Decisões em fim de vida:
a resposta pedida
por médicos e pacientes
No passado mês de agosto entrou em vigor o diploma que regula as
diretivas antecipadas de vontade. A Lei n.º 25/2012, de 16/07, vem
permitir que qualquer um de nós (desde que maior de idade e não
interdito nem inabilitado por anomalia psíquica) manifeste de antemão a
sua vontade quanto aos tratamentos que deseja, ou não, receber em
situações de fim de vida, mediante um documento escrito (testamento
vital), ou a nomeação de alguém da sua confiança para tomar essa decisão
quando o momento chegar (Procurador de Cuidados de Saúde).
Com isto o legislador dá resposta aos anseios há muito sentidos pelos
profissionais de saúde. Um dos grandes dilemas com os quais os médicos
se debatiam prende-se com a decisão a tomar com doentes incapazes de
manifestar a sua vontade, defrontando-se o profissional de saúde com a
incerteza, e mesmo angústia, de ter que tomar uma decisão que não lhe
compete a si e que representa um fardo demasiado pesado para
carregar.Será que, estando consciente, quereria o doente ser submetido a
reanimação cardiopulmonar, a medidas de ventilação mecânica, ou
alimentação e hidratação artificiais?Será que aceitaria um tratamento
experimental, ainda incerto e perigoso, mas que se revela a sua única
solução cientificamente existente?
A situação torna-se ainda mais complexa quando os familiares
pressionam neste ou naquele sentido, sobretudo sabendo o médico que se
arrisca a ver-se envolvido num processo judicial por não ter atuado ou
por ter atuado sem consentimento do paciente.
O contributo da lei consiste em fornecer aos médicos uma base segura
de atuação, na medida em que a decisão fundada na diretiva se considera
conforme à decisão do paciente eo isenta de responsabilidade por este
motivo (porém, não afasta a responsabilidade por outras violações das
legesartis). Recorde-se que o Código Penal comina, no seu artigo 156.º,
uma pena que pode ir até 3 anos de prisão para profissionais de saúde
que atuem sem o consentimento livre e esclarecido do paciente, só
permitindo presumir o dito consentimento quando “não se verificarem
circunstâncias que permitam concluir com segurança que o consentimento
seria recusado”, uma salvaguarda demasiado vaga para conferir ao médico a
necessária tranquilidade.
Sobretudo tendo em conta que é o próprio
Código Deontológico da Ordem dos Médicos que prescreve o respeito pela
vontade do paciente (artigo 49.º) e, por outro lado, considera
contrários à boa prática médica“meios fúteis de diagnóstico e
terapêutica que podem, por si próprios, induzir mais sofrimento, sem que
daí advenha qualquer benefício” (artigo 58.º/1).
Contudo,e de maior alcance ainda, é o reconhecimento legal de que
cada cidadão dispõe do direito de decidir sobre matérias tão íntimas e
decisivas para a sua existência como aquelas que se prendem com o
bem-estar, o corpo e a saúde.
Não se trata da legalização do suicídio assistido, muito menos da
eutanásia, mas apenas da constatação de que a medicina tem limites que
por vezes a tornam incapaz de salvar a vida do paciente, e mesmo de lhe
atenuar as dores ou lhe conferir algum conforto, limitando-se a
prolongar a sua existência física, mas quantas vezes totalmente
dependente de máquinas.
Quando assim suceda deve ser o próprio paciente a
decidir se prefere continuar a submeter-se a medidas de escasso ou
incerto resultado ou, pelo contrário, se prefere deixar o processo de
morte natural seguir o seu curso. Nem os médicos, nem a família, nem um
juiz, se podem substituir ao próprio nesta decisão, sob pena de negarmos
a réstia de dignidade que assiste àqueles que mais sofrem.
* Vieira de Almeida e Associados/ Associada/Consultora
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS DA MADEIRA"
26/09/12
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