A Vanessa ficou animada com o discurso de Natal de Pedro Passos Coelho. Achou que sim, que era o primeiro Natal em anos “sem acumulação de nuvens negras no horizonte”, com “o futuro aberto diante de nós”. Depois de ouvir Passos Coelho em silêncio, sentiu-se “numa nova fase”. Uma optimista desalmada a entrar em 2015
A mística do Benfica talvez seja menor que a da passagem de ano,
quando humanos sensatos, na posse das suas plenas faculdades, se
sujeitam de livre vontade a engasgar-se com um fruto seco.
Foi o que a Vanessa fez, na festa a que escolheu ir (depois de ter
dito que sim a 7 convites diferentes para poder decidir conforme o
“mood”), numa casa alugada por uns amigos, no Alentejo, que tinha uma
lareira com má ventilação.
– Olha, engoli fumo, passas e espumante, tudo sem travar.
– E foi bom?
– Foi mais ou menos. Conheci uns tipos giros. Vou jantar com um deles na próxima semana.
– E o socialista moderado?
–
Um dos meus projectos para 2015 é avaliar essa hipótese. Vou tentar
perceber qual é o programa de vida dele. Ainda não sei se me interessa.
Este ano vou analisar tudo muito cuidadosamente.
A Vanessa tinha
feito uma lista das coisas fundamentais para conseguir em 2015. A
primeira era arranjar um emprego. Se isto falhasse, voltaria a Londres.
–
Mas estou optimista. Não ouviste o Passos Coelho? Se ele que é
primeiro-ministro diz que as nuvens negras vão acabar é porque deve
estar bem informado. Fogo, estou farta da crise. O homem desta vez
conseguiu animar-me!
O discurso de Natal de Passos Coelho tinha tido
uma influência benéfica na forma como a Vanessa tinha passado as
festas. Foi com atenção e em silêncio total que ela ouviu o
primeiro-ministro dizer que “este será o primeiro Natal desde há muitos
anos em que os portugueses não terão a acumulação de nuvens negras no
seu horizonte”.
– Achas que ele tem razão? Se o disse é porque tem,
não é? Achas que vou conseguir mesmo arranjar trabalho? Se o este foi “o
primeiro Natal desde há muitos anos em que temos o futuro aberto diante
de nós”, é porque o meu futuro vai ser espectacular não achas? Não te
esqueças que ele também disse que “houve muita coisa que mudou em todo
este período e finalmente começamos a colher os frutos dessas
transformações”. Eu quero colher os frutos!!!!!! Eu estou doida para
colher os frutos!!!!!!
– Isto não vai fácil.
– Caramba, que tu
és pessimista. É insuportável falar contigo. O homem disse que “entrámos
numa nova fase”. Eu estou a entrar numa nova fase e não quero que me
venhas chatear com o teu pessimismo. Não ouviste o homem? “Uma fase de
crescimento, de aumento do emprego e de recuperação dos rendimentos das
famílias”. É isso que vai ser.
Foi bom Passos Coelho ter conseguido
retirar a Vanessa daqueles pós de depressão natalícia, mas o excesso de
confiança na entrada em 2015 parecia-me um bocado disparatado.
–
Disparatada és tu! Eu acredito no homem! Se ele diz que “entrámos numa
nova fase em que podemos sentir cada vez mais confiança no futuro” eu
digo já que sim. Sinto-me numa nova fase!!! E não vão ser conversas
pessimistas do costume que me vão retirar esta esperança. Não percebes
que me tenho que agarrar a alguma coisa? Se não tiver mais nada para me
agarrar do que um discurso de Natal, paciência!!!!!!
IN "i"
03/01/15
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