A TV pode fazer mal à saúde
A ninguém minimamente informado sobra qualquer dúvida sobre a violência do regime sírio, pelo que se torna particularmente penoso entender os métodos que levam uma rede de televisão conceituada internacionalmente a editar e emitir imagens falsas. A verdade é que a circunspecta BBC acaba de reincidir nessa prática e logo a propósito de cenários de guerra sobre os quais nenhum meio de Comunicação Social deveria ceder à tentação do "sprint" noticioso porque em causa estão vidas inocentes, aos milhares, incluindo crianças, e soluções diplomáticas alternativas aos conflitos militares.
A BBC, que já tinha emitido imagens de uma manifestação na Índia como sendo em Trípoli e contra Kadafi, decidiu agora aceitar como fidedigna uma fotografia assinada como sendo de um ativista anti-Assad para ilustrar o massacre de Houla, a qual não resistiu ao confronto com o real e foi reivindicada pelo verdadeiro autor, Marco di Lauro, um fotojornalista italiano que trabalha para a agência Getty Images, e que revelou ter obtido aquela imagem nas cercanias de Bagdad, em 2003, no início da invasão do Iraque pelas tropas norte-americanas.
Por envolverem uma rede de televisão que mantém uma imagem de credibilidade, estes dois casos protagonizados pela BBC dão bem a medida do grau de manipulação a que podemos estar sujeitos quando expostos à informação apoiada em imagens que a deveriam aproximar do real. E afinal... afastam.
Felizmente, as televisões portuguesas estão longe dos grandes centros geoestratégicos de informação e contrainformação internacional e no domínio dos grandes conflitos armados o mais longe que conseguimos chegar pelos nossos próprios meios é a uns quartos mais ou menos manhosos de uns hotéis escolhidos pelos nossos aliados.
Mas não é só em relação às notícias sobre a guerra e a paz que as televisões podem fazer mal à saúde mental do cidadão comum. No dia a dia, em relação a casos de justiça, é possível rever até ao enjoo imagens de arquivo em que são exibidos cidadãos no pleno exercício dos seus direitos e deveres, que, por acaso, foram apanhados ao lado de gente suspeita e até mesmo acusada.
O desrespeito pelas circunstâncias em que as pessoas se cruzam e coincidem nos mesmos locais, por vezes apenas porque estiveram num estádio de futebol ou participaram em um ato oficial do Governo ou da Autarquia, é um dos problemas da utilização de imagens de arquivo. Sobretudo quando esta utilização acaba por dominar a informação que quanto mais quente menos distanciamento permite.
Não poucas vezes o real é suficientemente desagradável, medíocre e até criminoso para que haja qualquer cedência a versões mentirosas.
É por isto que o caso da BBC é particularmente alarmante porque é de guerra e paz que se trata.
IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
16/06/12
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