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IN "OBSERVADOR"
16/05/18
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Jorge Sampaio
também está envergonhado?
Sampaio tornou-se tão criador do socratismo como o próprio José
Sócrates. E vai ser lembrado como o produtor da frase mais traiçoeira,
ignorante, irresponsável e populista proferida por um Presidente.
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Por estes dias está tudo muito envergonhado e traído pelos lados
do PS e comentadores amigos. Contudo ainda falta saber os estados de
espírito de algumas pessoas. Pedro Silva Pereira, por exemplo, faz ainda
por ignorar que o vento mudou sem regresso para os lados do PS. Que o
partido não mudou de posição, não deve discutir se se deixou
instrumentalizar por corruptos e, sobretudo, é a oposição que está a
fazer aproveitamento político com casos de justiça (adormeceram com este
último argumento, de tão cansado e esfarrapado que está, certo?)
A
Pedro Silva Pereira não lhe pareceu bem explicar se afinal o seu filho
vivia com Sócrates em Paris com despesas pagas por Carlos Santos Silva,
como as notícias indiciam. É que se acreditou que Sócrates vivia de
empréstimos da CGD e da mesada da mãe, seguramente Silva Pereira não
supôs que Sócrates tivesse capacidade para pagar a habitação (e
alimentação?) de filhos alheios numa cidade cara como Paris.
Fizeram
uma vaquinha para as despesas? Silva Pereira pagava parte? Qual? Sabia
que era Santos Silva quem sustentava o folclore parisiense de Sócrates?
Sabia que o dinheiro era, como diz a acusação do processo Marquês, do
ex-primeiro-ministro de quem era tão próximo? Acha correto – ou, como os
socialistas gostam, fazendo parte da ética republicana – um político no
ativo, ex-ministro, ter um filho com uma estadia em Paris sustentada
por origem incerta? Não tive explicações de nada disto. E, no entanto,
Pedro Silva Pereira é eurodeputado. Se não for demasiado incómodo (e, se
for, também) gostava que o PS insistisse para que Silva Pereira
contasse a sua parte aos eleitores.
Há outro político que também ainda não ouvi nem li. E Jorge Sampaio? O que tem a dizer sobre Sócrates e o Processo Marquês?
É
que José Sócrates não era inevitável. Recordemos que Sócrates se tornou
primeiro-ministro depois de um dos atos politicamente mais reles da
breve história da democracia portuguesa. Em 2004 havia uma maioria
absoluta de direita na Assembleia da República – e, à luz de 2018, as
maiorias que se estabelecem no parlamento é tudo e só o que conta para
formar governo. A maioria era estável. Mas devido a ‘trapalhadas’ que
nunca cuidou de elencar ou descrever, Sampaio dissolveu a AR e convocou
eleições.
Entra Sócrates.
Sampaio sabia que depois do
primeiro assomo de austeridade deste milénio no nosso retângulo (Manuela
Ferreira Leite aumentou ‘temporariamente’ o IVA para 19% – não se ria,
caro leitor, que o caso é sério) e da saída de Durão Barroso, o PS
ganharia eleições. Pelo que a dissolução da Assembleia da República foi
uma entrega deliberada do governo a José Sócrates por Jorge Sampaio.
Dir-me-ão
que Sampaio não desconfiava no que Sócrates se tornaria. Bom, desde
logo seria então um péssimo avaliador de pessoas, demasiado ingénuo para
ocupar cargos tão fulcrais. Por outro lado, não é crível. Afinal já
tinha existido a reportagem da Focus questionando de onde vinham os
rendimentos do ex-ministro do ambiente. Já havia notícias e rumores
sobre o Freeport. Os indícios eram numerosos. Foi Sampaio que escolheu
ignorá-los e misturar-se com o socratismo.
Qualquer presidente
sério seria prudente na hora de entregar o governo a um político à volta
de quem existiam zunzuns. Mesmo se mais tarde se revelassem falsos. Mas
a Sampaio não lhe apeteceu ser prudente. A Sampaio apeteceu-lhe
entregar o poder executivo ao seu partido de sempre, ainda que liderado
por uma figura já então questionável. Para Sampaio, um socialista com
aura de corrupção e de vida acima das possibilidades vale mais do que
qualquer político íntegro de outros partidos.
Sampaio tornou-se,
assim, tão criador do socratismo como o próprio José Sócrates. Vai ser
conhecido para a história como o produtor da frase mais traiçoeira,
ignorante, irresponsável e populista proferida por um Presidente da
República – ‘há vida para além do défice’ – e criador dos governos de
José Sócrates.
Que isto sirva de lição para vermos como elegermos
nulidades políticas tem custos grandes. Não foi Sampaio que ganhou a
Presidência da República – foi Cavaco Silva que, desgastado depois de
dez anos no governo, a perdeu. O número de portugueses entusiastas de
Sampaio nos seus momentos áureos (uso a palavra com benevolência) anda
na casa do número de pessoas que por cá, incluindo a comunidade chinesa,
já leu as obras completas de Lu Xun. É provável que eu tenha mais pares
de skinny jeans no armário.
A ignorância arrogante de Sampaio era
assustadora, como a frase lapidar sobre o défice orçamental demonstra.
Um presidente que nem se dava ao trabalho de estudar e perceber as
consequências económicas de finanças públicas descontroladas. Tendo em
conta a ideologia, a personalidade e a falta de conhecimentos basilares
sobre governação, era como a mãe da noiva: o melhor que se podia desejar
era que Sampaio não se fizesse notar. Felizmente seguiu muito essa
obscuridade, mas quando agiu foi uma calamidade.
Já que estamos
numa altura de fazer as contas com a nossa história recente, seria bom
não deixarmos de fora Jorge Sampaio. Representa o pior do regime que
elevou Sócrates. E continua calado, esperando que ninguém se lembre do
papel que escolheu.
IN "OBSERVADOR"
16/05/18
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