18/06/2018

ANA PAULA LABORINHO

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Para não esquecermos
o futuro


Faz hoje um ano que deflagrou o incêndio em Pedrógão Grande que foi consumindo outros concelhos, tristemente recordado como o mais mortífero na história do país.

As imagens e os relatos de mortos, feridos e destruição chegaram com uma violência arrasadora e achámos que tínhamos atingido o cume do horror. Pedrógão Grande foi o centro do país e de todos nós. Além dos que morreram, outros perderam as casas, os bens, mesmo os animais que eram também família, e tudo isso não se explica em números. Mas havia que sobrepor a vida à morte. Sobretudo, não deixar sozinhos aqueles que não podiam esquecer, e partilhar com eles a memória. O grande espetáculo que juntou solidariedades, transmitido por todos os meios de comunicação, foi uma escolha da vida na imensidão da dor.

Os incêndios foram uma constante de todo o verão, com temperaturas elevadas, seca prolongada e falta de limpeza das matas a contribuírem para a destruição. Quando pensávamos que a época dos incêndios terminara, a 15 de outubro o horror repetiu-se com mais mortos, mais feridos e mais destruição. Todos nós temos os números de 2017 na cabeça: 109 mortos, mais de 300 feridos, 1000 casas destruídas, a maioria de primeira habitação, quase 450 hectares de floresta ardidos. Falta aqui contabilizar os que convivem com a negra memória, com ou sem apoio psicológico.

Mas os incêndios são também impressionantes pelas suas causas: 98% dos casos têm origem humana por negligência, descuido, estado das florestas, e ainda as alterações climáticas que alguns teimam em negar. Um recente estudo de peritos americanos alerta para o risco em que Portugal se encontra sendo o número de incêndios por milhão de habitantes seis vezes superior a Espanha.

Este ano, a legislação impôs a obrigatoriedade da limpeza dos terrenos à volta das casas e houve um movimento sem precedentes para prevenir os incêndios. Mas não chega. Portugal será um dos países mais afetados pelas alterações climáticas e as catástrofes podem repetir-se se não colocarmos no centro da nossa cidadania cuidar da floresta, dos rios, dos mares, do planeta. Cuidar significa também diminuir a origem humana dos incêndios e compreender que cada gesto tem consequências para a comunidade. Importa começar pela escola. Se não cuidarmos do lugar onde vivemos, para que serve cuidar do tempo que vamos viver? Importa não esquecer os incêndios de 2017. Importa não esquecer o futuro.

* PROFESSORA UNIVERSITÁRIA

IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
17/06/18
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