gratuito e anónimo e é destinada a todos os homens que já passaram por tal situação.Nesta
altura, Ângelo Fernandes contou toda a sua história à SÁBADO, num
testemunho impressionante sobre o que passou na infância. "O que
ele fez foi apresentar-se no meu universo como uma pessoa amiga, uma
pessoa de confiança, que se preocupava e que mostrava interesse e
afecto. Aos poucos, com esse tipo de postura, foi introduzindo alguns
avanços. De forma muito calculada e pensada. Por exemplo: ele num dia
dava-me um aperto de mão, depois disso já passava uma mão nas costas e
depois a uma carícia na cara que já era mais desconfortável", contou a
vítima, num depoimento que pode recordar aqui.
"Eu tinha 11 anos quando tudo isto começou a acontecer. Ele era um
homem amigo de toda a gente. Conhecido da minha mãe, bem estabelecido na
comunidade – que tinha um bom estatuto - e uma profissão de respeito.
Uma pessoa disponível e em quem as pessoas confiavam. Tinha cerca de 35
anos.
Eu e os meus amigos brincávamos perto da casa dele
em Setúbal. Jogávamos futebol, porque havia uma boa área ali perto. E
ele de forma amigável, digamos assim, aproximava-se e ia assistir aos
nossos jogos. Nos momentos das pausas e nos momentos em que estávamos
mais cansados punha conversa connosco. Perguntava se estava tudo bem,
como corria a escola, se jogava bem futebol. Uma conversa completamente
amigável. Falava bem com todos. Mas havia dois ou três rapazes com quem
ele tentava criar uma ligação maior.
Nessa altura não
percebi que havia qualquer intenção. Tinha apenas 11 anos e via um
adulto sempre como uma figura de respeito, em quem confiamos.
O que ele fez foi
apresentar-se no meu universo como uma pessoa amiga, uma pessoa de
confiança, que se preocupava e que mostrava interesse e afecto. Aos
poucos, com esse tipo de postura, foi introduzindo alguns avanços.
De forma muito calculada e pensada. Por exemplo: ele num dia dava-me um
aperto de mão, depois disso já passava uma mão nas costas e depois a uma
carícia na cara que já era mais desconfortável.
Lembro-me
que uma vez - que demonstra que ele estava muito à vontade no que fazia
– ele sentou-se junto a mim e colocou a mão dele debaixo da minha t-shirt. Acariciou-me
as costas. Criou-me desconforto, mas ao mesmo tempo, como era uma
pessoa amiga, que mostrava interesse, que toda a gente gostava e que diz
ser boa pessoa, qualquer momento de desconforto que eu tivesse ou
qualquer momento confuso era muito complicado assumi-lo. Mesmo que
tivesse algum momento de dúvida pensava que era da minha cabeça.
Ele avançava aos poucos. Se eu tivesse alguma reacção contrária, ele voltava atrás e não me tocava. Voltava à estaca zero e depois voltava a fazer pequenos avanços. Chegou a fazer-me carícias à frente dos meus amigos, mas era muito discreto. Era sempre junto da casa dele, porque acho que o objectivo era levar-nos para a sua casa.
Frequentemente dizia para irmos a casa dele beber água, ou para vermos televisão. Queria retirar-nos da rua. Chegámos a lá ir, porque ir à dele ou à de qualquer outro vizinho, no fundo, para mim era igual. Todas as pessoas do nosso bairro eram pessoas de confiança.
Ele avançava aos poucos. Se eu tivesse alguma reacção contrária, ele voltava atrás e não me tocava. Voltava à estaca zero e depois voltava a fazer pequenos avanços. Chegou a fazer-me carícias à frente dos meus amigos, mas era muito discreto. Era sempre junto da casa dele, porque acho que o objectivo era levar-nos para a sua casa.
Frequentemente dizia para irmos a casa dele beber água, ou para vermos televisão. Queria retirar-nos da rua. Chegámos a lá ir, porque ir à dele ou à de qualquer outro vizinho, no fundo, para mim era igual. Todas as pessoas do nosso bairro eram pessoas de confiança.
A
primeira vez que fui a casa dele passei um serão com ele só a ver
televisão. Mais nada. Eu sentado no sofá. Ele ao meu lado. Sem qualquer
tipo de toque. Só isso. Não houve qualquer comportamento agressivo ou
suspeito. Hoje, quando olho para trás, compreendo que este era só mais
um passo para mostrar que era uma pessoa amiga e de confiança. Não me
recordo de falar com nenhum familiar sobre esta visita a casa dele, e
mesmo que o fizesse não seria de uma forma de denúncia ou de comentar
alguma coisa estranha porque era uma coisa frequente. Também fui várias
vezes à casa do vizinho do lado ver televisão e jogar. Não era nada
descabido.
