08/02/2019

LIU ZHEMMIN

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Acabar com a pobreza 
é possível enfrentando as 
desigualdades entre países

São necessárias transformações fundamentais no futuro, para reduzir as diferenças de rendimento entre os países e dentro deles. Segundo as estimativas da ONU, sem mudanças significativas, mais de 7% da população mundial poderá continuar na pobreza até 2030.

Os líderes mundiais comprometeram-se a acabar com a pobreza até 2030. Alcançar esse objetivo significa conseguir, durante a próxima década, reduções acentuadas nas desigualdades de rendimento, de oportunidades, de género, de exposição ao risco, entre países e dentro dos países.

A desigualdade é um reconhecido obstáculo para a erradicação da pobreza, assim como muitos outros desafios para o desenvolvimento, e apresenta-se em múltiplas dimensões na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, que constitui o plano universalmente aceite para promover a prosperidade e o bem-estar social, protegendo o meio ambiente.

De acordo com diversas informações estatísticas, a desigualdade de rendimentos entre os países diminuiu um pouco nas últimas décadas, graças ao forte crescimento económico registado no leste e no sul da Ásia. Contudo, há muitos países, particularmente em África, na Ásia Ocidental e na América Latina e Caraíbas, onde os níveis de rendimento continuaram a cair, exacerbando as desigualdades de rendimentos entre países.

A análise mais recente das Nações Unidas no "World Economic Situation and Prospects 2019" indica que os níveis de rendimento "per capita" estagnaram ou declinaram em 47 economias em desenvolvimento e em transição no ano passado. A maioria desses países tem retrocedido constantemente ao longo de várias décadas. Esta realidade representa um enorme desafio à medida que os países se esforçam para reduzir a pobreza, desenvolver infraestruturas essenciais, criar empregos e apoiar a diversificação económica. A maioria das nações menos desenvolvidas é altamente dependente de matérias-primas, o que enfatiza a importância de diversificar e bem gerir os recursos naturais para explorar o seu potencial de desenvolvimento. Vários países viveram também longos conflitos armados ou distúrbios civis e instabilidade política.

Se esta tendência continuar, será cada vez mais difícil erradicar a pobreza e criar emprego para todos. O fraco desempenho económico também está ligado ao insuficiente investimento em educação de qualidade, serviços de saúde, proteção social, programas para grupos marginalizados e mitigação e adaptação às alterações climáticas.

O crescimento mais rápido do PIB, por si só, não levará necessariamente a melhorias significativas nos padrões de vida. Desigualdades profundas persistem na distribuição de riqueza dentro dos países, atuando como uma grande barreira ao desenvolvimento. A elevada desigualdade dos países ao nível interno está associada à exclusão e à fragmentação social, à má governação, ao aumento do risco de violência e de conflito interno.

São necessárias transformações fundamentais no futuro, para reduzir as diferenças de rendimento entre os países e dentro deles. Segundo as estimativas da ONU, sem mudanças significativas, mais de 7% da população mundial poderá continuar na pobreza até 2030, incluindo cerca de 30% da população de África e dos países menos desenvolvidos.

No caso do continente africano, onde a população está a crescer a uma taxa superior a 2% ao ano, reduzir os níveis de pobreza extrema para menos de 5% até 2030 exigirá uma combinação de crescimento de dois dígitos do PIB e declínios dramáticos nas desigualdades, uma situação sem precedentes.

Medidas políticas integradas e transversais que potenciam as perspetivas de crescimento económico e reduzam as desigualdades de rendimento são essenciais para um mundo mais sustentável e inclusivo. Para tal é necessário investir na educação, na saúde, na resiliência às alterações climáticas e na inclusão financeira e digital, para apoiar o crescimento económico e a criação de empregos no curto prazo, promovendo o desenvolvimento sustentável a longo prazo.

A estabilidade macroeconómica e um sólido programa de políticas orientadas para o desenvolvimento, incluindo um sistema financeiro robusto e eficaz, são elementos-chave para enfrentar com sucesso as desigualdades. Políticas fiscais bem projetadas podem ajudar a suavizar o ciclo de negócios, fornecer bens públicos, corrigir falhas de mercado e influenciar diretamente a distribuição de rendimento. A ampliação do acesso à educação de qualidade é também crucial, aliada a políticas de emprego, como o aumento do salário mínimo e o aumento da proteção social. A prioridade no desenvolvimento de infraestruturas rurais, por meio de investimentos públicos em transportes, na agricultura e na energia, pode também apoiar o alívio da pobreza e diminuir as desigualdades dentro dos países.

Embora não exista uma solução única de políticas que garanta uma sociedade mais igualitária e próspera, é evidente que os apelos para erradicar a pobreza não fazem sentido sem uma ação política concertada e comprometida na redução das desigualdades.

* Subsecretário-Geral da ONU para os Assuntos Económicos e Sociais

IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
07/02/19

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