O enólogo Jorge Sampaio
e a estratega Ferreira Leite
É o banquete preferido dos senadores da vida política nacional. Sentam-se à volta de uma mesa e toca a dizer mal do Governo e das políticas de austeridade.
E quando se lhes pergunta pelas alternativas, dizem que é preciso
renegociar com a ‘troika'. O último repasto aconteceu no Conselho de
Estado e, ao que consta, o cenário de eleições antecipadas esteve em
cima da mesa. A Mário Soares acho que já ninguém lhe leva a mal. Lança
os foguetes e faz a festa. Acabou de anunciar que vai organizar uma
conferência para criar uma frente anti-austeridade. E até somos capazes
de adivinhar as conclusões da dita conferência: é preciso renegociar com
a ‘troika'. Mas já lá vamos.
De Jorge Sampaio, outro histórico socialista, esperava-se um pouco
mais. Numa entrevista ontem à Antena 1, Sampaio veio dizer que o
consenso "agora está esgotado". E diz mais: uma consulta aos eleitores
não é "algo que se tenha de evitar a todo o custo". Será que Jorge
Sampaio não tem olhado para as sondagens? Haverá porventura alguma
sondagem donde se depreende que de umas eleições antecipadas possa sair
uma maioria que permita uma governação estável? Mesmo que o CDS, como
sugeriu Bagão Félix, dê uma volta de 360 graus (sim, uma volta de 360
graus para sair e regressar ao poder) e faça uma coligação com o PS, o
que é que esse novo governo vai fazer de diferente para evitar a
austeridade? Provavelmente vai renegociar com a ‘troika'. Mas já lá
vamos.
E o mais estranho na entrevista de Jorge Sampaio é que confrontado
com o cenário de Cavaco poder dissolver o Parlamento, arrepia caminho:
"É muito difícil de fazer, porque só é claro se houver uma alternativa.
Ela existe, mas tem de encorpar". O que Jorge Sampaio está a dizer é que
António José Seguro tem de ficar mais encorpado. Se estivéssemos a
falar de vinho, seria um vinho mais ácido e mais forte, para ser
degustado à mesa do banquete dos históricos socialistas. E a questão que
se coloca é o que fará de diferente António José Seguro perante as
exigências de austeridade da ‘troika'? Diz ele que vai renegociar com a
‘troika'. Mas já lá vamos.
Chegados aqui, é altura de também perguntar a Manuela Ferreira Leite o
que ela faria para renegociar com a ‘troika'. A ex-presidente do PSD
responde: "Às vezes perguntam-me o que é que eu faria se lá estivesse.
No mínimo, gritava". Ok, a estratégia para convencer a ‘troika' é
gritar! E por que não uma estratégia mais agressiva? Por que não
beliscar a ‘troika'? Ou dar um calduço ou um carolo?
Mas o Governo, já se percebeu, não quer servir aos senadores da
política nacional a cabeça de Vítor Gaspar numa bandeja. O Governo
também tinha uma estratégia. Concentrar a austeridade na primeira parte
da legislatura (fazer o ‘front-loading' da austeridade) e dedicar a
segunda parte do mandato a medidas mais amigas do crescimento. Falhou.
Primeiro serviu-nos o primeiro prato recheado de aumentos de impostos. O
segundo prato foi um brutal corte de despesa. E para adocicar vai
anunciando, aqui e ali, algumas medidas avulsas para o crescimento, como
o super crédito fiscal desvendado ontem. Mas o repasto continua a ser
intragável.
Por ter falhado, tornou-se imperioso renegociar com a ‘troika' para
aliviar a austeridade e fazer crescer a economia. Mas para renegociar é
preciso ter trunfos. E o maior trunfo que Portugal tem tido é o consenso
e a estabilidade política. Se o perdermos é bom que nos preparemos para
um segundo banquete com a ‘troika', que é como quem diz, um segundo
resgate.
24/05/13
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