06/12/2011



HOJE NO
"A BOLA"

GUARDA NACIONAL REPUBLICANA
A melhor charanga do Mundo

«Cavaleiro que se excede perde direito de ser obedecido.» O chavão na parede do picadeiro do 3.º Esquadrão da GNR, em Braço de Prata, Lisboa, serve de aviso. Naquele quartel, os cavalos são estrelas. É ali que funciona a Charanga a Cavalo do Regimento de Cavalaria da GNR, a única no Mundo que consegue tocar a galope. Lá fora é das mais apreciadas. Cá dentro poucos a conhecem. Mas é mais um motivo de orgulho no centenário da Guarda Nacional Republicana, que se comemora este ano.

A BOLA passou uma manhã no 3.º Esquadrão e conheceu um dos ‘ex-libris’ da Guarda Nacional Republicana. A Charanga a Cavalo existe desde 1942. «É a única no Mundo a executar nos três andamentos marchas militares e trechos de música ligeira», lembra a GNR. A cada terceiro domingo do mês, participa no Render Solene da Guarda, no Palácio de Belém. Mas, afinal, o que é uma charanga?

«Uma charanga é um agrupamento de músicos com instrumentos de metal. Nós fazemo-lo a galope. Mas, hoje em dia, já se associa a charanga aos cavalos», explica o sargento-ajudante Silva e Costa, chefe da Charanga a Cavalo há dois anos.

A unidade tem 27 elementos e integra a Unidade de Segurança e Honras de Estado. Participa em várias cerimónias de Estado, desde a entrega de credenciais a embaixadores e escolta de honra a presidentes de outros países. Os serviços da Charanga podem ser requisitados ao Comando-Geral. Em média, pode ir aos quatro mil euros. Como é de calcular, a logística é grande. «Cada camião leva quatro cavalos. Normalmente levamos três camiões. Fora as viaturas que levam os militares e um automóvel particular», explica Silva e Costa.

Os cavalos
Como em qualquer quartel, a vida no 3.º Esquadrão começa cedo. O Regimento de Cavalaria possui 130 cavalos, 27 da Charanga. Existem dois tipos de cavalos na GNR: ruços e malhados. São todos da raça Lusitana, a maioria cruzados. Em média, a esperança média de vida de um cavalo é de 25 anos. Na Charanga tanto existem novos como velhos. Comem quatro vezes por dia, com a primeira ração a ser distribuída às 6.30 horas.

De seguida, os animais são escovados, tratados e participam em exercícios de instrução. É assim, todos os dias, entre as 8.30 horas e as 11 horas. «Os cavalos são animais de rotinas», explica o capitão Lopes Caeiro, natural de Évora. É ele quem escolhe os cavalos que integram a GNR. Lopes Caeiro monta o Calimero, o número 121. Aqui, todos os cavalos têm nomes começados por ‘c’, a terceira letra do alfabeto. Há o Carapau, o Crespo, o Capote... Em média, um cavalo ruço pode ir aos quatro mil euros. Há puro-sangues que chegam aos 40 mil.

A música
Quando a Charanga a Cavalo começou, o único instrumento era o clarim. Hoje há de tudo: charamelas, cornetins, trompetes, fliscornes, bombardinos, contra-baixos, lira e tímbalos. A inclusão de mais instrumentos trouxe outra versatilidade. A Charanga toca de tudo, até músicas populares, sobretudo se estiver a representar Portugal no estrangeiro. Para o próximo Render Solene da Guarda está a ser preparada uma música de Natal.

Há ensaios todos os dias à tarde. Às terças e quintas-feiras, em cima do cavalo. Até 2009, não havia concursos externos. Agora é diferente. Hoje em dia, há músicos que saem do Conservatório e que procuram a Charanga. Quem fica a ganhar é a GNR.

«Ser músico requer muita complexidade. É mais fácil ensinar a montar do que a tocar», sublinha o sargento-ajudante Silva e Costa. Mas há quem não se adapte. Tocar parado é uma coisa, tocar em cima de um cavalo é outra...

E os acidentes acontecem. O mais mediático aconteceu no ano passado, durante a visita do presidente da China, Hu Jintao, a Portugal. Um dos cavalos da Guarda de Honra agitou-se e provocou a queda de um militar da GNR. Hu Jintao furou o protocolo e a própria segurança para se certificar que o guarda não tinha ficado ferido. «Os cavalos são como as pessoas. Há dias em que são insuportáveis», assinala o capitão Lopes Caeiro.

Pedaços da rainha
«Aquele homem é um dos mais fotografados do País», sorri Silva e Costa, apontando para o Cabo Luís Ferreira. É ele quem toca os tímbalos, uma espécie de tambor. O Chefe lidera a Charanga, empunhando o bastão. Seguem-se os timbaleiros e os fila guias. Todos os anos é ensaiada uma coreografia diferente.

Os turistas adoram ver a Charanga a Cavalo da GNR, sobretudo no Palácio de Belém. Mas poucas pessoas sonham com a preparação do Render Solene da Guarda.

«Os preparativos começam no dia anterior, com as tranças nos cavalos. Para estarmos às 9 horas em Belém, saímos de Braço de Prata às quatro», adianta o capitão Lopes Caeiro. As garupas são enxadrezadas, os cascos e ferraduras pintados e os arreios ornamentados com xabraques vermelhos. Os cavaleiros fardam-se com o Grande Uniforme: calção branco se for uma cerimónia de Estado ou de calção azul noutro tipo de cerimónia. O capacete tem um penacho.

Na arrecadação persistem, ainda, capacetes com penachos utilizados em 1957, na visita da rainha Isabel II a Portugal. Um dos pontos altos na vida da Charanga a Cavalo.

Hoje em dia, o local mais fácil para ver a actuação é no Palácio de Belém. A próxima é no dia 18 deste mês. O problema é a falta de reconhecimento e visibilidade no próprio País. A unidade já percorreu grande parte da Europa. Uma das últimas participações foi em Bremen, na Alemanha, num festival de música.

«Quando algum português vai a Londres, vai logo ver o Render da Guarda no Palácio de Buckingham. A maioria nunca viu o nosso», lamenta o Silva e Costa.



* Na verdade somos muito pirosos quando se trata de estimar o que é genuínamente português!


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