ESTA SEMANA NO
"O INTERIOR"
Agricultura da região enfrenta
situação de «desastre total»
A falta de chuva que durou todo o inverno está a repercutir-se de forma nefasta na agricultura da região. Segundo o Instituto de Meteorologia, a seca do território nacional agravou-se nos últimos meses, e de acordo com o índice de seca meteorológica, 70 por cento do território está em seca severa e cinco por cento em seca extrema. António Machado, presidente da Associação Distrital dos Agricultores da Guarda (ADAG), diz que os agricultores enfrentam uma «situação terrível» para tentar sobreviver. «Neste momento, a seca atinge já todos os setores. A situação do gado é particularmente preocupante, pois os animais não têm nada para comer e são praticamente só pele e osso. As ovelhas tardias, que só estão a parir agora, estão a dar à luz animais tão raquíticos que muitas vezes nem sobrevivem», acrescenta. Segundo o dirigente, é a fome que leva a este problema, porque «a única coisa que o distrito tem neste momento são giestas, e ainda verdes, até a palha já está desfeita». À seca, o presidente da ADAG acrescenta a ocorrência das chamadas geadas negras em fevereiro, que «queimaram tudo, até mesmo a rama dos eucaliptos, as silvas e as urtigas. É um desastre total», avisa. António Machado considera que esta situação «é a pior dos últimos 60 anos, que eu me lembre», identificando também a situação crítica dos pomares, que «estão a querer aflorar antes do tempo, o que vai levar a que o seu desenvolvimento não seja feito em condições». Na sua opinião, estamos perante um cenário de seca extrema «que vai continuar durante a primavera». Espera, por isso, do Ministério da Agricultura um «olhar atento e urgente» para com os agricultores e pede «ação imediata». «A ministra já sabe o que se passa e deve, o quanto antes, pedir ajudas comunitárias, principalmente para os pastores», refere. Isto porque exemplifica que há no distrito quem queira vender os animais, «por não ter nada para lhes dar a comer e nem isso consegue, porque não há quem os compre, precisamente pelo mesmo motivo».
À espera de chuva ou de apoios
«É preciso ajuda para a compra das rações, pois as pessoas estão descapitalizadas e alimentar os animais a rações representa muitas vezes um custo acrescido que não conseguem suportar», declara. Segundo António Machado, o que se está a passar resulta do aquecimento global e de um desenvolvimento tecnológico desmesurado que descurou a natureza. «E a natureza, quando está doente, tem mais força do que quando está saudável», avisa. Também José Freire, da AcriSabugal (Associação de Criadores de Ruminantes), está preocupado com a situação de seca, que considera «péssima». «Se não chover nas próximas duas semanas, todas as nossas explorações vão ficar afetadas, tanto a nível dos cereais como das pastagens, porque o terreno não tem humidade», indica. «Além disso, os palheiros estão a ficar vazios, pois a falta de chuva está também a condicionar o armazenamento de feno, vital para o próximo ano, no caso de se repetir novo período de seca prolongada», afirma, acrescentando que esse facto gera «um problema grave» com a alimentação dos animais. O dirigente adianta que já expôs o caso à tutela, numa reunião que decorreu há dias em Santarém. «O problema nacional e os responsáveis do ministério estão a analisar o assunto para um possível pedido de ajuda comunitária», explica. «Bruxelas já sabe que estamos numa situação de seca extrema, resta saber se estão dispostos a apoiar», acrescenta. «Resta-nos esperar, pelos apoios ou pela chuva», conclui. Por sua vez, Agostinho Monteiro, presidente da Adega Cooperativa de Pinhel e da União das Cooperativas da Beira Interior, garante que a vinha será igualmente afetada: «O próprio processo de rebentamento da vinha terá consequências pela falta de humidade que há no solo», alerta. Ainda assim, o responsável vitivinícola considera que esta «não é a área que se possa considerar como a mais crítica da agricultura portuguesa, porque se houver uma boa reposição de humidade em março ou abril, ou até em maio, os prejuízos não serão irreversíveis».
Vinha afetada se não chover nos próximos meses
«E, como há perspetivas de chuva, penso que a situação não é dramática, embora possa haver, ainda assim, consequências e prejuízos», admite. No entanto, afirma que se a seca se prolongar pelos próximos meses a vinha será «a mais afetada de todas as culturas pela simples razão de que as plantas poderão efetivamente secar, e isso implicaria um processo de replantação cujas consequências se estenderiam pelos próximos três ou quatro anos». Dizendo não quer ser «tão arauto da desgraça», Agostinho Monteiro considera que um levantamento de eventuais prejuízos causados pela seca «só poderá ser feito quando se iniciar o processo de rebentamento», não havendo por isso, até ao momento, «nenhuma consequência quantificável». O INTERIOR contactou o Ministério da Agricultura para conhecer os números do impacto da seca no distrito, mas os seus serviços não responderam em tempo útil até ao fecho desta edição.
* Um descalabro
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