I
Isaac Newton, o último
mágico que foi o primeiro
cientista moderno
Isaac
Newton (1642–1727) foi o mais brilhante físico e matemático do seu
tempo. Aos 26 anos, era professor numa das melhores universidades do
mundo; quando morreu, aos 84, era o cientista mais poderoso da Europa.
Coisa rara, tinha recusado tomar ordens religiosas, ao contrário da
tradição dos professores de então, e vivia em sociedade, ocupando cargos
influentes.
Apesar desse poder imenso, nunca chegou a publicar metade do que
escreveu: notas dispersas, cadernos, rascunhos de livros, cálculos, uma
vida de trabalho. Não publicou e nem queria publicar. Um livro recente
investiga esses documentos escondidos, que foram comprados pelo
economista John Maynard Keynes, entre outros, e apresenta uma
explicação: Newton receava a polémica (depois de um conflito
desagradável com Leibniz, acerca de quem tinha inventado o cálculo
diferencial) mas, sobretudo, receava a censura.
Tinha boas razões, porque os seus textos ocultos tratavam de questões
religiosas sensíveis: Newton rejeitava a noção de “Santíssima Trindade”
e, pior, procurava chaves secretas escondidas entre as linhas da
Bíblia. Ora, era precisamente a desconfiança em relação a esse dogma e
esta paixão pela numerologia que o tornava um herético perigoso. Ao
mesmo tempo, dedicava-se à alquimia, e as experiências químicas que
realizou secretamente durante anos a fio, bem como as especulações sobre
mistérios cabalísticos, só podiam fazer perigar a sua vida, porque eram
proibidas.
Newton, o primeiro dos cientistas do futuro e o último dos
alquimistas e mágicos do passado, protegeu-se com o silêncio.
Atravessados entre duas épocas, os seus textos escondidos testemunham
tanto a ousadia como o medo.
Para compreender grandes figuras do nosso mundo, quantas vezes temos de escrutinar a contradição.
IN "PÚBLICO"
30/08/14
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