Outro dos avanços foi quando ele estava ao meu
lado e punha a mão por cima de mim, como se estivesse a abraçar-me. Por
vezes desapertava um pouco a camisa para mostrar os peitos dele. As
calças por vezes também estavam desapertadas e o cinto aberto. Aos
poucos ele ia avançando e mostrando que estava disponível para outro
tipo de comportamento. Mas sempre reiterando a ideia que era natural,
que ele era uma pessoa amiga e que tudo o que se passava ali entre nós
era seguro.
Estava sempre a passar essa ideia de que era uma pessoa amiga. 'Se quiseres falar de alguma coisa é natural. Eu posso-te ajudar', dizia-me. Tentava instaurar em mim uma curiosidade que não era minha. Dizia-me que era natural uma criança sentir-se curiosa em explorar o corpo de um adulto. Ou que um adulto deixe que uma criança explore. Havia uma grande preocupação em passar essas mensagens.
Estava sempre a passar essa ideia de que era uma pessoa amiga. 'Se quiseres falar de alguma coisa é natural. Eu posso-te ajudar', dizia-me. Tentava instaurar em mim uma curiosidade que não era minha. Dizia-me que era natural uma criança sentir-se curiosa em explorar o corpo de um adulto. Ou que um adulto deixe que uma criança explore. Havia uma grande preocupação em passar essas mensagens.
Nos
momentos de dúvida, cheguei a perguntar aos meus amigos se eles também
iam lá a casa, se eles também confiavam naquela pessoa e as respostas
eram todas elas positivas. Todos diziam que era um amigo e uma pessoa de
confiança. Não havia nenhum feedback externo que correspondesse à minha confusão e desconforto.
Não
sei se mais algum meu amigo foi abusado sexualmente, porque nós
éramos muito novos. Entretanto já passaram 24 anos desde que isto
aconteceu e não tenho praticamente contacto com os meus amigos de
infância. Pode ser que agora, com esta divulgação, algum se sinta à
vontade em vir ter comigo e falar.
Ainda há muitas
memórias às quais não tenho acesso. Na primeira vez que sofri
concretamente de um abuso sexual senti que alguma coisa não estava
correcta. Tinha aquela sensação, muito particular nos miúdos, de ter
feito algo que não podia fazer.
Há sempre aquela preocupação dos pais em avisar-nos para não falar com pessoas desconhecidas: 'não fales com estranhos, não aceites nada de estranhos'. Mas neste caso não era. Essa pessoa não existia na minha vida. Não havia ninguém estranho ou suspeito. Isso provocava alguns confrontos internos, porque mesmo quando me sentia confuso, tinha uma pessoa sempre a dizer-me que aquilo era natural. Tudo o que sentia de errado, achava que era criação minha. Pensava: 'sou eu estou errado'.
Há sempre aquela preocupação dos pais em avisar-nos para não falar com pessoas desconhecidas: 'não fales com estranhos, não aceites nada de estranhos'. Mas neste caso não era. Essa pessoa não existia na minha vida. Não havia ninguém estranho ou suspeito. Isso provocava alguns confrontos internos, porque mesmo quando me sentia confuso, tinha uma pessoa sempre a dizer-me que aquilo era natural. Tudo o que sentia de errado, achava que era criação minha. Pensava: 'sou eu estou errado'.
Não quero entrar em
pormenores, porque isto ainda é um tema penoso para a minha família.
Posso dizer que ele expunha-se e convidava-me ao toque, à carícia e à
interacção sexual.
Fui vítima de abuso cerca de um ano. Até chegar ao abuso propriamente dito, ele levou meses a construir uma relação de confiança. Foi preparando, literalmente, todo o cenário, toda esta situação. Fui manipulado por ele. Inicialmente, ele estabelecia uma relação de confiança, mas depois ia "subindo a parada". Foi avançando e já havia uma questão constante de abuso. Não me recordo da frequência, mas deveria ser uma ou duas vezes por semana.
Tinha a sensação que se falasse com alguém da família essa pessoa ia deixar de gostar de mim e já não me amaria mais. Tinha um medo enorme de pensarem que estava a fazer alguma coisa má e que eu era o culpado desta situação. Todo este medo, de ser julgado e até excluído acabou por levar-me a achar que o melhor era não contar a ninguém. Pensava: 'Se as pessoas não souberem o que se passou vão continuar a gostar de mim'. A vergonha e o sentido de culpa ficam sempre do lado da vítima e acabam por bloquear a pessoa. Sentia nojo de mim mesmo.
