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IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
09/12718
Narrativas de Natal:
Nos, Vodafone, Meo
Três empresas grandes e ricas, não por acaso de telecomunicações, fizeram anúncios longos de Natal em narrativas melodramáticas com relação subliminar aos seus serviços.
Nos reclames de Vodafone, Nos e Meo, a música é fundamental para
acentuar o carácter melodramático em histórias de 2'00 a 3'01 nas
versões internéticas. A Nos usa uma música com coro sem palavras, a
lembrar Debussy; a Vodafone recorre a uma música de piano mal tocado; a
Meo preferiu um clássico do repertório pop, "True Colours", por Cindi
Lauper (1986).
Os três têm a
mesma lição de moral: no fundo, somos todos boas pessoas. O Natal
certifica-nos o nosso horizonte de bondade; e cola as marcas ao espírito
da época.
Prefiro
o anúncio da Nos. A narrativa inscreve-se num imaginário infantil. Um
menino tem um ratinho de estimação. Quando ele foge na inauguração da
árvore de Natal da cidade antiga, a multidão desanda. A árvore
comunitária cai e apaga-se. Mas o menino regressa e outros meninos
ajudam-no a reerguer a árvore. O ratinho reaparece e, ao correr na sua
roda, gera a energia que reacende a árvore. A história é simples,
adequada ao Natal (as crianças em primeiro lugar), recorre a um símbolo
(árvore) e valores (comunidade, reencontro) e tem efeitos especiais
eficazes. O filme chama-se "A Caixinha Mágica", que são duas: a do
ratinho e a box da Nos.
O anúncio da Vodafone tem uma
narrativa tão mais complexa que começa dramaticamente no primeiro
segundo com a filha a gritar ao pai. Só percebi a primeira frase à
undécima vez. Grita ela: "Nunca disse que queria uma nova mãe." O pai,
com três piercings na orelha direita, fica chateado. A miúda continua:
"Nunca me perguntaste se eu gostava dela." E o pai: "Mas ela não é tua
mãe, é minha mulher." Está definido, em cinco segundos, o triângulo
emocional da narrativa de 2'27. A madrasta faz o que pode na relação com
a enteada. Vão ao carrossel. Como o anúncio de Nos, usa formato de ecrã
reduzido, para simular captação por telemóvel. Diz a madrasta: "Vá,
temos de ir." A miúda diz: "Tu não és minha mãe." Arrepende-se logo, mas
não corrige. Até recorda bons momentos com a madrasta. A situação
afecta o triângulo. A miúda vai para o Natal com a mãe. A madrasta está
devastada. Nem consegue apreciar o amor ao lado do marido na cama. No
jantar deles, toca o telemóvel dela com mensagem da miúda: "I love you!"
Conflito resolvido. A madrasta volta feliz para a cama com o pai.
Voz-off: "De que tamanho é o nosso coração?" Do tamanho que um telemóvel
permitir. Salvou o Natal em duas casas. A história adequa-se ao ar do
tempo. Muitas pessoas em idênticas circunstâncias ficam comovidas. A mim
pareceu-me demasiado melodramática, mas reconheço a desenvoltura da
narração. A Vodafone quer garantir o público mais urbano. É interessante
notar que a criança não tem razão, um valor que nunca tinha visto em
publicidade dramática. Julgo também que a narrativa representa um ponto
de vista exclusivo de adultos (dos próprios publicitários?) e enviesa
significativamente a atitude dos filhos face ao divórcio e novo
casamento dos pais.
Finalmente, a pior das três
narrativas, a da Meo. Ronaldo está a fazer uma filmagem a la "Guerra dos
Tronos", com neve no reino do Norte. Quem lhe aparece? A estúpida
pseudo-robô Sophia. "Corta!" A narrativa segue no estúdio. Há uma menina
fascinada - 'tadinha! - pela Sophia, e Ronaldo manda entregá-la em
casa. Como a da Nos, a criança não tem família e interage com a
pseudo-robô, que não fala, felizmente. Até que, em casa, se liga a box
da Meo e a Sophia, qual estátua de Pigmaleão, transforma-se em mulher. A
Sophia passa a mãe-madrasta e é cá uma felicidade naquela casa…
Portanto, "dê mais vida ao seu Natal. Meo. Humaniza-te". Com a Meo,
vê-se muita TV e as pessoas conversam enquanto vêem; portanto, tornam-se
mais humanas. Ver TV dá vida às pessoas. Nesta história, concordo:
ainda bem que a Sophia desapareceu de cena.
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