Acertar no falhanço
Vítor Gaspar
esteve mais de uma hora na quarta-feira a explicar as medidas-chave do
OE 2013. À noite, foram às TV a sua secretária de Estado e o secretário
de Estado adjunto do PM. Mas hoje, sexta, ainda não se sabe quanto vale
mesmo o pacote anunciado e porque é que o Governo considera necessário,
apesar da flexibilização das metas do défice, um aumento de impostos
que o próprio qualifica de "enorme".
Não sabemos quais são os
novos cinco escalões do IRS - apesar de essa medida ter sido anunciada a
11 de setembro, quando Gaspar "explicou" a alteração da TSU (prova
definitiva do embuste que é dizer que uma medida veio substituir a
outra) - e sobre que rendimentos se aplicará a sobretaxa de 4%
(incidirá, como a de 2011, a partir de 485 euros?). Como se ignora
quanto as Finanças preveem embolsar com os aumentos ao IMI, aos quais
retiraram, incrivelmente, a cláusula de salvaguarda que impedia subidas
brutais para imóveis em avaliação.
Se, como ontem se lia no DN, a
sobretaxa de 4% renderá ao Estado 1,1 mil milhões; se as alterações aos
escalões de IRS valem mais de dois mil milhões e a manutenção do corte
de um subsídio de férias e de Natal a pensionistas e funcionários
públicos outros mil milhões; se o aumento médio do IMI nos 5,2 milhões
de prédios em avaliação for de 200 euros (a cláusula de salvaguarda
fixava 75 euros como limite), e aí se arrecadarem outros mil milhões de
euros, a soma ultrapassa cinco mil milhões - fora outras medidas
anunciadas e de valor igualmente não divulgado.
Ora existindo
uma subida da meta do défice de 4,5% para 5% em 2012 e para 4,5% em
2013, o ajustamento, mantendo-se tudo constante, seria apenas de 800
milhões. Mas o défice real de 2012 ficará em 6%, admite o Executivo, que
prevê que este seja de 7,5% em 2013, implicando um esforço de 4,9 mil
milhões - mais do dobro do valor do corte dos subsídios cujo chumbo
seria alegadamente compensado com a medida da TSU, entretanto
abandonada. Sendo que o total de ajuste anunciado por Gaspar chega aos
6,9 mil milhões, correspondendo a um défice de 8,7%.
Porquê? Se
nada mais, o Governo aprendeu um facto doloroso: que é incapaz. Que nem
com uma sobretaxa em 2011, nem com o corte dos subsídios em 2012, mais o
IVA a 23%, conseguiu chegar perto da meta sem recorrer a receitas
extraordinárias. Que a taxa de desemprego que previa em 13,4% no OE 2012
e atualizou em abril para 14,5% era já em agosto de 15,9%. Que a
contração do PIB que antecipava de 2,8 para 2012 e reviu em fevereiro
para 3,3 foi alcançada no segundo trimestre, antes do efeito recessivo
destes anúncios.
Sim, há uma coisa que Gaspar aprendeu a prever
com razoável certeza: que vai falhar. Talvez o seu peculiar sentido de
humor - que lhe sugere a obscena anedota de garantir que as
desigualdades diminuirão em Portugal graças ao empobrecimento da classe
média - ache piada à evidência de que as suas medidas são a um tempo
assunção e causa do falhanço. E até tem. Pena é custar-nos tão caro.
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
05/10/12
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