Robert Yildirim, presidente do grupo Yildirim, deu uma entrevista ao Expresso em que se queixava da lentidão das coisas em Portugal. Ontem, um editor do Financial Times
dizia-me que a grande diferença que nota em Portugal nos últimos
quarenta anos, tem cá vindo regulamente, é que está tudo mais rápido,
que o ritmo antes era diferente. Ambos têm razão: o tempo acelera, mas
ainda nos comportamos como se o tempo não contasse, como se estivesse
todo lá à nossa frente, para sempre, sem preço, sem custo, sem valor. Ir
a despacho é uma antítese.
Devia haver um índice de velocidade dos países, um agregado que medisse
tudo, desde a velocidade em que se anda nos passeios à velocidade com
que os processos andam nas gavetas burocráticas. Uma velha amiga
desespera com um recurso que não anda, um banco que demora um crédito
(não percebendo o que empresas como a Revolut, a Venmo e outras
significam sobre o tempo dos tempos), o meu mais novo quer que lhe leia o
Senhor Despachado (do Roger Hargreaves, que morreu novo com cinquenta e poucos anos). Em inglês, o Senhor Despachado é o Mr. Busy, que é diferente. E não é.
No
tempo certo esteve desta vez Marcelo, a ir logo num despacho ao bairro
da Jamaica, não deixando alastrar o que não é de alastrar, situação
adequada para o uso desta presidência próxima, mostrando solidariedade
por quem vive em condições miseráveis, esquecidos por todos e, pior do
que isso, sempre tratados como unidade indistinta. Teve coragem ao
fazê-lo, sabendo que nunca cairia no goto de certa direita mais
institucionalista, e de uns com menos sensibilidade à diversidade
cromática e as suas nuances, e que irritaria certa polícia. Também a
polícia não é uniforme e são distintos os seus membros, os seus
sindicatos. Se a polícia tem de poder usar força física, é precisamente
por isso que é fundamental que se seja severo na averiguação e na
punição de qualquer excesso do uso dessa mesma força - só isto legitima
aquilo. Não deve ser fácil ser polícia. Mas também não deve ser fácil
ser morador do bairro da Jamaica. Muita gente quer ver apenas um dos
lados, uma das camadas.
Em "Layers of deceit", um artigo
de 2012 na Slate, Tom Scocca tem a coragem de tocar num assunto
importante, o elefante na cozinha de todos nós, que é o tempo que leva a
caramelizar cebolas e o facto de todas as receitas mentirem dizendo que
são cinco ou dez os minutos que leva a ficarem castanhas e doces, e
toda a gente sabe que nem por sombras assim é, que demora e demora e
demora a ficarem no ponto. Não tive tempo, hélas, de ir ver
como mentem os meus livros de receitas portugueses, se é que mentem, mas
creio que sim, nunca li nenhuma receita que desse, só às cebolas,
trinta ou quarenta minutos, que é o que elas levam. E não se pode estar a
olhar muito para elas - a watched pot never boils -, tem de se deixar estar. Gasta mais gás, mas ficam saborosas, talvez poluindo mais.
Quem
também foi corajoso foi o ministro do Ambiente ao dizer o óbvio, que os
carros a diesel estão condenados a desaparecer e que faz um mau
investimento quem o comprar (numa divertida e inteligente entrevista à
jornalista Diana Duarte, saiu-se bem a explicar que carro usa e até a
defender as trotinetes e formas alternativas de mobilidade para um
ambiente mais sustentável). Os carros andam depressa, os a diesel mais
devagar, mas quanto a velocidades de carros, o maior elefante na sala é o
de a indústria nunca ter sido obrigada a instalar nos motores redutores
de velocidade ou até, com a tecnologia hoje possível, velocidades
máximas no plural, para cada zona ou tipo de via. Um dia quando tiver
mais tempo escrevo sobre isto, sobre a complacência dos portugueses para
com os carros, uma espécie de cristianoronaldização, em que podem tudo
porque são quem são.
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
09/02/19
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