Os erros de Trump
Primeiro erro. Imaginar que se pode gerir um país como uma empresa. Ainda mais um país como os Estados Unidos, vasto, diverso e complexo, com um decisivo papel no plano global.
Um país não é uma empresa. Tem um património, a sua história, e um
devir, o seu futuro, em nada comparável com um negócio por muito sucesso
e longevidade que este tenha.
Acrescente-se que, no caso
de Trump, estamos a falar de um modelo de empresa do velho capitalismo.
Assente nos negócios imobiliários, hotéis, casinos e muita operação
especulativa. Empresa de tipo familiar, pouco ou nada tecnológica, sem
inovação ou diferenciação. Em suma, uma empresa do antigamente,
obsoleta. Não é difícil prever o efeito que este tipo de gestão terá, e
já tem, na política americana. No mínimo, o conflito de interesses é
evidente. Confirmado pelo próprio ao não separar claramente o cargo com
os seus negócios e recusar fazer a entrega das declarações de impostos.
Segundo
erro. Imaginar que basta um bom slogan para criar uma política de
sucesso. "Fazer de novo a América grande" pode ter excitado as mentes
débeis, mas não se consegue concretizar com o tipo de comportamento e
programa promovido pelo novo Presidente. Pelo contrário. A América de
Trump tornou-se numa anedota aos olhos do mundo. Não há dia que passe
que não surja uma nova trapalhada ridícula. Estamos a assistir a uma
acelerada decadência dos Estados Unidos, num contexto global em que
emergem outros candidatos à hegemonia económica e tecnológica, como é o
caso da China e, a caminho, a Índia. Não se resolve com tweets.
Terceiro
erro. A questão do emprego. Usado demagogicamente na campanha, já que
Obama deixou este indicador no seu melhor, ou seja, praticamente não há
desemprego, Trump promete criá-lo em larga escala. Desde logo, não se
percebe com quem? Onde estão as multidões de desempregados a precisar de
emprego? Considerando a eventual expulsão de milhões de latinos, a
procura do desempregado tornar-se-á talvez uma nova profissão em si
mesmo. Abro um parêntesis. Os latinos fazem os trabalhos árduos e sujos.
Quem na América de Trump irá trabalhar nas velhas fábricas, limpar a
casa e cortar a relva do jardim? Enfim.
Mas a ideia de que
se conseguirão criar muitos empregos com o regresso da indústria
deslocalizada para a China e outros países demonstra como este
Presidente não está minimamente informado. O regresso destas indústrias,
que aliás já sucede há cerca de uma década, não cria postos de
trabalhos. Pelo menos humanos. A automação extensiva gera efetivamente
muito trabalho mas não trabalhadores. É uma ilusão imaginar que
regressaremos às fábricas repletas de mão de obra humana. Estamos no
tempo das máquinas.
Quarto erro. Com menos importância
para o planeta, a economia ou a política global, mas maior para o
próprio. O sistemático confronto com os media e muitos jornalistas,
frequentemente de forma direta e ofensiva, promete tornar a sua
presidência infernal. A sucessão de casos, as intrigas, as fugas de
informação, são já o dia a dia de Trump. Imagine-se quando estiver
sentado em Washington. É dos livros. Não se pode hostilizar os media e
sair incólume.
Dito isto, resta acrescentar que a sorte de
Trump não merece comoção. É um homem fora de prazo, incapaz de entender
o mundo atual, primário nas ideias e ainda mais nas soluções. Mas se a
sorte de Trump interessa pouco, a nossa, de todos os que vivem neste
planeta, interessa muito. É que muito provavelmente seremos nós a pagar
pelos seus erros.
Artista Plástico
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
12/01/17
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