10/06/2015

MARIANA MORTÁGUA

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Mais uma vez, 
é o emprego

Os discursos catastrofistas são, além de manifestamente exagerados, perigosos. Quer isto dizer que tudo vai bem no reino da Segurança Social? Não, nem por isso. O caminho é duro e os ventos não sopram a favor. Separemos os problemas, para que não nos percamos na confusão - quase sempre propositada - do debate.

Foquemo-nos no sistema previdencial, responsável pela distribuição de rendimentos com base profissional - as pensões (velhice, invalidez, sobrevivência) - assente em dois princípios, solidariedade e coesão intergeracional. Quem hoje trabalha paga a reforma dos seus pais, esperando que os seus filhos paguem a sua.

Vários fatores pressionam este esquema. O aumento da esperança média de vida faz com que paguemos hoje mais anos de pensões. Mas também é verdade que o aumento tendencial dos salários deveria tornar essa tarefa mais fácil. Depois há a mudança estrutural do funcionamento da economia, em que a produção é tendencialmente mais intensiva em tecnologia e capital que em trabalho. Por isso o Bloco defende, há anos, que parte do financiamento da segurança social deveria provir de uma taxa sobre o valor acrescentado das empresas, e não apenas sobre o número de trabalhadores. E chegamos, finalmente, à pedra de toque da discussão. A sustentabilidade do sistema pressupõe que tenhamos hoje um número de pessoas a trabalhar e contribuir que seja suficiente para compensar aqueles que estão reformados.

Durante os últimos 4 anos nenhum dos pressupostos acima mencionados foi cumprido. A média dos salários para novos trabalhadores é de 581 euros, brutos. Havia, em 2014, menos pessoas empregadas que em 1988, e nada foi feito para diversificar as fontes de financiamento do sistema.

Enquanto estes três problemas se mantiverem, a discussão será sempre como cortar hoje para compensar os cortes de ontem. Não é retirando 600 milhões às pensões de hoje, penalizando ainda mais as condições de vida, que se resolve o problema de amanhã.

O verdadeiro objetivo da proposta é safar o défice de agora, mesmo que isso custe rasgar o contrato entre gerações. Diz muito sobre as escolhas de quem invoca o seu (e nosso) bom nome para cumprir à letra o contrato de pagamento de dívida pública, custe o que custar.

O efeito colateral é ir abrindo caminho para o sistema alternativo: um sistema de capitalização, parecido a um PPR, gerido por fundos privados, em que cada um poupa para a sua velhice. E quem não teve salário para isso? Bom, para esses há sempre a caridade. Para os outros, resta a esperança que a bolsa nunca desça e não arruíne a reforma de milhões de trabalhadores.


IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
09/06/15


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