Corrupções
Lembram-se do concubinato com Ricardo Salgado?
Marcelo Rebelo de Sousa, no exercício das funções de Presidente da
República, é muito mais perigoso e maior fator de instabilidade do que
Cavaco Silva alguma vez foi.
Isolado, sem estar
integrado e fazendo parte de todo um programa politico global sustentado
em profundas alterações e reformas, do ponto de vista da distribuição
da riqueza, do desenvolvimento económico, de mais justiça social, de
melhor educação e formação cívica, de criação de hábitos de usufruto das
artes e cultura, o combate à corrupção é apenas manchete de tabloide.
Sem uma efetiva compreensão do fenómeno da corrupção, das suas raízes
culturais e históricas e ramificações financeiras, sem uma apropriada
capacidade de meios técnicos e de investigação, e legislação eficaz
adequada aos tempos e ao modo, o combate à corrupção torna-se parte
manipulável do próprio agente corruptor.
Não existe um programa político sério sem ter como referência o
combate à corrupção, mas a corrupção não pode ser por si só um programa
político.
Se a corrupção for apresentada como a razão e origem de todos os
males sociais, e que terminando com a corrupção tudo ficará bem, estamos
no grau zero da demagogia, a democracia corre perigo e o estado
totalitário espreita.
São as políticas de exploração, as injustiças sociais e económicas, a
errada distribuição de riqueza, o vazio cultural e a promoção do
efémero e uma justiça pesada e ineficaz que são o campo fértil onde
nasce e prospera a corrupção.
O discurso contra a corrupção é em essência, muitas vezes, um
discurso básico de conteúdo, provinciano, populista, a raiar o infantil
no que respeita aos argumentos, hipócrita, manipulado e seletivo na
informação.
Os fascistas italianos, em 1922, tinham a luta contra a corrupção
como bandeira; em 1933, os nazis seguiram-lhes o exemplo; e essa foi
também a cartilha dos falangistas de Franco em 1936.
Para todos eles, a democracia, os parlamentos, os deputados eleitos,
os partidos políticos e sindicatos eram fomentadores de corrupção.
Sabemos o que aconteceu a seguir.
A corrupção é um fenómeno que tem de ser tratado com determinação,
seriedade e coragem. As generalizações e campanhas como as de Paulo
Morais não são só uma oportunidade perdida, são meros exercícios de
demagogia.
São ataques inconsequentes à democracia e às suas instituições, sendo objetivamente úteis ao corruptor.
O facto de as suas declarações de identificação do património
imobiliário terem zonas opacas, não referindo um conjunto de dados
essenciais que permitem avaliar o seu real valor, e de só ter entregado a
obrigatória declaração de rendimentos de cessação de funções dez anos
depois de ter deixado a Câmara do Porto, em 2005, não ajuda à
transparência da retórica do candidato.
Marisa Matias, confrontada se tinha votado favoravelmente no
Parlamento Europeu a intervenção militar externa na Líbia, afirmou de
forma perentória que votou contra e sugeriu a consulta das atas. As atas
confirmaram que, efetivamente, votou a favor. Teria sido mais simples
admitir o lapso. Agora, não só errou ao votar a legitimação da
intervenção militar como mentiu ao negar que o tivesse feito.
A forma como entendemos os nossos erros e ainda tentamos retirar vantagem deles também é uma forma subtil de corrupção.
A minha intransigência em relação a uma esquerda snob e pateta, que
sobrevive ansiosa por ser reconhecida nos antípodas como inteligente e
respeitável, todos os dia se intensifica.
É bem verdade que, na sua maioria, estas inúteis alimárias, que só
têm peitinho e tagarelo para zurzir na esquerda séria que é a sério, nos
intervalos dos projetos falidos, mantêm uma excitada admiração por
vetustos exemplares de direita que bitolam de sobredotados.
Bom, diga-se em abono da verdade que não sabemos exatamente que parte
do corpo dos admirados eleitos é que as prosaicas criaturas cobiçam com
nota máxima.
Não sei o que é mais dolorosamente caricato, se assistir ao candidato
da direita esganiçar-se que é independente e que é da esquerda da
direita – o desespero e a falta de noção do ridículo revelam um burlesco
Marcelo no seu esplendor –, se observar os dislates de uns desamparados
rabaceiros esquerdistas a cantar hosanas ao adversário político.
Não tenham receio nem peçam desculpa por votar contra o professor,
não só por razões ideológicas, mas também pelo seu trajeto político e
comportamento ético.
Lembram-se da defesa das políticas de direita no que respeita à
redução das prestações sociais? Lembram-se da posição na campanha do
referendo da despenalização da interrupção voluntária da gravidez, com
direito a vídeo no YouTube? Lembram-se da posição sobre o salário
mínimo? E sobre o Serviço Nacional de Saúde, recordam-se? E do
concubinato com Ricardo Salgado, esqueceram-se? E do conselheiro de
Cavaco, lembram-se? E das mentiras reiteradas que diz com a leveza de
uma graçola que, pelos vistos, tanto vos deleita?
Marcelo Rebelo de Sousa, no exercício das funções de Presidente da
Republica, é muito mais perigoso e maior fator de instabilidade do que
Cavaco alguma vez foi.
Para isso, precisa de ter neutralizado e iludido uma parte do povo de
esquerda, coisa que foi realizando ao longo de anos de rábulas nas
televisões, como numa hipnose telegénica.
Não precisava de falar para a direita, que o reconhecia como filho.
Era para uma esquerda perdida entre o acessório e o fundamental que
Marcelo durante anos fabricou o boneco de “um tipo de direita afável,
igual a nós”.
É essa esquerda que candidamente o acha muito “simpático, amigo dos
animais, com um lado brincalhão quase infantil”, e que, se não fosse cá
por coisas, até votava no professor.
Num pátio onde quase todos são primos, já comeram alguém da família
ou dormem com o inimigo, onde nunca se sabe se a palavrinha impressa
hoje não vai ser o aborrecimento de amanhã, e onde, quando se cruzam, os
camafeus logo regurgitam um “tenho uma grande estima pelo senhor
doutor”, compreendo que não é fácil andar ereto.
Mas tenham vergonha, e assumam-se pelo menos uma vez como, já não digo de esquerda, mas pelo menos da
direita da esquerda, e vamos lá a cumprir o dever cívico sem que a mão
trema ou a consciência hesite. Não é caso para isso.
14/01/16
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