18/02/2014

PAULO BALDAIA

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Minha culpa

Vivemos de polémicas e gostamos de praxar o povo com insinuações. Adoramos fazer julgamentos na praça pública e dar como culpados cidadãos que deveriam ter o direito à presunção de inocência. Acusamos de ânimo leve e recusamos até ao limite reconhecer os próprios erros. É da praxe não considerar a possibilidade de chamar a tudo isto outra coisa qualquer que não seja jornalismo. Como somos jornalistas, pensamos que tudo o que fazemos é jornalismo.

Vivemos a fazer culpados mas para nós só há desculpas. São as redações que hoje estão mais curtas e os constrangimentos financeiros que nos impedem de fazer verdadeira investigação. Vivemos igualmente com a desculpa de que somos o que querem que os jornalistas sejam. Dizemos o que o povo quer ouvir, produzimos os big brothers noticiosos a que o povo quer assistir, encontramos vítimas e culpados, ditamos sentenças e passamos para a novela seguinte.

E as desculpas não são falsas desculpas, é mesmo verdade que há menos jornalistas nas redacções, que há fortíssimos constrangimentos financeiros na comunicação social e que se vende melhor o "lixo" do que a informação útil. Só precisamos de evitar as desculpas e fazer bem, mesmo que seja pouco.

Estou firmemente convencido de que o jornalismo tem de ser outra coisa, que deve procurar a verdade e não construir a que vende melhor, que tem a obrigação de colocar na agenda as questões que importam, que deve ser contrapoder e não, de forma populista, contra o poder. O jornalismo tem de ser mais útil para todos os cidadãos.

É preciso ter coragem de arriscar fazer diferente, de redefinir as fontes de receita para viabilizar o negócio e assim criar as condições para ter jornalismo verdadeiramente livre. Livre de preconceitos justiceiros, livre de certezas inabaláveis, livre da "boa vontade" do sector financeiro, livre das "boas graças" do poder político, livre da falta de recursos humanos.

Hoje faço 50 anos (26 de jornalismo). Assumo a minha parte da culpa. Fui repórter, estive muitas vezes editor, chefe de redacção e estou director. O jornalismo é hoje pior do que quando comecei a estagiar, porque é menos livre. E é assim também por incompetência dos seus profissionais. Os meus pares podem não gostar de ouvir tudo isto mas fiquem descansados, estou apenas a falar de mim. 

PS. Começou o jogo do empurra. A Europa empurra-nos a nós e nós a eles. Ninguém quer assumir a paternidade do suicídio que pode ser uma saída à irlandesa. Na ausência da sabedoria de Salomão, lava-se as mãos como Pilatos. Como sempre, o que conta são as eleições que não se podem perder.

IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
15/02/14

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