As marchas das mulheres
O Presidente dos Estados Unidos assinou, esta segunda-feira, um decreto que proíbe o financiamento público americano de organizações internacionais de cuidados de saúde que promovem o planeamento familiar, quando nele incluem qualquer tipo de aborto.
O aborto propriamente dito não pode ser financiado por dinheiro
federal americano desde 1973 em qualquer parte do mundo, incluindo em
países em que é legal. Portanto, o corte é sobretudo nos cuidados de
saúde reprodutiva, que previnem muitos abortos, sendo os Estados Unidos o
maior financiador do mundo dos cuidados de saúde para mulheres nos
países pobres.
A fotografia da assinatura na Sala Oval tem
oito homens. Eu, que não penso que o aborto seja só uma questão de
autonomia das mulheres, acho que isto é demais. Mas nem o decreto é uma
novidade, a Mexico City policy começou com Reagan, que aprecio, e o
decreto é sempre ressuscitado pelos Presidentes republicanos desde então
e revogado pelos democratas; nem o facto de os decisores políticos
estarem apenas rodeados de homens é uma novidade pelo mundo fora,
Portugal que o diga, e nisto não há factos alternativos que nos valham.
Mas estamos em 2017 e, lá por ter sido sempre assim, não significa que
continue a ser. Certo que Trump ganhou as eleições com um programa
pró-vida, certo também o direito de o criticar porque talvez a vida não
seja aquilo que esta lei mais protege.
A
OMS estima que 225 milhões de mulheres nos países em desenvolvimento
gostariam de adiar a maternidade, mas não usam contracepção por vários
motivos, incluindo a falta de acesso. O corte afecta o cuidado a
crianças grávidas por causa de casamentos precoces, outras resultantes
de violações de guerra, abortos clandestinos, mortes prematuras,
problemas de saúde irreversíveis, ostracização. A embaixadora que Trump
escolheu para as Nações Unidas opõe-se ao aborto, mas apoia o
financiamento da contracepção nos programas de ajuda internacionais.
Talvez se ela tivesse sido uma das protagonistas da fotografia na Casa
Branca, a violência que esta decisão impõe a muitas mulheres e crianças
não fosse decretada.
Jurista
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
27/01/17
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