20/07/2012

PEDRO TADEU


  

As absolvições 
        no julgamento Freeport 

Quando o Ministério Público pediu ontem a absolvição dos arguidos numa acusação por si elaborada sobre a existência de um crime de extorsão no licenciamento do Freeport, que atingiu seriamente a reputação de José Sócrates, somaram-se sete anos de investigação, julgamento e um notável fracasso da entidade a que o Estado atribui a competência da ação penal.

Quando o Tribunal da Relação decidiu anular a condenação de um homem a 22 anos de cadeia por homicídio do dono do bar Avião, ao considerar inválidas as provas apresentadas - faturação telefónica -, este Ministério Público voltou a somar outro falhanço.

A 31 de maio, quando Fátima Felgueiras foi declarada definitivamente inocente no processo conhecido como "Saco Azul", duas condenações anteriores tinham sido anuladas por prescrição, e a que restou, de alegado peculato, caiu por terra por falta de provas. Mais uma vez, o Ministério Público ficou mal na fotografia.

Só me refiro a notícias com duas semanas. Há anos que noticiamos em quilómetros de palavras uma torrente de insucessos deste tipo. Somam-se casos e casos em que faltam provas para obter condenações. Quando há provas, elas são anuladas porque foram obtidas de forma ilegal. Quando os casos são mediáticos, as investigações arrastam-se anos e anos até ao desespero da prescrição, o que deixa os arguidos na situação moral insustentável de terem de viver condenados na opinião pública mas sem serem julgados nos tribunais. Quando os processos são económicos ou causam algum alarido social, passam para a classificação "de grande complexidade", e a confusão instala-se até ao absurdo. (Começou ontem um, com vários bancos de investimento suspeitos...)

As estatísticas dirão que as taxas de condenações obtidas pelo Ministério Público até são boas. Mas como também conta para essa tabela mandar para a cadeia carteiristas apanhados em flagrante, ladrões de automóveis estampados em perseguição policial ou incendiários loucos que confessam o crime aos bombeiros, estaremos a lidar com uma falácia escrita em percentagens.

Os problemas com a Justiça portuguesa não se resolvem com reformas na lei penal, com perdas de direitos de arguidos ou com novos mapas judiciários. Tudo isso já foi feito no passado e não resultou. A crise na Justiça começa por ser a crise do Ministério Público. De meios, de preparação, de métodos de trabalho, de objetivos, de critérios de atuação, de pessoas. Aí, sim, a ministra Paula Teixeira da Cruz deveria mudar tudo, de alto a baixo. Mas não, não é isso que ela está a fazer. Em que aposta, caro leitor: cobardia política ou cegueira?



IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
17/07/12

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