Prostituição:
legalização a
caminho da abolição
Todas as páginas deste jornal não seriam suficientes o tanto que há para debater sobre a prostituição. Com este texto pretendo apenas contribuir com algumas ideias, e desafiar a uma discussão sobre prostituição sem preconceitos nem moralismos.
Conhecemos vários tipos de prostituição, de rua, de bordéis, de
luxo, homossexual, transexual, infantil, etc, cada uma com
especificidades próprias mas com um lugar comum: a violência múltipla
imposta a quem se prostitui.
Como forma de evitar debater o assunto aprofundadamente, nos
últimos tempos fez-se passar a ideia de que a prostituição é uma
escolha. Pode ser para uma minoria, mas para a larguíssima maioria ela é
apenas uma consequência de inúmeros problemas sociais. E se os
problemas são sociais compete-nos a todos e todas nós combatê-los.
A prostituição, em alguns casos, pode ser uma escolha livre, mas é
amplamente consequência da pobreza e da exclusão social, é consequência
da discriminação de género ou com base na orientação sexual, é
consequência do tráfico de seres humanos, é consequência da exploração
humana, é consequência da ocupação de territórios como zonas de guerras,
é consequência da megalómana industria do sexo, é consequência da
cultura machista que olha para a mulher, e para todas as outras minorias
como objetos ao serviço do homem-branco-heterossexual, e é agravada,
tal como outros problemas, pelo sistema capitalista e pelo
neoliberalismo a que assistimos hoje.
Combater a prostituição de base (diferente de combater quem se
prostitui) só me parece possível se for feito de forma radical, i.e.
pela raiz, combatendo as suas causas, ou ainda por outras palavras:
construir mundos onde só se prostitua quem assim decidir livremente e
onde haja a garantia de que ninguém é empurrado/a para mercados
alimentados pela violência sexual, física, emocional, social ou
económica, para poder sobreviver. Soa a utopia? Pois bem, são as utopias
de que nos fazem caminhar.
Mas enquanto sonhamos e não desistimos de construir esse outro
mundo, a prostituição está aí. Está em todo o lado, e a fervilhar de
clientes de todas as classes sociais - pessoas que têm de pagar para
terem sexo. E quando estes clientes - que não são criminalizados nem
mesmo quando cometem qualquer tipo de agressão e/ou crime - procuram a
prostituição, ela deve também ser encarada como serviços sexuais.
Trabalho.
Quem se prostitui, quem presta serviços sexuais, está vulnerável e
desprotegido/a à mercê de todas as formas de violência institucional,
social e individual. É também por isso que, sem deixar de lado o
trabalho de base, é urgente proteger essas pessoas, é necessário
dar-lhes direitos laborais e proteção social.
A ilegalidade só tem servido para reforçar preconceitos e estigmas,
discriminar ainda mais quem já é marginalizado/a, e ao mesmo tempo
continuar a desculpabilizar a clientela e os proxenetas.
É preciso olhar para as experiências de legalização noutros países,
perceber o seu contexto e aprender com os poucos sucessos e os muitos
erros.
É importante que qualquer tentativa de regulamentação não deixe
margem para nenhuma forma de exploração. É urgente debater o assunto, e
agora!
Talvez seja um bom começo despirmo-nos de moralismos e
conservadorismos, e olharmos para as pessoas que se prostituem como
seres humanos - sujeitos políticos e sociais dotados de vivências,
pensamentos, demandas e voz – e ouvi-las.
IN "AÇORIANO ORIENTAL"
05/12/13
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