Estado social e desenvolvimento
O Estado social e o trabalho são hoje o alvo estratégico das políticas
de austeridade impulsionadas pela troika e pelo Governo PSD/CDS e
respaldadas numa União Europeia (UE) capturada por ideologias e práticas
neoliberais. À "inevitabilidade" da redução dos salários e da
degradação das relações de trabalho juntam agora a "inevitabilidade" da
destruição do Estado social, que querem reduzir a um Estado
assistencialista de serviços mínimos.
Vítor Gaspar disse que os portugueses devem decidir se querem
mais Estado do que aquele que estão dispostos a pagar e Passos Coelho
falou de "refundação" do Estado, quando já haviam acordado com a troika o
corte na despesa, em 4 mil milhões de euros. São atos vergonhosos e de
desonestidade política.
Em Portugal, como na generalidade dos
países europeus e outros, o progresso das sociedades e a consagração de
valores democráticos tiveram na afirmação do valor e dignidade do
trabalho e dos direitos sociais os seus dois fundamentais ancoradouros.
O
magro Estado social português, construído pela ação e luta de gerações,
sustentou-se nos compromissos inscritos na Constituição da República em
1976 e significa, sem dúvida, um dos grandes avanços civilizacionais
propiciado pelo 25 de Abril de 1974. Agora, por ação do Governo e da
maioria que o suporta, com a cumplicidade do presidente da República,
está em marcha um ajuste de contas com esses avanços sociais, culturais e
democráticos.
Usando a boleia e o pretexto da crise - em nome da
qual dizem que não há dinheiro -, mentindo quanto aos objetivos de
"novos" compromissos de justiça social, este Governo dos credores (e dos
agiotas), dos acionistas de grandes grupos financeiros e económicos,
quer impor aos portugueses uma nova versão do Estado assistencialista do
século XIX.
A pretensa liberdade de escolha entre oferta pública e
privada - na Educação, na Segurança Social, na Saúde - é apresentada de
forma mentirosa como opção mais democrática.
Num Estado social
de mínimos, trata-se de mentira absoluta afirmar que se deposita nos
cidadãos e nas famílias a escolha do que lhes servir melhor, pois um
qualquer cheque-ensino não lhes permitirá senão fazer uma escolha entre
escolas públicas, qual delas a mais degradada e sem recursos.
É
falsa a ideia de que o acesso aos cuidados de saúde públicos deve ser em
função dos rendimentos, quando o que está em marcha diminuirá
inexoravelmente a qualidade dos serviços à medida que estes são
concebidos apenas para pessoas na pobreza ou na sua proximidade.
A
especulação sobre as grandes reformas é feita para cobrir com demagogia
a defesa do plafonamento das pensões. Na Segurança Social existem pouco
mais de 500 reformados com pensões superiores a 5000 euros e a pensão
média do regime contributivo é de 470 euros (Regime Geral). O sistema
precisa de todos os trabalhadores e não surgirão alternativas positivas à
solidariedade intergeracional.
Após a privatização da ANA, da TAP
e das áreas rentáveis dos transportes públicos, das águas, dos
correios, entendem os nossos governantes e os seus mandantes que resta
oferecer ao capital financeiro e aos grandes grupos económicos o último
eldorado: entregar à exploração dos mercados e do sistema financeiro os
setores rentáveis do fundamental das funções sociais do Estado.
Nestes
tempos em que a austeridade funciona como arma de arremesso para
aprofundar a desigualdade e proteger os rendimentos dos poderosos, é
tempo de unir esforços entre trabalhadores, forças políticas e sociais
da Esquerda, sindicatos e movimentos sociais, para denunciar o golpe que
o Governo prepara e colocar no centro do debate a defesa e o futuro do
Estado social. A petição lançada pela CGTP-IN "em defesa das funções
sociais do Estado" é muito oportuna e merece apoio. Outras iniciativas
sociais e políticas têm de ser feitas para que o combate seja vitorioso.
É
preciso políticas económicas sérias para haver emprego e mais recursos,
mas hoje a despesa social em Portugal não é superior à da maioria dos
países da UE.
Não haverá crescimento económico em resultado da
destruição do Estado social e este faz falta à construção da justiça
social, ao combate à pobreza e ao desenvolvimento da sociedade.
IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
15/12/12
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