Sirvam-se e degustem
A abulia demonstrada por Passos Coelho é uma natural expressão de cansaço, e as declarações dos seus apaniguados têm sido desmentidas pela evidência dos factos.
As morosas e fatigadas respostas políticas de Pedro Passos Coelho têm
causado apreensão entre os sociais-democratas, que entendem como cansaço
exacerbado do seu dirigente ou desinteresse pela batalha ideológica. A
recente reaparição de Maria Luís Albuquerque nas comissões públicas do
PSD tem suscitado os mais diversos comentários, justificados pela
agressiva natureza dos seus textos. E mais justificam a apreensão dos
correligionários, que se têm reunido, em discretos encontros, como é
histórico que o façam.
O aparecimento político do agrupamento de
Esquerda, que tomou conta do poder quando o dr. Cavaco tinha acabado de
designar Passos Coelho para primeiro-ministro, foi um choque repentino e
absolutamente inesperado pela surpresa nunca vista. A "geringonça",
como lhe chamou, com o ardor da raiva, Vasco Pulido Valente, ficou-se
por ser o que na verdade era: um conjunto político constituído pelo PS,
CDU e pelo BE, com um propósito de combate até então nunca visto.
O
ramerrão da vida nacional era detido pelo PSD e pelo PS, e António José
Seguro, embora do PS, preparava-se para ser um fiel servidor do sistema
estipulado e mantido por um grupo chefiado por Pedro Passos Coelho.
Apressadamente, o dr. Cavaco nomeou este último como primeiro-ministro,
mas já era tarde. Teve de aceitar Costa e os seus inesperados cúmplices,
e nomeá-los como favor dos factos, mas servindo-se da manigância das
palavras. Uma cena deplorável pela demonstração de canalhice que a
envolveu.
Ninguém
de bom talhe e rectos modos aceitou esta bizarria. E o dr. Cavaco ficou
com o ferrete da ignomínia. António Costa, esse, tomou a criança nos
braços e começou logo a mexer nas coisas erradas e impulsivas cometidas
por um governo que seguira as vozes de direita da União Europeia. A
situação desacreditou ainda mais Passos Coelho e os seus. O episódio foi
um tormento para o PSD e, também, para o PS, que nunca assistira a tal
vibração dos factos. Com prudência e astúcia, o PCP seguia a rota das
coisas, evitando qualquer embaraço ou escolho. E a "geringonça" lá vai
seguindo o seu rumo, arrastando consigo as indicações que a levam a ser
primeira em todos os índices de opinião.
As tradicionais
estruturas que fomentam as ideias e determinam muita coisa na História
sofreram um forte abalo. Afinal, a coesão era uma falácia, que pode ser
alterada e modificada quando os homens assim o entendem. Contra quase
tudo e quase todos, o grupo de António Costa tem produzido factos e
realizado acontecimentos políticos que escapam à natureza tradicional
destas coisas. A abulia demonstrada por Passos Coelho é uma natural
expressão de cansaço, e as declarações dos seus apaniguados têm sido
desmentidas pela evidência dos factos.
O reaparecimento, nas
declarações públicas, de Maria Luís Albuquerque significa algo que
escapa à natureza habitual das interpretações. O PSD, desde que se o
conhece, não aceita um lugar subalterno na pirâmide política habitual, e
com a qual temos sobrevivido, na indiferença comum ao nosso viver. O
sobressalto causado por António Costa e os seus alterou, por completo, o
nosso modo de viver político. E a procissão ainda vai no adro. Como
disse, em tempos, Almeida Garrett, "façam o favor de se servir e de
degustar."
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
04/11/16
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