HOJE NO
"DIÁRIO ECONÓMICO"
FMI assume que Portugal devia
ter reestruturado a dívida
O Fundo Monetário Internacional (FMI) assumiu ontem que países como
Portugal teriam beneficiado de uma reestruturação da dívida pública,
feita de forma significativa, logo no arranque dos seus programas de
ajustamento. A conclusão foi assumida por Vivek Arora, director do
Departamento de Análise Estratégica e Política do FMI, numa conferência
de imprensa sobre um relatório técnico de avaliação aos programas de
ajustamento da crise.
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“Não temos um ponto de vista específico
sobre Portugal, mas temos uma visão geral: se os países têm um rácio de
dívida elevado ou se a sustentabilidade da sua dívida não pode ser
assumida categoricamente, então a reestruturação da dívida à cabeça é
uma solução desejável”, explicou Vivik Arora, quando questionado sobre o
caso português.
É que o relatório de análise aos programas de
ajustamento da crise, divulgado ontem à tarde em Washington, explica que
Portugal foi um dos países onde a dívida não podia ser considerada
sustentável de forma categórica. Contudo, por riscos de efeitos de
contágio, o FMI accionou a cláusula criada para o caso grego para, ainda
assim, participar no resgate internacional.
“Em Portugal, foi
difícil afirmar categoricamente que havia uma elevada probabilidade de a
dívida ser sustentável no curto prazo”, lê-se no relatório. “Contudo,
tendo em conta preocupações com contágios sistémicos internacionais, foi
evocada a cláusula de excepção para justificar o acesso excepcional [ao
apoio do FMI]”.
Foi também pelos riscos de contágio que a
reestruturação foi, na altura, afastada tanto em Portugal, como na
Irlanda, reconhece ainda o documento.
Ontem, Vivik Arora explicou
que “teria sido melhor reestruturar a dívida” nos países com as
características de Portugal para evitar que “o peso do ajustamento fosse
transferido da redução da dívida para um esforço de consolidação
orçamental muito grande”.
Ou seja: como Portugal não
reestruturou a dívida à partida, foi obrigado a procurar uma forte e
rápida redução do défice orçamental. Esta foi, de facto, a estratégia do
então ministro das Finanças, Vítor Gaspar, assim que chegou ao Governo,
em 2011: perante o “desvio colossal” de dois mil milhões de euros na
execução do orçamento, o Executivo informou a ‘troika’ de que aplicaria
uma sobretaxa no IRS, equivalente ao corte de metade dos subsídios de
Natal acima do salário mínimo.
Portugal é, assim, um exemplo
paradigmático do que o relatório técnico do FMI concluiu como
consequência de esforços demasiado elevados de consolidação: “Podem
provocar uma queda grande no PIB e prejudicar o rácio da dívida pública
no curto prazo”, explicou o director do FMI. No final do terceiro
trimestre deste ano, a dívida pública portuguesa ainda se encontrava
acima dos 130% do PIB, segundo o Banco de Portugal. Por isso, “é
desejável um ritmo mais lento de consolidação, o que implica mais
financiamento disponível”, rematou ontem Vivik Arora.
Um fechar de olhos que começou na Grécia
A
conclusão de ontem vai exactamente no mesmo sentido daquela que o Fundo
teceu sobre a Grécia no Verão de 2013, quando publicou um relatório de
análise ao primeiro resgate à economia helénica.
Na altura, o
FMI escreveu que quando foi chamado a participar no primeiro programa
grego, em 2010, Atenas não reunia condições para receber financiamento,
porque a dívida não era sustentável. A instituição hoje liderada por
Christine Lagarde propôs uma reestruturação, para que o rácio pudesse,
pelo menos, “parecer sustentável”. Uma ideia que “foi posta de parte
pela zona euro”, com vários países a levantarem “argumentos de perigo
moral [ou seja, uma recompensa a um país mal comportado]”.
Com o
alívio na dívida fora das opções, só havia duas hipóteses: “entrar de
imediato em ‘default’, ou seguir em frente, como se fosse possível
evitar a reestruturação”. Escolheu-se a segunda opção, que obrigou o FMI
a fechar os olhos e contornar as próprias regras, criando a tal
cláusula de excepção sobre o risco sistémico.
A questão da
sustentabilidade da dívida manteve-se sempre bem presente no caso grego,
com o Fundo a reconhecer ter sido um erro aceitar financiar o país sem
uma reestruturação prévia. De tal forma que, para participar no actual
terceiro resgate, impôs como condição os países do euro avançarem para
um alívio na dívida helénica, algo que ainda não aconteceu – e, como
tal, o Fundo mantém-se, para já, fora do financiamento a Atenas.
Em
Portugal, a questão da dívida também foi várias vezes levantada pelo
FMI que, ainda durante o programa, chegou a sublinhar num relatório de
avaliação que não era possível “garantir a sustentabilidade a médio
prazo” da mesma.
* Afinal teria sido melhor a reestruturação da dívida conforme muitos economistas preconizavam. Mas as inteligências do PSD e CDS estavam mais interessadas em genuflectir diante da sra. Merkel do que pensar em Portugal.
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