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IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
29/11/15
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A ver vamos
1- Bastava ter lido e
ouvido os praticamente unânimes elogios à composição do novo governo
para se perceber uma ânsia de normalização política. Não é que não
existam legítimas dúvidas em relação a escolhas para alguns ministérios.
Mas, e não negando o equilíbrio que me parece existir entre
conhecimento das diversas áreas e capacidade política do novo executivo,
o aplauso às escolhas de António Costa indicam mais vontade de fechar o
período de turbulência por que passámos nos últimos meses do que
propriamente a ideia de que estaremos perante um governo à prova de
bala.
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Marcelo Rebelo de Sousa - que mostra a cada passo que será como Presidente o oposto absoluto de Cavaco Silva - resumiu bem o sentimento: "Os portugueses estão fartos do clima de crise e de brincar ao cai não cai do governo." Mesmo gente que embarcou na história da ilegitimidade e da golpada se mostra disposta a dar o que todos os governos formados à luz dos princípios democráticos devem desfrutar no início dos seus mandatos: o benefício da dúvida.
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Marcelo Rebelo de Sousa - que mostra a cada passo que será como Presidente o oposto absoluto de Cavaco Silva - resumiu bem o sentimento: "Os portugueses estão fartos do clima de crise e de brincar ao cai não cai do governo." Mesmo gente que embarcou na história da ilegitimidade e da golpada se mostra disposta a dar o que todos os governos formados à luz dos princípios democráticos devem desfrutar no início dos seus mandatos: o benefício da dúvida.
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É bom,
aliás, que o PSD e o CDS percebam rapidamente que o discurso da
ilegitimidade pode ter consequências muito negativas para eles próprios.
Em primeiro lugar porque, apesar de a comunidade parecer estar
radicalizada, toda a gente percebe que não será bom para ninguém viver
em crise política permanente e que é primeiro preciso avaliar, pelo
menos, os primeiros atos de governação. Como diria o antigo Cavaco
Silva: deixá-los trabalhar.
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Em segundo
lugar, quanto mais cedo o PSD e o CDS montarem um discurso político
alternativo e de verdadeira oposição melhor. Há quem defenda nesses
partidos que se deve apostar tudo em tentar derrubar este governo mesmo
antes de poder haver eleições mantendo o discurso da ilegitimidade. Mas
será um enorme erro político: não só porque caso isso não aconteça - e é
quase impossível isso suceder, logo que seja aprovado o primeiro
orçamento - o PSD e o CDS ficam sem discurso, mas também porque,
sobretudo, o PSD é um partido com responsabilidades específicas. Ninguém
ia entender uma posição mais própria de partidos revolucionários,
parecida com aquela que tem sido até agora a do BE e do PC, que mal
perdem eleições pedem logo outras.
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Em
terceiro lugar, não é possível conciliar a linha da ilegitimidade e de
tudo chumbar (como foi anunciado precipitadamente) com as linhas
programáticas e ideológicas do PSD e do CDS. Em aspetos que digam, por
exemplo, respeito aos compromissos europeus o eleitorado desses dois
partidos não ia entender eventuais votos contra.
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Isto,
aliás, remete-nos para uma novidade quase absoluta da nossa democracia:
uma verdadeira centralidade política do Parlamento. A verdade é que
sempre foi no seio do governo que as mais importantes questões políticas
se resolveram. Os partidos que apoiavam o governo limitavam-se a
receber ordens e a agir em conformidade. Não será, como é óbvio, a
realidade que vamos ter pela frente. E apesar de essa situação poder ser
vista como recomendável sob o ponto de vista da representação e da
transparência, exigirá uma enorme capacidade negocial, processos de
decisão mais lentos e levará a que as maiorias formadas não sejam, em
várias situações, as que geraram este governo.
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No
fundo, a obrigatoriedade permanente de negociar é um dos preços a pagar
por António Costa por não ter conseguido, como teria sido desejável,
levar o BE e o PCP para o governo. E, seja por incapacidade ou falta de
vontade, não irá ajudar nada ter formado um governo em que a maioria dos
elementos estão longe de ser esquerdistas e sem uma única figura sequer
vagamente próxima dos bloquistas ou comunistas. Temos, assim, um
governo suportado no Parlamento pelas esquerdas mas formado por gente do
centro.
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A solução governativa é
frágil, o desafio de reverter o caminho seguido até aqui é muito
complicado, os acordos necessários a uma ação coerente e sólida serão
difíceis e de geometria variável. A ver vamos.
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2-
Outro dos maiores desafios à durabilidade deste governo prende-se com a
autonomia estratégica que cada partido tem de ter, sabendo que a
essência de uma organização partidária reside na defesa de um património
político e ideológico. Face à atual situação e ao que teremos pela
frente, em termos muito simples, o eventual sucesso deste governo será,
no futuro, um problema eleitoral, nomeadamente, para o BE - não será
necessário discorrer sobre as características do eleitorado que flutua
entre os socialistas e bloquistas.
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Por
outro lado, uma colagem absoluta do CDS e do PSD trará problemas graves à
sobrevivência do CDS. Não é em vão que o PSD parece ter em alguma
medida já assumido o seu papel de normal oposição e o CDS continua com
um discurso muito exaltado. Tendo a PAF acabado no momento da tomada de
posse de António Costa, o CDS não pode assumir-se como seguidor cego do
PSD, terá de redesenhar as suas linhas vermelhas e isso terá, como é
natural, consequências na sua relação com o PSD e com o PS. Um partido
só sobrevive se as pessoas perceberem que tem bandeiras diferentes das
dos outros e, quer se queira quer não, o primeiro mandamento de um
partido é a sua própria sobrevivência.
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
29/11/15
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