"No meu tempo é que era?"
Eu tenho saudades do telefone fixo (esse sobreviveu a todos os movimentos de mudanças e processos de minimalismo e continua comigo apesar de desligado).E
tenho saudades de ler jornais e ir buscar cartas à caixa do correio (a
última vez que recebi uma carta, sem ser contas para pagar e faturas,
foi no verão passado, quando a minha mãe obrigou o meu filho mais velho a
mandar-me um postal)
Sim, esta é uma crónica saudosista, cheia daqueles exercícios irritantes de "no meu tempo é que era".
Há
dias em que detesto as redes sociais. Há dias em que detesto a rapidez
da internet e a facilidade com que carregamos no botão para partilhar
uma notícia, um texto, ou um vídeo, em que lemos apenas o título.
Há
dias em que sinto que estes mecanismos potenciadores da democracia e da
liberdade são exactamente o contrário disso. É aqui que começo: "no meu
tempo" (e repare-se que, no tempo a que me refiro já existia internet -
apesar de horas infinitas para que cada ligação fosse estabelecida, bip
e telemóveis) as coisas aconteciam devagar.
E essa demora, aparentemente chata, obrigava-nos a digerir a informação.
Fosse a morte de um amigo, a notícia da guerra num país distante, ou a análise dos golos do jogos de domingo à tarde.
Se
a facilidade com que partilhamos "as gordas" das notícias que não lemos
até ao fim e com que nos revoltamos contra as injustiças deste mundo
correspondesse a atos concretos e reais, seria bom. Seria igualmente
desejável que não estívessemos limitados, apesar da facilidade com que a
informação é partilhada, pelas ondas virais de um ou outro assunto.
Ontem,
falámos apenas da pizza, hoje o assunto é um criança morta apesar de
uma guerra que existe há anos, amanhã uma decisão bárbara, que afinal é
apenas uma informação recolhida há anos.
Existirá, com certeza, um
equilíbrio entre a lentidão "do meu tempo" e esta sofreguidão,
demasiado fácil, com que nos tornámos detentores e difusores de opinião e
verdades absolutas sobre todos os assuntos. E reparem, escrevo no
plural, porque o "meu tempo" também é este e tento pensar várias vezes
antes de opinar, e nem sempre consigo.
Escritora e autora do blog Dias de Uma Princesa
IN "DINHEIRO VIVO"
07/09/15
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