Deputados
paraquedistas
Por esta altura, haverá uma intensa
movimentação nos bastidores das direções nacionais e comissões
distritais dos partidos a fim de se garantir um lugar nas listas para
deputados à Assembleia da República. É natural. Já não será assim tão
normal ver nos lugares cimeiros de determinado círculo políticos que
nada têm a ver com aquela circunscrição eleitoral. São os deputados
paraquedistas que estão ali porque não encontram lugar nas listas donde
são naturais e onde vivem. Num profundo desrespeito pelo distrito que os
elege. E isso deveria merecer mais atenção.
Todos sabemos que
Portugal é um país profundamente centralista. E isso tem vindo a
exacerbar-se, em grande parte devido a um sistema político que
desvaloriza ostensivamente o que está fora de Lisboa. Poder-se-ia pensar
que, em tempo de eleições, esta tendência esbate-se por ação de uma
caravana eleitoral que atravessa o país, tentando fazer passar a
mensagem de que as pessoas interessam. Do Minho ao Algarve, não
esquecendo os Açores, a Madeira e a diáspora. Nada mais falso. Na
preparação das legislativas, a elaboração das listas à Assembleia da
República é o maior exemplo do indecoroso desrespeito pelo país que
somos e da vergonhosa falta de representatividade da casa da democracia.
Seria
certamente um bom tema de reportagem explorar quantos deputados são
efetivamente originários ou têm uma vida cruzada com o círculo eleitoral
que os acolhe. Neste contexto, uma variável fundamental a ter em conta
seria a do lugar que se ocupa numa lista. É claro que alguns autóctones
integrarão sempre o grupo daqueles que se apresentam a sufrágio, mas, em
grande parte dos casos, em lugares não eleitos. Estão lá para dar a
ideia de que há integração da gente da terra e, por outro lado, para
garantir trabalho braçal na captação do voto local e na logística
necessária a uma caravana que passa velozmente pelo país. Por vezes, um
ou outro lá vai conseguindo furar o cerco dos habitués dos Passos
Perdidos. Ora porque milita há anos e conseguiu cair nas boas graças da
direção do partido, ora porque os resultados excedem as expectativas e
alarga-se o número previsto de eleitos. Têm sorte, costuma dizer-se. O
que significa que há uma lógica de caciquismo de que o Portugal do
século XXI não consegue libertar-se. O que reflete e, simultaneamente,
estrutura o atraso do país.
Numa tentativa de justificar o que não
tem qualquer explicação fundamentada, haverá sempre quem atire o
argumento de que determinado círculo não produz políticos suficientes
para dar corpo a uma lista de efetivos. Ora, a desenvolver-se tal
raciocínio, isso significa que as estruturas distritais entorpeceram-se,
tornando-se incapazes de uma renovação que terá sempre de passar por
atrair quadros capazes de valorizar uma proposta partidária. E isso
deveria ser penalizado nas urnas.
Mas vamos aceitar os argumentos
mais inverosímeis para a integração dos chamados deputados paraquedistas
em determinados círculos eleitorais. O mínimo que deles se espera é um
trabalho permanente com aqueles que os elegem. Ora se grande parte deles
nem sequer tem agenda para participar em cerimónias oficiais
organizadas pelas instituições locais, que disponibilidade terão para o
resto? Uma análise diacrónica da imprensa regional poderá ajudar-nos a
perceber bem esta ausência dos deputados nos lugares que os elegem. Nada
de verdadeiramente relevante puxa os nossos deputados para o chamado
país real, nem o chamado país real ganha força suficiente para entrar no
hemiciclo e constituir-se como tema de debate nacional.
Num
momento em que se procura reformular a lei que controla a cobertura
mediática da campanha eleitoral, os media noticiosos poderiam também
renovar o modo como mediatizam este período. Só o escrutínio
jornalístico terá a força necessária para começar a fazer inverter um
clientelismo partidário que desrespeita os eleitores e contribui para um
centralismo retrógrado.
Pró-Reitora da Universidade do Minho
IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
12/06/15
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