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Já que o povo é sábio…
Já que somos “sábios”, aproveitemos o tempo até às eleições para
pensar em alternativas. Talvez valha a pena escolher gente séria ainda
que não apregoe aumentos salariais e falsas baixas de impostos.
Em Portugal vivemos intensamente as notícias do que se passa no
estrangeiro nomeadamente as eleições que deram a vitória a Trump e a
Bolsonaro (1ª volta) e a comunicação social produz entrevistas, artigos e
colóquios unânimes na certeza de que esses povos votaram mal, e nós
ficamos preocupadíssimos. Mas cá em Portugal quando termina um processo
eleitoral, seja qual for o resultado, ouvimos sempre os políticos a
dizer que o povo é sábio. Talvez possamos concluir que os portugueses
são sábios mas os americanos e os brasileiros não são. Esses são uns
desgraçados manipulados pelo populismo.
Já as notícias do nosso
país são recebidas por nós como música de embalar não gerando grande
reacção. A título de exemplo temos as notícias do roubo, que afinal não
foi e por fim talvez tenha sido, de armas ou munições de Tancos, sendo
que todos nós sabemos mais do que o ministro da Defesa que alegando nada
saber mantém, aparentemente, o mesmo desejo de apuramento dos factos
que o nosso Presidente diz ter, e ninguém parece preocupado. Também a
notícia de que a PGR foi substituída apesar de consensualmente ser
reconhecida como tendo feito um excelente trabalho, durou pouco tempo de
indignação. O nosso povo diz que não se mexe em equipa que ganha. Ora
segundo dizem todos, a equipa liderada pela PGR ganhou batalhas
importantes mas ao que parece incomodou ou meteu medo a quem a tinha que
reconduzir. Tivemos ainda o caso Robles que também lembra outro ditado
do povo “faz o que eu digo não faças o que eu faço”. Passados 2 meses
sobre este episódio o BE voltou a subir nas sondagens como se nada
tivesse acontecido. Há também a história de como os professores foram
enganados, embora na realidade talvez não tenha havido dito por não dito
do ministro da educação mas apenas palavras que sem querer induziram em
erro! Apesar das greves e de todo o transtorno, os pais e não se
revoltam.
Todos os casos que referi (e muitos mais existem) são
graves, no entanto parece que nos aflige mais o que se passa no mundo do
que aquilo que se passa no nosso país. Recentemente li que as sondagens
em Portugal apontam para uma vitória confortável do partido que nos
governa o que me leva a crer que estamos mais bem preparados para opinar
sobre quem governa no estrangeiro do que para escolher quem nos governa
a nós. É muito fácil decidir quem são os bons e os maus lá fora. Por
cá, ainda que os casos se sucedam debaixo dos nossos olhos, vivemos como
se nada se passasse apesar de sermos “sábios”.
Gostava de ver o
povo português mais atento às trapaças que nos impingem no nosso burgo. É
certo que mais uns trocos no bolso todos os meses faz diferença, sabe
bem e para alguns foi mesmo uma tábua de salvação. Concordo que a forma
como o cinto foi apertado pode ter tido pouca atenção a certas camadas
da nossa sociedade, mas para a maioria, a melhoria das condições após a
troika foi um alívio mas não resolveu nada e, a meu ver, causou danos
muito piores, e não me refiro às opções de caracter económico, nem ao
aumento de impostos disfarçado. É que a perda dos valores da nossa
sociedade, a apropriação do ensino para endoutrinação abusiva dos nossos
filhos e a aceitação de comportamentos que privilegiam o interesse
próprio em detrimento do interesse comum vão pagar-se muito caro e um
dia estaremos como os brasileiros: fartos, muito fartos.
Já que
somos “sábios”, aproveitemos este tempo que antecede o período eleitoral
para pensar em alternativas. Talvez valha a pena escolher pessoas
sérias para nos governar ainda que não apregoem aumentos salariais e
falsas baixas de impostos.
Citando mais um ditado do nosso povo:
“diz-me com quem andas e dir-te-ei quem és”, não é possível, mesmo
tentando apelar à presunção de inocência, sentir confiança em quem nos
governa por muito que tentem disfarçar ou branquear a que outro governo
já pertenceram e a que resultado nos levou.
Os brasileiros, apesar
de não serem sábios como nós, mostraram-nos que afinal é possível
partir de um valor muito baixo de intensões de voto e chegar a uma
expressiva vitória.
Por cá isso pode ser alcançado sem receio da
extrema-direita, que não tem expressão no nosso país, e de igual forma
afastando extrema-esquerda que mais cedo ou mais tarde vai acabar por
nos desgraçar.
Que tal aproveitar os bons ensinamentos do estrangeiro e
sermos sábios arriscando outro voto nas próximas eleições?
IN "OBSERVADOR"
21/10/18
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