Fui vítima de abuso cerca de um ano. Até chegar ao abuso propriamente dito, ele levou meses a construir uma relação de confiança. Foi preparando, literalmente, todo o cenário, toda esta situação. Fui manipulado por ele. Inicialmente, ele estabelecia uma relação de confiança, mas depois ia "subindo a parada". Foi avançando e já havia uma questão constante de abuso. Não me recordo da frequência, mas deveria ser uma ou duas vezes por semana.
Tinha a sensação que se falasse com alguém da família essa pessoa ia deixar de gostar de mim e já não me amaria mais. Tinha um medo enorme de pensarem que estava a fazer alguma coisa má e que eu era o culpado desta situação. Todo este medo, de ser julgado e até excluído acabou por levar-me a achar que o melhor era não contar a ninguém. Pensava: 'Se as pessoas não souberem o que se passou vão continuar a gostar de mim'. A vergonha e o sentido de culpa ficam sempre do lado da vítima e acabam por bloquear a pessoa. Sentia nojo de mim mesmo.
Na última
noite em que aconteceu o abuso, ele levou-me para a cama dele, eu
estava a despir-me e ele estava já semi-despido. Alguém bateu à porta.
Nessa altura, toda a postura que ele tinha desapareceu naquele instante.
A expressão mudou e ficou em pânico. Estava com medo, meteu-me a mão na
boca e pediu-me para não fazer barulho, não respirar sequer. Disse-me
que ninguém podia saber, que ninguém podia ouvir. Foi nesse momento que
percebi que algo de errado estava ali a acontecer, apesar de não saber o
quê. A pessoa que me dizia que estava tudo bem, que era tudo correcto e
que estava tudo normal, não podia ter tido aquela reacção. Ficámos ali
em silêncio, ele continuava com a mão na minha boca. De seguida,
aproveitei o facto de ele ter ido perceber se a pessoa já tinha ido
embora, vesti-me e nunca mais apareci. Fugi.
No entanto,
ele tinha de tal forma confiança no que fazia, que chegou a ir ter
comigo num sábado de manhã, quando estava com a minha mãe, e abordou-me:
'Então nunca mais lá foste? Já não queres ir lá a casa?'. 'Agora já não
vou jogar futebol', respondi. Evitei-o e inventei uma desculpa
qualquer.
Nessa altura, percebi que tinha sido o momento
de ruptura. Desde então deixei de aparecer naquela zona do bairro e de
frequentar a rua dele. Não sei quem bateu naquela porta, mas essa pessoa
salvou-me.
Sempre tive problemas de confiança resultantes
dos abusos que sofri. Cresci a achar que qualquer homem amigo que se
aproximasse de mim ia cobrar essa amizade sexualmente. Foi isso que o
abusador me ensinou. Não aceitava que algum homem fosse meu amigo. Nem
mesmo um professor.
Na minha adolescência, do ponto de vista íntimo, existia também um mau-estar que eu não conseguia justificar. Escondia, porque, no fundo, o meu primeiro contacto sexual foi com um homem adulto de 30 e tal anos quando eu tinha apenas 11. Uma pessoa que tem uma relação sexual consentida é porque tem desejo e porque quer e aos 11 anos não foi porque quisesse ou tivesse desejo.
Na minha adolescência, do ponto de vista íntimo, existia também um mau-estar que eu não conseguia justificar. Escondia, porque, no fundo, o meu primeiro contacto sexual foi com um homem adulto de 30 e tal anos quando eu tinha apenas 11. Uma pessoa que tem uma relação sexual consentida é porque tem desejo e porque quer e aos 11 anos não foi porque quisesse ou tivesse desejo.
Quando
tinha já 29 anos encontrei-o na rua e acenou-me, como se fosse um
grande amigo que já não me via há anos. Foi completamente natural para
ele. Não acenei de volta, senti mau estar, um nó no estômago. Virei as
costas e fui para casa. Naquela noite começaram a surgir várias
memórias.
Passei três dias sem dormir e sem conseguir
parar estas memórias. Nessa altura dividia casa com uns amigos, que
começaram a estranhar o facto de não socializar e de não aparecer nos
espaços comuns da casa. Quando vieram falar comigo, acabei por
desabafar. Já estava num momento de sufoco. Foi a primeira vez que
contei a alguém, já em idade adulta. A minha família foi a última a
saber. Era mais fácil contar a um amigo.
Deram-me o apoio que eu precisava na altura. Se eu não estivesse em pânico, talvez a vergonha se tivesse apoderado de mim.
Deram-me o apoio que eu precisava na altura. Se eu não estivesse em pânico, talvez a vergonha se tivesse apoderado de mim.
