09/05/2014

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HOJE NO
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Cada vez há mais empresas 
com rastreio de álcool

Protecção de Dados já autorizou controlos em 140 organizações este ano. Umas estão a arrancar por programas, outras a legalizar procedimentos.
Soprar no balão no local do trabalho vai ser um cenário cada vez mais comum nas empresas portuguesas. Desde o início do ano, a Comissão Nacional de Protecção de Dados autorizou 140 pedidos de tratamentos de dados no âmbito do controlo de substâncias psicoactivas em organizações nacionais, passo obrigatório para implementar este tipo de programas de rastreio periódico do consumo de álcool ou drogas entre os funcionários.

Além da Cofina, cuja autorização foi noticiada em Fevereiro, há outras empresas de maior dimensão com autorização concedida este ano. É o caso do Modelo Continente, do Grupo Sonae, ou da empresa de elevadores Otis. No site da CNDP encontram-se também autorizações concebidas a autarquias, como a de Loures ou de Penafiel.

Desde Janeiro que a CNDP adoptou um novo mecanismo de autorização, que passa pelas empresas preencherem um formulário online onde fazem o pedido e declaram cumprir as regras. Desde 2011 tinha recebido 280 pedidos, muitos dos quais permaneciam pendentes. A hipótese de estes testes está enquadrada legalmente desde 2010 numa deliberação da Comissão Nacional de Protecção de Dados, sendo que muitas empresas por exemplo do sector do transporte realizam despistes de álcool e drogas a alguns funcionários com funções ligadas a condução ou segurança desde os anos 1980. Segundo o i apurou, as autorizações visam na maioria controlo de álcool e dizem respeito a empresas que só agora vão arrancar com estes procedimentos e outras que os estão a legalizar.

A norma da CNPD, que surgiu depois de um período de reflexão, envolvendo sindicatos e patronato e liderado pela Autoridade para as Condições de Trabalho e Instituto para a Droga e Toxicodependência (hoje Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências SICAD), veio estipular que o controlo não deve aplicar-se à generalidade dos trabalhadores mas àqueles cuja "cuja actividade possa pôr em perigo a sua integridade física ou de terceiros." Deve ser objecto de um regulamento interno na empresa, que deve conter as substâncias alvo da detecção, as categorias de profissionais visadas, a frequência dos mesmos e a oportunidade de contraprova gratuita.

Os regulamentos têm ainda de conter os procedimentos a adoptar em caso de teste positivo, como sugestão de tratamento no caso de uma dependência ou a sujeição a processo disciplinar perante uma prestação laboral "considerada fraca e inaceitável independentemente do consumo". "O objectivo é prevenção e reabilitação", sublinha Mário Castro, que considera a exigência de um programa de saúde ocupacional nas empresas mais importante do que a existência de testes.

Mário Castro, do SICAD, explicou ao i que os regulamentos podem incluir além de controlos periódicos, sem pré-aviso e aleatórios, a hipótese de testes imediatos a funcionários que se apresentem ao serviço alcoolizados ou sob efeito de drogas. Por outro lado, as empresas podem fundamentar a inclusão de outras categorias profissionais, desde que assegurem o princípio da proporcionalidade, explicou ao i Luís Gonçalves da Silva, especialista em direito do trabalho. "O meio tem de ser proporcional aos objectivos, poderá não fazer sentido a despistagem a trabalhadores sentados num quiosque mas pode fazer sentido motoristas, seguranças ou chefias."

Limites 
Os resultados do teste, que têm de ser sempre feitos por profissionais de saúde sujeitos a sigilo, não podem ser do conhecimento do empregador, sendo que o médico do trabalho só dá o trabalhador como apto ou não após consulta e o "mero consumo de substâncias psicoativas não pode ser considerado justa causa de despedimento". Segundo jurisprudência do Supremo de Justiça e Tribunal Constitucional, desde que o teste tenha suporte legal, o trabalhador não pode recusá-lo, podendo essa objecção levar ao despedimento por justa causa. Gonçalves da Silva sublinha que em casos em que o teste é ilegítimo ou quando os empregadores acabam por ter conhecimento dos resultados do despiste, o Código de Trabalho prevê contra-ordenações graves.

Alguns Exemplos
Cofina Em Fevereiro a Cofina, proprietária de publicações como “Correio da Manhã”, “Record” ou “Jornal de Negócios”, comunicou aos funcionários o início de um  programa de prevenção e controlo de consumo de bebidas alcoólicas nas empresas do grupo. Além de testes aleatórios a todos os trabalhadores, dava conta da hipótese de testes de alcoolemia a funcionários que se apresentem ao serviço com sinais exteriores de embriaguez ou acidente de trabalho. Segundo avançou na altura o “Diário Económico”, resultados positivos em situações de embriaguez no local de trabalho ou acidente poderiam motivar repreensões disciplinares e a reincidência poderia motivar despedimento por justa causa.  O i tentou perceber ontem em que ponto está este programa no grupo e o que fundamenta esta polícia de acordo com a deliberação da CNPD, sem sucesso. A Cofina obteve autorização da comissão para tratamento de dados pessoais com finalidade de medicina preventiva no dia 21 de Janeiro.
Continente Modelo A cadeia de supermercados Continente Modelo do Grupo Sonae obteve autorização para controlo do consumo de álcool em Fevereiro. O i procurou perceber junto da empresa quais os funcionários envolvidos, sem sucesso.
Câmara Municipal de Loures É uma das autarquias entre a lista de 140 autorizações concedidas este ano pela CNPD. Além do controlo de álcool, a Câmara Municipal de Loures solicitou também o tratamento de dados no âmbito do controlo de outras substâncias psicoactivas.

* Somos absolutamente a favor de testes toxicológicos nos locais de trabalho, desde que os resultados obtidos sejam tratados por pessoas com as competências exigidas para o efectuarem. Trabalhar sóbrio é um dever de toda a gente, sob medicação é um direito.


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