16/06/2015

FELISBELA LOPES

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Deputados
paraquedistas

Por esta altura, haverá uma intensa movimentação nos bastidores das direções nacionais e comissões distritais dos partidos a fim de se garantir um lugar nas listas para deputados à Assembleia da República. É natural. Já não será assim tão normal ver nos lugares cimeiros de determinado círculo políticos que nada têm a ver com aquela circunscrição eleitoral. São os deputados paraquedistas que estão ali porque não encontram lugar nas listas donde são naturais e onde vivem. Num profundo desrespeito pelo distrito que os elege. E isso deveria merecer mais atenção.

Todos sabemos que Portugal é um país profundamente centralista. E isso tem vindo a exacerbar-se, em grande parte devido a um sistema político que desvaloriza ostensivamente o que está fora de Lisboa. Poder-se-ia pensar que, em tempo de eleições, esta tendência esbate-se por ação de uma caravana eleitoral que atravessa o país, tentando fazer passar a mensagem de que as pessoas interessam. Do Minho ao Algarve, não esquecendo os Açores, a Madeira e a diáspora. Nada mais falso. Na preparação das legislativas, a elaboração das listas à Assembleia da República é o maior exemplo do indecoroso desrespeito pelo país que somos e da vergonhosa falta de representatividade da casa da democracia.

Seria certamente um bom tema de reportagem explorar quantos deputados são efetivamente originários ou têm uma vida cruzada com o círculo eleitoral que os acolhe. Neste contexto, uma variável fundamental a ter em conta seria a do lugar que se ocupa numa lista. É claro que alguns autóctones integrarão sempre o grupo daqueles que se apresentam a sufrágio, mas, em grande parte dos casos, em lugares não eleitos. Estão lá para dar a ideia de que há integração da gente da terra e, por outro lado, para garantir trabalho braçal na captação do voto local e na logística necessária a uma caravana que passa velozmente pelo país. Por vezes, um ou outro lá vai conseguindo furar o cerco dos habitués dos Passos Perdidos. Ora porque milita há anos e conseguiu cair nas boas graças da direção do partido, ora porque os resultados excedem as expectativas e alarga-se o número previsto de eleitos. Têm sorte, costuma dizer-se. O que significa que há uma lógica de caciquismo de que o Portugal do século XXI não consegue libertar-se. O que reflete e, simultaneamente, estrutura o atraso do país.

Numa tentativa de justificar o que não tem qualquer explicação fundamentada, haverá sempre quem atire o argumento de que determinado círculo não produz políticos suficientes para dar corpo a uma lista de efetivos. Ora, a desenvolver-se tal raciocínio, isso significa que as estruturas distritais entorpeceram-se, tornando-se incapazes de uma renovação que terá sempre de passar por atrair quadros capazes de valorizar uma proposta partidária. E isso deveria ser penalizado nas urnas.

Mas vamos aceitar os argumentos mais inverosímeis para a integração dos chamados deputados paraquedistas em determinados círculos eleitorais. O mínimo que deles se espera é um trabalho permanente com aqueles que os elegem. Ora se grande parte deles nem sequer tem agenda para participar em cerimónias oficiais organizadas pelas instituições locais, que disponibilidade terão para o resto? Uma análise diacrónica da imprensa regional poderá ajudar-nos a perceber bem esta ausência dos deputados nos lugares que os elegem. Nada de verdadeiramente relevante puxa os nossos deputados para o chamado país real, nem o chamado país real ganha força suficiente para entrar no hemiciclo e constituir-se como tema de debate nacional.

Num momento em que se procura reformular a lei que controla a cobertura mediática da campanha eleitoral, os media noticiosos poderiam também renovar o modo como mediatizam este período. Só o escrutínio jornalístico terá a força necessária para começar a fazer inverter um clientelismo partidário que desrespeita os eleitores e contribui para um centralismo retrógrado.

Pró-Reitora da Universidade do Minho


IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
12/06/15


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