Depois
acabei por falar com dois amigos realmente muito próximos sobre o
assunto. Tratei-o de uma forma muito pragmática e depois acabei por
enterrar este assunto.
Até chegar ao ponto de pedir ajuda profissional ainda foram três/quatro anos. Não era capaz de olhar para mim com 11 anos e perceber que não tive culpa. Eu pensava: 'Como é que não vi os sinais? Como não percebi? Porque aceitei o convite?'
Quando
já estava a viver no Reino Unido, com 32 anos, o assunto voltou. Estava
no trabalho quando encontrei uma notícia sobre um homem que se tinha
suicidado por ter sido julgado num caso de pedofilia. Eu já tinha
trabalhado com ele e fiquei surpreendido. Essa situação originou uma
ponte para o passado outra vez. Foi ai que não consegui mais. As
memórias voltaram, passava o dia com pensamentos sobre os abusos. Tinha
pesadelos e acordava a gritar. No trabalho não me conseguia concentrar.
Fui
à Internet e procurei apoio para vítimas de abuso sexual. Encontrei a
organização Survivors Manchester – que dá apoio a homens que tenham
passado por este tipo de situações. Enviei um email. Escrevi apenas:
'preciso da vossa ajuda'. Tinha receio de utilizar as palavras 'abuso'
ou 'vítima'. A organização respondeu-me e convidou-me para participar
numa sessão introdutória.
Naquela altura, senti que estava no meu limite. Eu nunca pensei em suicidar-me, mas por vezes pensava que se acontecesse alguma coisa e a minha vida acabasse naquele dia iria sentir-me aliviado. Questionava-me: 'quando é que isto vai melhorar?' e nunca havia melhoria.
Naquela altura, senti que estava no meu limite. Eu nunca pensei em suicidar-me, mas por vezes pensava que se acontecesse alguma coisa e a minha vida acabasse naquele dia iria sentir-me aliviado. Questionava-me: 'quando é que isto vai melhorar?' e nunca havia melhoria.
Mais tarde, comecei a frequentar os
grupos de apoio - gratuitos e confidenciais. Estavam cerca de sete
homens na primeira sessão, lembro-me que ia com muito receio e sentia-me
muito exposto. Naquela sala todos sabiam a razão porque ali estava e
isso deixa-me extremamente sensível.
Todos dizem que a
primeira vez que se frequenta um grupo de apoio é a mais complicada, mas
a segunda foi a mais difícil para mim, porque já sabia ao que ia e o
que me aguardava.
Tinha sessões uma vez por semana e
frequentei esta associação cerca de três anos. Praticamente toda a
estadia que estive em Manchester. Realmente o grupo de apoio tem um
poder de ajuda enorme. O fundador da organização de Manchester disse-me
uma vez: "Eu nunca vi ninguém a morrer por falar sobre aquilo que sente,
mas o contrário já não posso garantir". A verdade é que o silêncio
corrói, o silêncio consome. E sempre que um homem quebra o silêncio está
a recuperar.
As primeiras pessoas da família com quem
falei foram duas irmãs mais velhas. Nessa altura, havia um conflito
muito grande entre o meu lado racional e emocional. Por um lado sentia
que não tinha culpa do que se tinha passado, mas por outro não tinha a
certeza se isso era verdade. O apoio delas foi muito importante para
mim. Ainda estava em Manchester. Contei por mensagem porque era mais
fácil para mim ser por escrito. Responderam-me com afecto: 'Vai ficar
tudo bem. Amamos-te muito. Quem me dera estar aí para te abraçar.
Estamos aqui ao teu lado'. Foram palavras muito importantes.
Contar
à minha mãe ainda demorou algum tempo, porque mãe é mãe… Quis falar com
ela só quando eu já estivesse bem comigo próprio. Até que um dia lhe
disse que precisávamos de conversar, que tinha algo pessoal para
partilhar com ela. Contei-lhe o que me aconteceu e que frequentei ajuda.
Ficou em choque. Disse-me que lhe devia ter contado mais cedo para me
poder ajudar. Respondi-lhe que não conseguia. Não foi fácil,
especialmente por ela sentir uma certa frustração por não ter conseguido
impedir que isto acontecesse ao seu próprio filho. Mas ela não podia.
Ninguém podia. A única pessoa que podia ter evitado isto era o homem que
me abusou. A culpa é exclusivamente daquele homem.
Nunca
senti vontade de vingança porque o que eu tinha para resolver estava
dentro de mim. A minha justiça agora revela-se através da associação Quebrar o Silêncio, com o facto de conseguir ajudar outros homens."
* Temos o maior nojo pelos pedófilos e também por quem os protege ou por quem é complacente quando pune.
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