HOJE NO
" PÚBLICO"
A portuguesa que ganhou o Nobel na
. organização “onde todos se conhecem
Entre viagens ao redor do globo, Cristina Rodrigues, oficial da
Secção de Protecção e Assistência da OPAQ, revela os bastidores do
funcionamento da organização vencedora do Prémio Nobel da Paz.
Ao telefone de Haia, Cristina Rodrigues, de 51 anos, começa logo por
avisar que o dia tem sido atarefado, porque, na Organização para a
Proibição das Armas Químicas (OPAQ), “o trabalho
continua”, como começou
por dizer ao PÚBLICO.
No domingo já segue para a Jamaica, onde vai dar
formação em assistência e protecção contra as armas químicas, ramo no
qual trabalha há seis anos. “O que eu faço na maior parte do tempo é
treinar os diversos países para responder a um incidente com armas
químicas”, sintetiza.
Depois da licenciatura em
Química pela Universidade Nova de Lisboa, Cristina trabalhou no
Departamento de Tecnologias e Indústrias Químicas do Instituto Nacional
de Engenharia, Tecnologia e Inovação (INETI). “A partir daí foi um pulo
para aqui”. “Aqui” é o número 32 da Johan de Wittlaan, em Haia, na
Holanda, a sede da OPAQ, a organização vencedora do Prémio Nobel da Paz 2013.
A
OPAQ tem quatro pilares de actuação. O mais conhecido é a destruição de
arsenais químicos e fábricas, do qual é exemplo a operação na Síria. Os
restantes são as verificações de não-proliferação das armas químicas, a
cooperação internacional para o desenvolvimento e uso pacífico da
química e, finalmente, a assistência e protecção contra o armamento
químico, onde trabalha a portuguesa.
As funções de Cristina
obrigam-na a viajar um pouco por todo o mundo. O ramo de que faz parte
“dá apoio a pequenos países, que não têm armas químicas, mas sim uma
pequena indústria química”. São países com poucas estruturas para dar
resposta a um potencial desastre químico, apesar de que “quando há uma
grande emergência, ninguém está realmente preparado”, alerta a
especialista.
No momento em que aterra num qualquer país, a equipa
da OPAQ entra em contacto com as autoridades locais responsáveis pela
proibição das armas químicas (em Portugal, a Autoridade Nacional para a
Proibição de Armas Químicas, adstrita ao Ministério dos Negócios
Estrangeiros).
É esta agência que escolhe os participantes nos treinos
dados pela OPAQ. “Treinamos instrutores, dos bombeiros, da polícia, da
emergência médica, para que depois possam vir a treinar o seu próprio
pessoal”, esclarece. Estas acções duram geralmente uma semana, podendo
ser estendidas, entre treinos mais básicos e workshops até aos
grandes simulacros.
Os grupos que recebem as instruções de Cristina têm
cerca de 20 pessoas. “Somos pequeninos, temos poucos recursos, não
podemos treinar 100 ou 200 pessoas”, explica a oficial.
Trabalhar
em tantos países diferentes requer uma sensibilidade especial, pedindo
quase uma perspectiva antropológica, que Cristina não nega. “Todos os
países têm as suas características e requerem que nos adaptemos. A
partir daí, tudo fica mais fácil”, afirma. A receita é simples: “Gosto
muito daquilo que faço e portanto vou [para os países] sempre com uma
atitude muito positiva”. E garante que nunca veio das viagens “com um
amargo de boca”. “O que trago é sempre algo de positivo”, observa.
A
alegria que a atribuição do Nobel da Paz despertou é impossível de
esconder: “É o reconhecimento merecido do trabalho dos últimos 16 anos”.
Na opinião de Cristina Rodrigues, a OPAQ “trabalha longe das luzes da
ribalta, do brilho e da publicidade, mas tem feito um bom trabalho na
destruição dos arsenais de armas químicas que existem no mundo”. “É bom
que tenhamos recebido este incentivo para nos apercebermos que a
comunidade internacional acredita em nós e que estão do nosso lado”.
É
impossível não abordar a Síria e Cristina admite que o prémio é também
um incentivo para uma acção “que vai ser difícil”. “O tempo para cumprir
a missão é curto, [mas] tenho a certeza de que vamos conseguir”,
sustenta.
A OPAQ foi criada há 16 anos, tem um staff relativamente
pequeno, mas a sua responsabilidade tem o tamanho do mundo. “Somos 500
pessoas, toda a gente se conhece”, explica Cristina Rodrigues, uma entre
três portugueses na OPAQ.
* Mais uma portuguesa quase anónima a destoar da vulgaridade do "parecer" nacional.
Obrigado por nos honrar, já que os políticos não o fazem.
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